Pular para o conteúdo principal

SETE NOITES POR SEMANA



 
    Pai Amâncio, vim pedir-lhe ajuda para meu filho. Tem uma lesão no olho esquerdo. Os médicos afirmam que poderá perder a visão. Estou muito aflita! Rick mal chegou aos vinte anos!...
Justificava-se a preocupação de Adelina. O mal era grave. O outro olho também corria risco.
      Acalme-se, minha filha. Vamos tratar dele espiritualmente, a par do tratamento médico. Receberá passes magnéticos, uma vez por semana. Mas o menino deverá assumir um compromisso...

      O que o senhor mandar, pai. Nenhum sa­crifício será demais para lhe salvar a visão.
      Quero que compareça a todas as reuniões de nosso Centro, o que equivale dizer que ele virá sete noites por semana, com disposição para ouvir aten­tamente os expositores.
 Adelina regressou exultante ao lar. Conhecia a força daquele bondoso Espírito. Já considerava o filho curado. Não atentou, porém, à dificuldade que se evidenciou ao lhe transmitir a re­comendação.
          – Diariamente? Até aos domingos?!
        – Sim, meu querido.
        – Mas, mamãe, a senhora sabe que nunca frequentei o Centro, embora goste de ler sobre Es­piritismo. Assistir às reuniões sete noites por sema­na é impensável!
          – Concordo que não é uma ideia atraente para você. No entanto, é essa a orientação de Pai Amâncio...
– Nem parece "pai"... Isto é coisa de "pa­drasto"!
–Tudo bem, filho. O olho é seu...
Embora a ideia não o agradasse, Rick não tardou em concordar. Em favor de nossa iniciação espiritual, os problemas físicos são mais eloquentes que mil discursos.
Com a fidelidade do náufrago que se agarra a uma tábua de salvação, compareceu durante me­ses às sessões públicas, religiosamente sete noites por semana.
Em princípio, ia contrariado. Mas logo come­çou a se interessar pelas preleções. Gostou. Reti­rou livros na biblioteca. Aprofundou-se no estudo da Doutrina Espírita. E logo pediu serviço...
Adelina exultava. Na primeira oportunidade conversou com o guia:
– Pai Amâncio, quero agradecer-lhe. Sua orientação foi preciosa.
        – O menino sarou do olho?
        – Está bem melhor, mas isso é secundário. O importante é que ele abraçou o serviço no Centro com muito amor!
   Eu sei, minha filha. Tenho acompanhado seus progressos. Saiba que ele tem compromisso com esta casa, assumido no plano espiritual, antes do renascimento.
    Entendo agora sua exigência que, em principio, causou-me estranheza. Nunca o vira pro­ceder assim...
  É que se tratava de um caso especial. Nosso Rick estava maduro para a tarefa. Faltava apenas um estímulo. Eu sabia que daria certo.
  E o senhor acredita que permanecerá fir­me?
  Esperamos que sim, em seu próprio bene­fício. O Espiritismo está em seu sangue. Não se sentirá feliz de outra forma.

                                        * * *
           Todos assumimos determinados deveres ao reencarnar.
  As próprias circunstâncias da vida terrestre nos induzem ao cumprimento daqueles relaciona­dos com família, profissão, vida social.
Os mais difíceis dizem respeito aos ideais de espiritualidade, nos domínios da religião, por­quanto estes dependem, essencialmente, de nossa disposição em cogitar deles. Por isso, não raro, so­mente despertamos para esse esforço com as cla­rinadas do sofrimento.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

JESUS E A IDEOLOGIA SOCIOECONÔMICA DA PARTILHA

  Por Jorge Luiz               Subjetivação e Submissão: A Antítese Neoliberal e a Ideologia da Partilha             O sociólogo Karl Mannheim foi um dos primeiros a teorizar sobre a subjetividade como um fator determinante, e muitas vezes subestimado, na caracterização de uma geração, isso, separando a mera “posição geracional” (nascer na mesma época) da “unidade de geração” (a experiência formativa e a consciência compartilhada). “Unidade de geração” é o que interessa para a presente resenha, e é aqui que a subjetividade se torna determinante. A “unidade de geração” é formada por aqueles indivíduos dentro da mesma “conexão geracional” que processam ou reagem ao seu tempo histórico de uma forma homogênea e distintiva. Essa reação comum é que cria o “ethos” ou a subjetividade coletiva da geração, geração essa formada por sujeitos.

