A
tarefa de olhar nos olhos quando se comunica com outrem não é condição fácil e
às vezes requer treinamento que pode exigir anos de prática. Há receios de toda
sorte em determinadas interlocuções, entre outros, o de ofender a quem escuta
ou ainda de ser mal interpretado de forma a gerar discussões não pretendidas.
Muitas pessoas carregam consigo grandes motivos que foram silenciados por tempo
suficiente para cristalizar desejos e ensejos de uma vida que gostariam de ter
tornado mais feliz.
Na disputa de egos, a intolerância
às divergências se tornou licença para a ocultação de valores individuais, uma
das mais importantes maneiras de abortamento de existências que poderiam ser
promissoras e simplesmente se perdem porque uma espécie de hierarquia
interpessoal invisível afogou o anseio de uns em detrimento do sucesso de
alguém.
Oportunamente Jesus assegura que o
conhecimento da verdade liberta (João VIII; 32), não necessariamente nessa
disposição gráfica. Saber do que liberta e o que é mesma a verdade que propõe
tal liberdade é o que torna árduo compreender tal ensinamento. No mundo das
imperfeições, julgar-se detentor da capacidade de identificar a verdade é uma
estrada com muitos vieses. Historicamente houve tantos a invocarem essa
condição que se chegou à conclusão de que nada mais relativo que a verdade num
mundo como o nosso.
O mais curioso é que nessa
empreitada de incorporar a verdade essencial quanto mais julgamos tê-la parece
que ficamos mais distante dela, perdidos nas próprias relatividades, ou pior,
encarcerados em convicções que afastam de enxergar um horizonte seguro. Habituamos
a “falar para os outros” quando o que tornaria mais fácil a comunicação seria “falar
com os outros”. A pedagogia de Jesus o levava a “falar com as pessoas” e
justamente por essa razão falava por metáforas e parábolas de modo a ser
compreendido de forma diversa pelas individualidades, pois sabia que
forçosamente cada um teria uma compreensão diferente de suas palavras. O que
também significa que Ele sabia que o aprendizado não ocorre por imposição,
senão por ter entendido, o que geralmente leva tempo e paciência.
No jogo de forças a que estamos
submetidos é provável que a arma mais poderosa que pode nos socorrer diante das
tantas verdades relativas, que povoam as informações que nos chegam todos os
dias, é o discernimento oriundo da experiência de Jesus, cuja tendência básica
era combater o mal que havia nas pessoas sem exatamente combatê-las, enquanto
seres que sabia passando por estradas escuras. Ele antevia que um dia aquelas
pessoas absorveriam a claridade de suas palavras e ensinamentos retificando a
loucura dos seus atos.
Não nos enganemos de que estivemos
de ambos os lados da verdade em algum momento de nossa longa romagem evolutiva.
Muitas vezes defendemos o indefensável, o que deve nos propor ponderações
quando utilizamos o verbo em julgamentos. Antes busquemos abraçar o irmão que
está no outro, mesmo que apenas mentalmente, para dispor o que julgamos ser a
verdade que tivemos a possibilidade de alcançar, sem renunciá-la em momento
algum, sob qualquer pretexto, mas entendendo que, se é difícil manter a
caminhada sem desvios, é praticamente impossível saber das grandes inquietações
do coração alheio.
Eis aí uma profunda verdade.
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