Pular para o conteúdo principal

AS RAZÕES DE DEUS


         


        Assim como os irracionais, o ser humano também tem uma programação básica que se manifesta na forma de instintos, a conduzi-lo pelos caminhos da vida. O instinto gregário, que lhe impõe a vida em sociedade. O instinto do acasalamento, que favorece a constituição da família. O instinto sexual, que sustenta a perpetuação da espécie. O instinto de conservação, que o estimula a lutar pela sobrevivência.

        Mas há no Homem, além dos instintos, algo que o distingue dos demais seres da criação – a inteligência, o pensamento contínuo, a capacidade de aprender, de acumular informações e tomar consciência de sua própria existência.


        Com semelhantes conquistas habilita-se a exercitar a razão, a avaliar situações e tomar decisões, desenvolvendo experiências a partir de suas próprias iniciativas nos domínios do livre-arbítrio.

        O problema é que o exercício da razão está subordinado à nossa compreensão, à maneira como vemos o Mundo. Um homem inteligente pode desenvolver ideias contraditórias, estribando-se em raciocínios convincentes.

        É bastante ilustrativo o exemplo de Emmanuel Kant, famoso filósofo alemão que, em seu ensaio a Crítica da Razão Pura suprimia a ideia de Deus. Acontece que Kant tinha um velho criado que era muito religioso e se comovia até as lágrimas por ver seu amo com ideias iconoclastas. O filósofo considerou:

        – O pobre homem não será feliz sem um deus; e as pessoas devem ser felizes neste mundo. O bom senso prático o exige.

        Então, em homenagem ao criado, escreveu a Crítica da Razão Prática, que reinstalava Deus no Universo.

        Lamente-se que Kant não tenha usado sua habilidade filosófica para escrever uma crítica da razão pervertida, demonstrando como sentimentos inferiores podem induzir o homem a seguir por tortuosos caminhos, em descaradas racionalizações.

        Para os romanos era de boa lógica torrar os cristãos na fogueira ou transformá-los em comida de leão. O Cristianismo incomodava. E unia-se o útil ao agradável. O povo precisava de diversão. Os cristãos eram instrumentos ideais. Não reagiam, morriam entoando cânticos de louvor. Um espetáculo magnífico.

        A revolução francesa, contrapondo-se ao absolutismo monárquico, pregava a liberdade, a igualdade e a fraternidade entre os homens, entronizando a deusa razão no lugar da religião. No entanto, revelando uma visão distorcida desses princípios, seus líderes mandavam para a guilhotina, sem nenhuma fraternidade, os que exercitavam a liberdade de criticar-lhes os desmandos. Diz Manon Roland, uma de suas vítimas: – Oh, liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome!

        Em nome da razão, grupos ativistas e pensadores têm procurado justificar ideias que contrariam frontalmente elementares princípios da Lei Natural.

        Em nome da razão fala-se da legalização do aborto no Brasil. Argumenta-se que em nosso país são realizados perto de três milhões de abortos clandestinos, anualmente, por pessoas não habilitadas, sem condições de assepsia, sem higiene, sem cuidados essenciais, principalmente na classe pobre. Há sérios riscos para a mulher, envolvendo particularmente infecções que podem levar à morte.

        Em nome da razão muita gente defende a pena de morte. Afirma-se que a sociedade não deve assumir encargo de alimentar delinquentes e que sua morte serviria para inibir o comportamento criminoso.

        Em nome da razão há quem recomende a eutanásia. Seria um ato de misericórdia para pacientes terminais que estão sofrendo muito. Imperioso abreviar seus padecimentos.

        Enquanto a razão for exercitada a partir de uma visão estreita da existência humana, veremos as pessoas enveredando por tortuosas ideias fantasiadas de racionalidade.

        A grande contribuição que o Espiritismo nos oferece, neste particular, capaz de iluminar a razão, dando-nos condições para trilhar caminhos mais acertados, é a visão do Mundo Espiritual, com o conhecimento do inter-relacionamento entre Espíritos encarnados e desencarnados, e as consequências das ações humanas. Isso nos leva a uma imperiosa retificação de conceitos.

        O aborto é um assassinato intrauterino. O embrião não é uma promessa de vida, mas uma vida em desenvolvimento, com a presença de um Espírito iniciando a reencarnação. Não raro é alguém que veio para reajustes em relação à futura mãe e que, expulso do ventre materno, poderá se voltar contra ela, originando complexos quadros obsessivos. Além do mais a mulher que pratica o aborto provoca lesões em seu perispírito que mais cedo ou mais tarde se refletirão no corpo físico, originando disfunções variadas como esterilidade, infecções renitentes, tumores, frigidez...

