Por que prendemos e imolamos
Jesus? Havia uma música em suas palavras e o verbo que lhe saía da boca
balsamizava a dor e anulava a escassez da falta de poesia de tempos tão
difíceis. Ele fazia silêncios para que Deus nos falasse à alma enquanto sorria
ao dividir a parca porção do alimento compartilhado. Escutava nossas dores com
um olhar que fabricava júbilos interiores e de suas mãos empoeiradas luzes
limpavam as escuridões que habitavam nossos corpos e nossas almas. Entregara os
três últimos anos de sua vida para construir uma realeza em cada pessoa, nem
que fosse uma utopia de futuro, sem confundir o divino com o profano, ensinando
ambos como uma mesma realidade a ser exploradas e conquistadas. Mesmo assim
deixamos que o levassem sob humilhação e chicotadas. Tantos que éramos, mas tão
acovardados que servimos de plateia que aplaudia e repetia impropérios infames,
cooptados pelo medo de gritar bem alto onde é que estavam os inimigos do
razoável.
Ele sabia de si e do quanto
ignorávamos o papel que nos competia. Ignorávamos ou ignoramos? E por quanto
tempo mais? Jesus ainda precisará subir e orar sozinho sobre as montanhas das
aflições humanas? Por quanto tempo ainda vai ser ouvido com disfarçada
incompreensão, enquanto parecemos atentos aos chamados da desfaçatez? Será que,
ao menos, tivemos a atitude de tirá-lo da cruz em que o prendemos, há 2000
anos, ou ainda desejamos o seu sangue derramado sob alegação de desejarmos a
cura de nossas incúrias?
Esse novo dia que nasce traz
um convite, não exatamente para ser comemorado, senão para um despertar. Jesus
e a povo da Terra compõem um grupo só, ele é o condutor desse séquito. As
nossas torpezas não são motivos para a sua desistência. Ele nos vê dos
planaltos de sua evolução e sabe o quanto chegaremos longe, mas avisa que a
estrada precisa de pés para se transformar em caminho. Erramos de escolha no
passado, ele também sabe disso, e já sabia desde muito. Esse dia nos chega com
o convite de acompanharmos Jesus em sua oração de resgate da humanidade.
Enquanto ele ora e vibra, nós trabalhamos com a intenção de vê-lo inserido nos
fatos que se desenrolam. Nesse novo dia podemos prometer a ele que vamos estar
ao seu lado no combate às injustiças e na defesa daqueles que o representam nos
calvários de tantas cruzes que se erguem por não termos aprendido a lição da
partilha. Podemos prometer isso a ele?
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