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ESQUENTANDO OS TAMBORINS¹



                    





                    O Brasil é uma festa. O brasileiro um arlequim. Todo começo de ano se fecham as portas do drama e se abre um desvio de rota que trata de afogar por alguns dias as desilusões que povoam a rotina da turba que desce a avenida pelas ruas a dançar. Centenas de marchas invadem os nossos ouvidos dizendo que é proibido ficar parado. Isso é o carnaval, a festa dos sentidos: samba, axé, funk, frevo e maracatu, cabe até, pasmem, o sertanejo. As ruas viram um pasto, um vasto salão com convite especial para gringo ver.

          Muito natural que se busque intervalos que sirvam de descanso em meio à jornada de obrigações que se impõem ao Espírito encarnado em sua luta pela sobrevivência. Os excessos que são cometidos nessas circunstâncias é que dão o tom da personalidade de cada um. A licença para relaxar das pressões do cotidiano jamais deveria ser alvo de discussões, pois faz parte do ciclo de trabalho que, por si mesmo, exige momentos para o repouso do corpo e da mente. A questão 711 de O Livro dos Espíritos enfatiza esse aspecto que mostra a importância da nossa participação nos diversos eventos que o mundo nos oferta, como se vê em seu texto: “O uso dos bens da Terra é um direito de todos os homens? - Esse direito é a conseqüência da necessidade de viver. Deus não pode impor um dever sem conceder os meios de ser cumprido”.
Convenhamos, a alegria cabe em todos os espaços. O desabrochar da alegria na execução da tarefa de cada dia é uma aquisição das mais importantes para o aprendizado de fazer mais e melhor aquilo que se constitui numa obrigação enfadonha na ausência dessa conquista. Como se configura numa dificuldade para a maioria das pessoas a manutenção do estado de leveza enquanto cuida de situações mais complexas, eis que surgem hiatos festivos que transgridem a rigidez do calendário e nos joga nos braços do amplo lazer, onde o som, as cores e a dança trazem uma peculiar necessidade de fazer diferente. Nesse ponto que é fundamental que seja consultada a formação de caráter de cada um.
A certeza de que não somos licenciados para cometer delitos ou exageros, visto que a lei de responsabilidades nos cobra os ônus de cada atitude, surge para definir naquele que é consciente do direito de usufruir sem transgredir, a exata medida em que pode se divertir sem se comprometer física ou emocionalmente com esses momentos passageiros de descontração.
Mantendo o clima de genuína alegria nada impede de festejar a existência e até se afastar por alguns dias das pressões que amarguram o peito, mas nada pode ser vivido fora do contexto sem que caia na vala comum da alienação. No bloco daqueles que seguem sob os batuques que despertam o corpo para uma movimentação rítmica impera que se mantenha a firme certeza de que se amontoam vidas que precisam ser respeitadas e protegidas.
As festividades humanas são um convite para tornar a existência mais suave, isso é essencial para que sejam suportadas as exigências diárias. Cabe àqueles que já atingiram a maturidade espiritual cuidarem do comportamento com que se liberam para vivenciá-las, enquanto vibram para que os imaturos emocionais descubram que viver é tão extraordinário que deveria ser celebrado todos os dias como uma grande festa, sem medo de ser feliz.       

¹ editorial do programa Antena Espírita de 04.02.2018


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