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ECOLOGIA ESPIRITISTA II



“Os adversários do Espiritismo consumiram mil vezes mais forças para o abater, sem o conseguir, do que seus partidários para o propagar.” (Allan Kardec)


Por Jorge Luiz

         Um confrade e amigo questionou-me de haver utilizado autores academistas para elaborar os arrazoados sobre a Ecologia Espiritista.  
            Confesso, pois, que foi intencional e não por falta de argumentos espíritas e kardecianos, além do que, o Espiritismo é o único conjunto de pensamentos cuja complexidade toca toda a área do conhecimento humano. Assim Allan Kardec se reporta em "O Que é o Espiritismo:" “O Espiritismo toca em todos os ramos da filosofia, da metafísica, da psicologia e da moral.”
            Portanto, como a ecologia na sua multidisciplinariedade é algo recente, busquei utilizar-me desse cenário para justificar a necessidade de se desenvolver um pensamento ecológico-espírita nos encaminhamentos das ações dentro do universo espírita em que vivemos, com tantos atalhos e desvios doutrinários. Ademais, desejei delimitar muito bem essas duas linhas de raciocínios.
            Allan Kardec como não poderia deixar de ser, foi o pioneiro da Ecologia Espiritista quando institui os neologismos: Espiritismo, Espíritas, Espiritistas, Mediunidade, Médiuns etc, para contextualizar a Doutrina e os seus seguidores: “Para coisas novas necessitamos de palavras novas, pois assim o exige a clareza de linguagem, para evitarmos a confusão inerente aos múltiplos sentidos dos próprios vocabulários.”
                Idêntica atitude fez ele com relação à questão religiosa, ao declarar "que o Espiritismo não é uma religião, em razão de não haver senão uma palavra para exprimir duas ideias diferentes, e que, na opinião geral, a palavra religião é inseparável da de culto..." (grifos nossos). Isso é um pensamento puramente ecológico.
        Kardec, assim, utilizando-se de construção terminológica, um recurso técnico e pedagógico, delimita e demarca o que seria ou não a sua teoria.
         No Brasil o termo Espiritismo terminou, para o vulgo, sendo confundido com as denominações oriundas do Africanismo. Já na França, atualmente, a palavra espiritualista desapareceu e o Espiritismo representa todo o movimento maior de conformação espiritualista. Contrastes culturais de uma única essência.
            O que caracteriza em um primeiro momento uma atitude ecológica é o cuidado. As raízes da palavra ecologia significam “cuidado com a casa.” Quando da elaboração do Projeto 1868, Allan Kardec adota essa postura e adverte aos Espíritas para essa permanente necessidade. Logo na sua abertura ele afirma:

“Um dos maiores obstáculos capazes de retardar a propagação da Doutrina seria a falta de unidade. O único meio de evitá-la quanto ao presente, pelo menos quanto ao futuro, é formulá-la em todas as suas partes e até nos mais mínimos detalhes, com tanta precisão e clareza, que impossível se torne qualquer interpretação divergente.”

            O Mestre lionês fez isso com precisão cirúrgica. Então se agiu assim o que levou à diversidade de intepretação que hoje se presencia? Errou ele ou erraram os espíritas? Claro que foram os espíritas.
            Ao analisar a trajetória do Espiritismo em solo brasileiro, percebe-se que ele adentra sem sua especificidade própria. Inicia a sua popularização pela Bahia através de Luís Olímpio Telles de Menezes (1828-1893), com forte característica católica. Deslocado para o Rio de Janeiro é submetido a agentes – kardecistas, místicos, espíritas puros, roustainguistas, científicos, swenderborguistas, entre outros - que gravitavam em torno de si como um campo de forças, sem uma definição legítima do que seria Espiritismo, cada qual enfatizando um dos seus aspectos, embora tenham os ensinamentos roustainguistas sido predominantes sob a orientação de Adolfo Bezerra de Menezes.
            Enfrentou ainda os imperativos históricos, sociais e culturais distintos, o que é natural. Quaisquer esquemas culturais, historicamente, em maior ou menor grau, têm seus significados reavaliados quando realizados na prática. São notórios esses aspectos do Espiritismo no Brasil.
            Diante de tal cenário tornou-se impossível prevalecer a pureza doutrinária do Espiritismo.     A popularização do Espiritismo em dias atuais gerou outros graves problemas exaustivamente comentados em artigos anteriores.
            O Espiritismo no Brasil, ao longo de sua marcha tenta se adaptar sob tensão dessas forças, ante outras desenvolvidas por agentes que lutam pela sua preservação, agora já bem mais estudado e compreendido.
            Tudo isso fora previsto pelos Espíritos, assim como também o seu aspecto ecológico que ora reivindico. Em Obras Póstumas, está inserida uma mensagem intitulada “Marcha gradativa do Espiritismo” psicografada através do médium Sr. L..., cujo excerto transcrevo:
            “(...) Plantado em solo ingrato, forçoso é que o cerquem as ervas más e os maus frutos. Mas, também todos os dias o terreno é desbravado, os maus ramos são arrancados ou cortados; o campo destorroa insensivelmente (...)”
            O ecologizar espiritista exige resgatar o cuidado de Kardec na condução das questões atinentes à Doutrina Espírita. É a sublimação do Ideal Espírita que o Espírito da Verdade espera de cada um de nós:
“Espíritas! Amai-vos, este o primeiro ensinamento; Instrui-vos, este o segundo. No Cristianismo encontram-se todas as verdades; são de origem humana os erros que nele se enraizaram.”

Fontes de consulta:
Obras Póstumas – Allan Kardec;
Afinal, Espiritismo é religião? Célia Graça Arribas;
Ilhas de História - Marshal Salim;
“O Livro dos Espíritos” – Allan Kardec;
“O Evangelho Segundo o Espiritismo” – Allan Kardec;
O Que é Espiritismo – Allan Kardec.
Revista Espírita – 1867 – Allan Kardec

Comentários

  1. Jorge Luiz vc escreve bem demais! As citações dos livros consultados são perfeitas! Muito bom! Abraços,
    Vera.

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  2. Seu blog caro amigo Jorge é muito bom,além de ser muito instrutivo,estar bem elaborado,feito com carinho,atenção e respeito.Parabéns pelas materias aqui colocadas e que vc seja iluminado nesse projeto.Abraço.Reginaldo Acioli.

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