        A pena de morte elimina o homem criminoso, mas também libera o criminoso espiritual, com a vantagem da invisibilidade. Ele passa a assediar pessoas com tendências ao crime, perpetuando a violência.

        A eutanásia, além de subtrair dores depuradoras, situa o paciente em posição de perplexidade e turvamento mental que retarda sua readaptação à vida espiritual.

        Com o Espiritismo superamos a visão estreita do homem perecível e atingimos a visão ampla do Espírito imortal, com o que iluminamos o entendimento para que nossas razões, no exercício da inteligência, sejam sempre as razões de Deus, no cumprimento de sua vontade soberana, edificando o futuro de bênçãos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

ANÁLISE DA FIGUEIRA ESTÉRIL E O ESTUDO DA RELIGIÃO

                 Por Jorge Luiz            O Estudo da Religião e a Contribuição de Rudolf Otto O interesse pela história das religiões   remonta a um passado muito distante e a ciência das religiões, como disciplina autônoma, só teve início no século XIX. Dentre os trabalhos mais robustos sobre a temática, notabiliza-se o de Émile Durkheim, As Formas Elementares da Via Religiosa.             Outro trabalhos que causou repercussão mundial foi o de Rudolf Otto, eminente teólogo luterano alemão, filósofo e erudito em religiões comparadas. Otto optou por ser original e abdicou de estudar as ideias sobre Deus e religião e aplicou suas análises das modalidades da experiência religiosa. Ao fazer isso, Otto conseguiu esclarecer o conteúdo e o caráter específico dessa experiência e negligenciou o lado racional e especulativo da religião, sempre...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

SOBRE A INSISTÊNCIA EM QUERER CONTROLAR AS MULHERES

  Gravura da série O Conto da Aia, disponível na Netflix Por Maurício Zanolini Mulheres precisam se casar com homens intelectualmente e financeiramente superiores a elas ou o casamento não vai durar. Para o homem, a esposa substitui a mãe nos cuidados que ele precisa receber (e isso inclui cozinhar, lavar, passar e limpar a casa). Ao homem, cabe o papel de prover para que nada falte no lar. O marido é portanto a cabeça do casal, enquanto a mulher é o corpo. Como corpo, a mulher deve ser virtuosa e doce, bela e recatada, sem nunca ansiar por independência. E para que o lar tenha uma atmosfera agradável, é importante que a mulher sempre cuide de sua aparência e sorria.

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

O MEDO SOB A ÓTICA ESPÍRITA

  Imagens da internet Por Marcelo Henrique Por que o Espiritismo destrói o medo em nós? Quem de nós já não sentiu ou sente medo (ou medos)? Medo do escuro; dos mortos; de aranhas ou cobras; de lugares fechados… De perder; de lutar; de chorar; de perder quem se ama… De empobrecer; de não ser amado… De dentista; de sentir dor… Da violência; de ser vítima de crimes… Do vestibular; das provas escolares; de novas oportunidades de trabalho ou emprego…

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

SOBRE ATALHOS E O CAMINHO NA CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO JUSTO E FELIZ... (1)

  NOVA ARTICULISTA: Klycia Fontenele, é professora de jornalismo, escritora e integrante do Coletivo Girassóis, Fortaleza (CE) “Você me pergunta/aonde eu quero chegar/se há tantos caminhos na vida/e pouca esperança no ar/e até a gaivota que voa/já tem seu caminho no ar...”[Caminhos, Raul Seixas]   Quem vive relativamente tranquilo, mas tem o mínimo de sensibilidade, e olha o mundo ao redor para além do seu cercado se compadece diante das profundas desigualdades sociais que maltratam a alma e a carne de muita gente. E, se porventura, também tenha empatia, deseja no íntimo, e até imagina, uma sociedade que destrua a miséria e qualquer outra forma de opressão que macule nossa vida coletiva. Deseja, sonha e tenta construir esta transformação social que revolucionaria o mundo; que revolucionará o mundo!

PUREZA ENGESSADA

  Por Marcelo Teixeira Era o ano de 2010, a Cia. de teatro da qual Luís Estêvão faz parte iria apresentar, na capital de seu Estado, uma peça teatral que estava sendo muito elogiada. Várias cidades de dois Estados já haviam assistido e aplaudido a comovente história de perdão e redenção à luz dos ensinamentos espíritas. A peça estreara dez anos antes. Desde então, teatros lotados. Gente espírita e não espírita aplaudindo e se emocionando. E com a aprovação de gente conhecida no movimento espírita! Pessoas com anos de estrada que, inclusive, deram depoimento elogiando o trabalho da Cia. teatral.