terça-feira, 26 de março de 2019

AS RAZÕES DE DEUS


         


        Assim como os irracionais, o ser humano também tem uma programação básica que se manifesta na forma de instintos, a conduzi-lo pelos caminhos da vida. O instinto gregário, que lhe impõe a vida em sociedade. O instinto do acasalamento, que favorece a constituição da família. O instinto sexual, que sustenta a perpetuação da espécie. O instinto de conservação, que o estimula a lutar pela sobrevivência.

        Mas há no Homem, além dos instintos, algo que o distingue dos demais seres da criação – a inteligência, o pensamento contínuo, a capacidade de aprender, de acumular informações e tomar consciência de sua própria existência.


        Com semelhantes conquistas habilita-se a exercitar a razão, a avaliar situações e tomar decisões, desenvolvendo experiências a partir de suas próprias iniciativas nos domínios do livre-arbítrio.

        O problema é que o exercício da razão está subordinado à nossa compreensão, à maneira como vemos o Mundo. Um homem inteligente pode desenvolver ideias contraditórias, estribando-se em raciocínios convincentes.

        É bastante ilustrativo o exemplo de Emmanuel Kant, famoso filósofo alemão que, em seu ensaio a Crítica da Razão Pura suprimia a ideia de Deus. Acontece que Kant tinha um velho criado que era muito religioso e se comovia até as lágrimas por ver seu amo com ideias iconoclastas. O filósofo considerou:

        – O pobre homem não será feliz sem um deus; e as pessoas devem ser felizes neste mundo. O bom senso prático o exige.

        Então, em homenagem ao criado, escreveu a Crítica da Razão Prática, que reinstalava Deus no Universo.

        Lamente-se que Kant não tenha usado sua habilidade filosófica para escrever uma crítica da razão pervertida, demonstrando como sentimentos inferiores podem induzir o homem a seguir por tortuosos caminhos, em descaradas racionalizações.

        Para os romanos era de boa lógica torrar os cristãos na fogueira ou transformá-los em comida de leão. O Cristianismo incomodava. E unia-se o útil ao agradável. O povo precisava de diversão. Os cristãos eram instrumentos ideais. Não reagiam, morriam entoando cânticos de louvor. Um espetáculo magnífico.

        A revolução francesa, contrapondo-se ao absolutismo monárquico, pregava a liberdade, a igualdade e a fraternidade entre os homens, entronizando a deusa razão no lugar da religião. No entanto, revelando uma visão distorcida desses princípios, seus líderes mandavam para a guilhotina, sem nenhuma fraternidade, os que exercitavam a liberdade de criticar-lhes os desmandos. Diz Manon Roland, uma de suas vítimas: – Oh, liberdade, quantos crimes se cometem em teu nome!

        Em nome da razão, grupos ativistas e pensadores têm procurado justificar ideias que contrariam frontalmente elementares princípios da Lei Natural.

        Em nome da razão fala-se da legalização do aborto no Brasil. Argumenta-se que em nosso país são realizados perto de três milhões de abortos clandestinos, anualmente, por pessoas não habilitadas, sem condições de assepsia, sem higiene, sem cuidados essenciais, principalmente na classe pobre. Há sérios riscos para a mulher, envolvendo particularmente infecções que podem levar à morte.

        Em nome da razão muita gente defende a pena de morte. Afirma-se que a sociedade não deve assumir encargo de alimentar delinquentes e que sua morte serviria para inibir o comportamento criminoso.

        Em nome da razão há quem recomende a eutanásia. Seria um ato de misericórdia para pacientes terminais que estão sofrendo muito. Imperioso abreviar seus padecimentos.

        Enquanto a razão for exercitada a partir de uma visão estreita da existência humana, veremos as pessoas enveredando por tortuosas ideias fantasiadas de racionalidade.

        A grande contribuição que o Espiritismo nos oferece, neste particular, capaz de iluminar a razão, dando-nos condições para trilhar caminhos mais acertados, é a visão do Mundo Espiritual, com o conhecimento do inter-relacionamento entre Espíritos encarnados e desencarnados, e as consequências das ações humanas. Isso nos leva a uma imperiosa retificação de conceitos.

        O aborto é um assassinato intrauterino. O embrião não é uma promessa de vida, mas uma vida em desenvolvimento, com a presença de um Espírito iniciando a reencarnação. Não raro é alguém que veio para reajustes em relação à futura mãe e que, expulso do ventre materno, poderá se voltar contra ela, originando complexos quadros obsessivos. Além do mais a mulher que pratica o aborto provoca lesões em seu perispírito que mais cedo ou mais tarde se refletirão no corpo físico, originando disfunções variadas como esterilidade, infecções renitentes, tumores, frigidez...

        A pena de morte elimina o homem criminoso, mas também libera o criminoso espiritual, com a vantagem da invisibilidade. Ele passa a assediar pessoas com tendências ao crime, perpetuando a violência.

        A eutanásia, além de subtrair dores depuradoras, situa o paciente em posição de perplexidade e turvamento mental que retarda sua readaptação à vida espiritual.

        Com o Espiritismo superamos a visão estreita do homem perecível e atingimos a visão ampla do Espírito imortal, com o que iluminamos o entendimento para que nossas razões, no exercício da inteligência, sejam sempre as razões de Deus, no cumprimento de sua vontade soberana, edificando o futuro de bênçãos.

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