terça-feira, 25 de março de 2014

JULGAMENTOS SILENCIOSOS










“Não julgueis, a fim de que não sejais julgados; porque vós sereis julgados segundo houverdes julgados os outros; e servirá para convosco da mesma medida da qual vos serviste.” (Mt, VII: 1-2)




         


            Certa feita, ao pesquisar uma obra adquirida, verifiquei que fazia referência ao Espiritismo. Lendo a opinião do autor, verifiquei que ele era adepto de outra corrente religiosa, o que me levou a entender o pensamento dele como preconceituoso. Cheguei, inclusive, a tecer crítica à obra para um amigo, o que certamente, por confiança, poderia induzi-lo a multiplicar minha interpretação.
            Passado algum tempo, constatei que a citação nada tinha nada de desairosa ao Espiritismo; que o conteúdo do livro é resultado de anos de experiência do autor na área médico-cirúrgica; que a obra era rica em conhecimentos.
            Descartes recomendava abster-se da precipitação e do preconceito ao se analisar um assunto, tendo como verdadeiro somente o que for claro e distinto.
            É impossível analisar uma obra literária ou científica partindo do prisma de um parágrafo, da mesma forma que é impraticável entender um capítulo lendo-se apenas uma ou duas frases. Portanto, devo reconhecer: naquele momento, agi com precipitação e preconceito.

            A reflexão serve para a vida de relação entre pessoas. Chico Xavier afirmava que Deus nos concede a cada dia escrever uma página no livro do tempo. Em muitas oportunidades emitimos julgamentos silenciosos sobre alguém, considerando apenas um gesto, algumas palavras, uma atitude, ou quando não, levados por opiniões de terceiro.
            Em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, Allan Kardec comenta a passagem de Jesus que utilizamos como epígrafe deste artigo. O Codificador afirma que a censura da conduta alheia pode ter dois motivos: reprimir o mal ou desacreditar a pessoa cujos atos criticamos. Quando a ocorrência sugere o último motivo decorre da maledicência e da maldade.
            Os julgamentos silenciosos quando instruídos pela maldade e maledicência são antagônicos ao princípio da caridade que deve reger as relações entre os indivíduos. Leia-se como Jesus entendia a caridade, na questão nº 886 de “O Livro dos Espíritos”:
“Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições alheias, perdão das ofensas.”
         Na condição de seres pensantes e dotados de livre-arbítrio, em um Planeta povoado ainda por seres imperfeitos, é compreensível que estejamos permanentemente julgando o meio onde convivemos para melhor elaborar diretrizes que objetivem o progresso moral da sociedade como um todo. Em contrapartida, emitir juízos contra as pessoas fere à Lei de Amor, Justiça e Caridade, pois sequer oferece condições de defesa ao “acusado”. Cabe, portanto, o julgamento de comportamentos e não de pessoas. Julgar a ação é diferente de julgar a criatura. Neste caso, o julgamento silencioso é sugerido como ensina Espírito São Luís em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”: quando nos limitamos a observá-lo em proveito pessoal, ou seja, para estudá-lo e evitar aquilo que censuramos nos outros”.
            Quando Jesus afirma que com a mesma medida que serve, se será servido, ele considera a universalidade do princípio psicológico da “projeção”, tendência que o indivíduo tem de projetar nas pessoas e nas coisas seus erros e falhas. É o reservatório moral que trazemos no íntimo: condicionamentos adquiridos na infância ou através das vivências sucessivas.
            “O conhecimento de si mesmo”, ensinado pelo Espírito Santo Agostinho na questão nº 919 de “O Livro dos Espíritos”, é sugestão para que o indivíduo promova um “autojulgamento” - o único permitido e válido na dimensão da individualidade - que é buscar no recôndito da intimidade onde está tudo isso, mesmo sendo aquilo que se considera, preconceituoso, neurótico ou psicótico.

“Qui est sine peccato, primum in illa lapidem mittat.” (1)

 (1)“Quem se sentir sem culpa, atire a primeira pedra.”


(*) blogueiro, livre-pensador e voluntário do Instituto de Cultura Espírita do Ceará.



2 comentários:

  1. Gostei!

    Everaldo - Viçosa do Ceará

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  2. "JULGAR É SEMPRE EMITIR UMA VERDADE SOBRE SI MESMO"
    MUITO VÁLIDA SUA AUTOCRÍTICA NO CASO RELATADO, E A ABORDAGEM ESCLARECEDORA SOBRE O TEMA, COM OS EXEMPLOS ENUMERADOS DE GRANDES PENSADORES E ESPÍRITOS QUE CONTRIBUÍRAM EM VIDA PARA SEDIMENTAR O PENSAMENTO DO CRISTO SOBRE O VALOR DA VERDADEIRA CARIDADE MORAL. PARABÉNS!!!

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