Pular para o conteúdo principal

AMIGOS, AMIGOS, NEGÓCIOS À PARTE


             



              O mundo da competição pecuniária tornou gigante o fosso que separa as amizades dos negócios com claras demandas egoístas e passageiras, o que tornou desigual e injusta a paisagem social. Por outro lado, e avaliando uma aplicação adequada quando admitimos a existência de negociadores sensatos, sempre que se repete no mundo das convenções humanas o ditado “amigos, amigos, negócios à parte” o objetivo reflete o grau de isenção que deve ser buscado para que se evite misturar espaços relacionais diferentes. Retiradas as acepções puramente ambiciosas, a interpretação faz sentido.

          Investigado sob uma apreciação mais contextualizada, a frase exige que compreendamos que toda e qualquer execução a ser posta em andamento pode ser grifada à condição de negociação, pois são muito raras alternativas que dependam apenas de uma pessoa sem outros personagens agregados à roda dos acontecimentos. No afã de prosseguir fica impossível evitar as discussões próprias de cada atividade, ocasião em que tanto aqueles reconhecidamente amigos como outros desprovidos dessa condição, e que estejam dentro do projeto, são candidatos a opinar.
          As circunstâncias que se interpõem ao arrazoado de escuta é que a justeza de uma opinião deve ser eximida de provir forçosamente de alguém com quem se divide vínculos afetivos, quando se debate idéias e intenta-se alcançar mais longe. De forma alguma os afetos que ligam os componentes de um trabalho em andamento devem permitir que exista menor exatidão quando se debate questões de reconhecida importância. Mormente quando o tema em progressão aponta para soluções coletivas ou ainda impõe reflexões com consequências espirituais para uma comunidade mais ampla. Quando o que está em questão extrapola os círculos restritos da pessoalidade com consequências que podem alcançar instituições e grupos, importa que haja a disposição de todos para uma negociação acima das facilidades que rebaixa a capacidade crítica e pode jogar ladeira abaixo um propósito que tenha pretensões mais elevadas.
          Exatamente pela seriedade compatível com a grandeza da empreitada que Allan Kardec, ao lançar a serie de publicações que compuseram a Revista Espírita (01/01/1858 a 31/03/1869) resolveu não escutar aos muitos apelos dos amigos que julgavam necessário um financiamento externo para aquela publicação. Ciente do quanto havia de manter-se independente naquela gigantesca trajetória o Codificador antevia que o patrocínio financeiro poderia ser um impedimento ao livre exercício das pesquisas e da sua franca vulgarização através daquele periódico.
          Devemos, nós os espíritas do presente, tomar cuidado quando imbuídos dos grandes movimentos de expansão do Espiritismo para não partidarizarmos as decisões em torno de posturas caseiras e viciadas em opiniões de grupos de amigos. A tarefa que se impõe aos espíritas é de fraternidade genuína, aquela que sabe discernir os papéis de cada um em sua lide de trabalho, a qual não pode se confundir com acumpliciamento nem formação de guetos. Jesus, o maior de todos que pisou a Terra, não negociou com os amigos, antes os esclareceu para que merecessem fazer parte do seu negócio divino.  

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ÚLTIMAS INSTRUÇÕES DE ALLAN KARDEC AOS ESPÍRITAS(*)

“Caro e venerado   Mestre, estais aqui presente, conquanto invisível para nós. Desde a vossa partida tendes sido para todos um protetor a mais, uma luz segura, e as falanges do espaço foram acrescidas de um trabalhador infatigável.” (Trecho do discurso de abertura da Sessão Anual Comemorativa aos Mortos de novembro 1869 – Revista Espírita – dez/1869)   Por Jorge Luiz   O discurso de Allan Kardec, proferido na sessão anual da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas - SPEE, comemorativa aos mortos, em 1º de novembro de 1868, "O Espiritismo é uma Religião?" (leia aqui) - Revista Espírita, novembro de 1868 - contêm 3.881 palavras. Nele, Kardec discorre sobre a comunhão de pensamentos, as dimensões da caridade, o verdadeiro sentido de religião e sobre a crença espírita. Foi seu último discurso, pois cinco meses depois ocorre a sua desencarnação. Soa, portanto, como as últimas instruções aos espíritas, da mesma forma que Jesus as realizou aos...