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

O NATAL DE CADA UM

  Imagens da internet Sabemos todos que “natal” significa “nascimento”, o que nos proporciona ocasião para inúmeras reflexões... Usualmente, ao falarmos de natal, o primeiro pensamento que nos ocorre é o da festa natalina, a data de comemoração do nascimento de Jesus... Entretanto, tantas são as coisas que nos envolvem, decoração, luzes, presentes, ceia, almoço, roupa nova, aparatos, rituais, cerimônias etc., que a azáfama e o corre-corre dos últimos dias fazem-nos perder o sentido real dessa data, desse momento; fazem com a gente muitas vezes se perca até de nós mesmos, do essencial em nós... Se pararmos um pouquinho para pensar, refletir sobre o tema, talvez consigamos compreender um pouco melhor o significando do nascimento daquele Espírito de tão alto nível naquele momento conturbado aqui na Terra, numa família aparentemente comum, envergando a personalidade de Jesus, filho de Maria e José. Talvez consigamos perceber o elevado significado do sacrifício daqueles missionári...

A ESTUPIDEZ DA INTELIGÊNCIA: COMO O CAPITALISMO E A IDIOSSUBJETIVAÇÃO SEQUESTRAM A ESSÊNCIA HUMANA

      Por Jorge Luiz                  A Criança e a Objetividade                Um vídeo que me chegou retrata o diálogo de um pai com uma criança de, acredito, no máximo 3 anos de idade. Ele lhe oferece um passeio em um carro moderno e em um modelo antigo, daqueles que marcaram época – tudo indica que é carro de colecionador. O pai, de maneira pedagógica, retrata-os simbolicamente como o amor (o antigo) e o luxo (o novo). A criança, sem titubear, escolhe o antigo – acredita-se que já é de uso da família – enquanto recusa entrar no veículo novo, o que lhe é atendido. Esse processo didático é rico em miríades que contemplam o processo de subjetivação dos sujeitos em uma sociedade marcada pela reprodução da forma da mercadoria.

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

EU POSSO SER MANIPULADO. E VOCÊ, TAMBÉM PODE?

  Por Maurício Zanolini A jornalista investigativa Carole Cadwalladr voltou à sua cidade natal depois do referendo que decidiu pela saída da Grã-Bretanha da União Europeia (Brexit). Ela queria entender o que havia levado a maior parte da população da pequena cidade de Ebbw Vale a optar pela saída do bloco econômico. Afinal muito do desenvolvimento urbanístico e cultural da cidade era resultado de ações da União Europeia. A resposta estava no Facebook e no pânico causado pela publicidade (postagens pagas) que apareciam quando as pessoas rolavam suas telas – memes, anúncios da campanha pró-Brexit e notícias falsas com bordões simplistas, xenofobia e discurso de ódio.

A DOR DO FEMINICÍDIO NÃO COMOVE A TODOS. O QUE EXPLICA?

    Por Ana Cláudia Laurindo A vida das mulheres foi tratada como propriedade do homem desde os primevos tempos, formadores da base social patriarcal, sob o alvará das religiões e as justificativas de posses materiais em suas amarras reprodutivas. A negação dos direitos civis era apenas um dos aspectos da opressão que domesticava o feminino para servir ao homem e à família. A coroação da rainha do lar fez parte da encenação formal que aprisionou a mulher de “vergonha” no papel de matriz e destituiu a mulher de “uso” de qualquer condição de dignidade social, fazendo de ambos os papéis algo extremamente útil aos interesses machistas.

DIVERSIDADE SEXUAL E ESPIRITISMO - O QUE KARDEC TEM A VER COM ISSO?

            O meio espírita, por conta do viés religioso predominante, acaba encontrando certa dificuldade na abordagem do assunto sexo. Existem algumas publicações que tentam colocar o assunto em pauta; contudo, percebe-se que muitos autores tentam, ainda que indiretamente, associar a diversidade sexual à promiscuidade, numa tentativa de sacralizar a heterocisnormatividade e marginalizar outras manifestações da sexualidade; outros, quando abrem uma exceção, ressaltam os perigos da pornografia e da promiscuidade, como se fossem características exclusivas de indivíduos LGBTQI+.