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

JESUS E A QUESTÃO SOCIAL

              Por Jorge Luiz                       A Pobreza como Questão Social Para Hanna Arendt, filósofa alemã, uma das mais influentes do século XXI, aquilo que se convencionou chamar no século XVII de questão social, é um eufemismo para aquilo que seria mais fácil e compreensível se denominar de pobreza. A pobreza, para ela, é mais do que privação, é um estado de carência constante e miséria aguda cuja ignomínia consiste em sua força desumanizadora; a pobreza é sórdida porque coloca os homens sob o ditame absoluto de seus corpos, isto é, sob o ditame absoluto da necessidade que todos os homens conhecem pela mais íntima experiência e fora de qualquer especulação (Arendt, 1963).              A pobreza é uma das principais contradições do capitalismo e tem a sua origem na exploração do trabalho e na acumulação do capital.

PRÓXIMOS E DISTANTES

  Por Marcelo Henrique     Pense no trabalho que você realiza na Instituição Espírita com a qual mantém laços de afinidade. Recorde todos aqueles momentos em que, desinteressadamente, você deixou seus afazeres particulares, para realizar algo em prol dos outros – e, consequentemente, para si mesmo. Compute todas aquelas horas que você privou seus familiares e amigos mais diletos da convivência com você, por causa desta ou daquela atividade no Centro. Ainda assim, rememore quantas vezes você deixou seu bairro, sua cidade, e até seu estado ou país, para realizar alguma atividade espírita, a bem do ideal que abraçaste... Pois bem, foram vários os momentos de serviço, na messe do Senhor, não é mesmo? Quanta alegria experimentada, quanta gente nova que você conheceu, quantos “amigos” você cativou, não é assim?

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.

ESPIRITISMO NÃO É UM ATO DE FÉ

  Por Ana Cláudia Laurindo Amar o Espiritismo é desafiador como qualquer outro tipo de relação amorosa estabelecida sobre a gama de objetividades e subjetividades que nos mantém coesos e razoáveis, em uma manifestação corpórea que não traduz apenas matéria. Laica estou agora, em primeira pessoa afirmando viver a melhor hora dessa história contemporânea nos meandros do livre pensamento, sem mendigar qualquer validação, por não necessitar de fato dela.

A FÉ NÃO EXCLUI A DÚVIDA

  Por Jerri Almeida A fé não exclui a dúvida! No espiritismo, a dúvida dialoga filosoficamente com a fé. O argumento da “verdade absoluta”, em qualquer área do conhecimento, é um “erro absoluto”. No exercício intelectual, na busca do conhecimento e da construção da fé, não se deve desconsiderar os limites naturais de cada um, e a possibilidade de autoengano. Certezas e dúvidas fazem parte desse percurso!

DEMOCRACIA SEM ORIENTAÇÃO CRISTÃ?

  Por Orson P. Carrara Afirma o nobre Emmanuel em seu livro Sentinelas da luz (psicografia de Chico Xavier e edição conjunta CEU/ FEB), no capítulo 8 – Nas convulsões do século XX, que democracia sem orientação cristã não pode conduzir-nos à concórdia desejada. Grifos são meus, face à atualidade da afirmação. Há que se ressaltar que o livro tem Prefácio de 1990, poucas décadas após a Segunda Guerra e, como pode identificar o leitor, refere-se ao século passado, mas a atualidade do texto impressiona, face a uma realidade que se repete. O livro reúne uma seleção de mensagens, a maioria de Emmanuel.