Pular para o conteúdo principal

O VOLUNTÁRIO E A CASA ESPÍRITA



            É comum ouvir no meio espírita sobre a escassez e a falta de compromisso do voluntário espírita. Mito ou realidade?
            O confrade Francisco Castro já tratou da temática em outro momento e trouxe um dado revelador no seu “canteiro” “Sobre as Revelações do Censo de 2010”: os espíritas têm os melhores indicadores de renda e educação em confronto com as demais religiões.”
            Por exemplo, em termo de crescimento relativo a população espírita foi onde ocorreu maior incremento. E mais, 31,5% da população espírita tem nível superior completo, e 15% tem o ensino fundamental
     Ora, se o nível de educação dos profitentes espíritas é um dos melhores, consequentemente, a excelência do voluntariado espírita deve guardar simetria a essa particularidade.

            O voluntariado no mundo é crescente, não só quantitativa como qualitativamente. Ele é essencial à qualidade de vida, à cidadania e traz consigo os valores e a tradição da sociedade. Para Peter Drucker, “a pressão por um serviço comunitário eficaz só aumentará, conforme a sociedade atravessa um período de acentuada transformação.” 
            Nos EUA, por exemplo, em 2001, metade dos americanos (90 milhões de pessoas) trabalhava 3 horas por semana como voluntário. A expectativa para o ano de 2010 foi de que 120 milhões de americanos dedicassem uma média de cinco horas semanais em serviços de voluntariado.
          No Brasil, segundo estudo realizado pelo Conselho Brasileiro de Voluntário Empresarial, 93,8% creem que a participação social e o voluntariado “consolidam valores éticos” e 92,2% concordam que “favorece o trabalho em equipe.”
            Temos que entender que toda essa mobilização segue as transformações que são efetivadas principalmente pela emergência de uma sociedade do conhecimento, isso implica que a educação é o centro dessa sociedade.
            Se diante desse cenário essas estatísticas não se reproduzem no universo espírita, há algo de errado, temos que convir.
         Portanto, o que pressuponho, em um primeiro momento, é de que as dinâmicas existentes nas nossas instituições não estão oferecendo as condições necessárias – administrativa e doutrinária - para que os resultados adequados ocorram tanto no aspecto de adesão, de integração e de permanência dos neófitos espíritas.
              Alkíndar de Oliveira(1) sobre o assunto assim comenta: “Quando o papa da Qualidade Total, W. Edwards Deming, disse que “a maioria dos problemas das organizações não tem a ver com o pessoal, e sim com o sistema”, ele comprovou algo que precisar tornar-se lugar-comum em boa parte das instituições espíritas: chegou a hora de os dirigentes espíritas pararem de dizer “o problema está no pessoal” e passarem a dizer “a solução está no pessoal”. Para isso, entretanto, há a necessidade que o dirigente desenvolva a habilidade para gerenciar competências.
            Há uma necessidade urgente de se romper com a estrutura do pensamento linear-binário ou linear-cartesiano, cujo princípio da identidade é “ou/ou”, do “uma coisa ou outra”, “ou comigo ou contra mim”, conforme define Humberto Mariotti.(1905-1982).(2) Continua ele, “para lidar com problemas complexos, é preciso pensar de modo complexo; para pensar em problemas sem fronteiras, é necessário um pensamento sem fronteiras, isto é, que não esteja fragmentado e suas partes fechadas em compartimentos estanques.”
       O formato de pensar binário-linear, de resultados simplistas e imediatos, é preponderante nos hábitos de nosso tempo em decorrência do imediatismo que permeia as nossas relações. No contexto espírita, quando adotado, esse tipo de pensamento atravanca a marcha do Espiritismo por contribuir para o emparedamento grupal, centralização de poder, a mentalidade partidária, “o bem contra o mal”, e a criação de estilos feudais de gestão.
            Para se iniciar um processo de modificação de todo esse cenário é preciso construir oficinas de diálogos nas casas espíritas. É preciso estimular a forma do pensamento complexo que sai da competitividade para a cooperação. É preciso valorizar o trabalhador voluntário com a riqueza da pluralidade do modo de pensar. Assim, haverá motivação, participação e maior integração no voluntariado espírita. É necessário um compartilhar de conhecimentos e ideias para se expectar novos rumos para o estilo de gestão e convivência espíritas, com repercussões positivas na marcha gradativa do Espiritismo. Tudo isso, é claro, aliados ao estudo sistemático das obras kardecianas.
            Alkíndar sugere ao dirigente espírita que vá depressa com relação à sua mudança comportamental e vá devagar em relação à expectativa de mudança comportamental dos outros. É função de o dirigente espírita criar um cenário democrático para que o voluntário atue e dessa sua atuação  é que resultará a sua efetiva melhoria moral.
            Não sairemos desse cenário de estagnação sem mudar a nossa forma de pensar e agir, forma que levou o físico americano David Bohm(3) (1917-1992) a afirmar que o mundo sofre de “a doença do pensamento.”. Por isso defendo que a Ecologia Espiritista é paradigmática para a implantação de uma melhoria contínua na dinâmica das relações interpessoais da Casa Espírita.

  1.   palestrante, escritor e Consultor de Empresas radicado em São Paulo-SP, profere palestras e ministra treinamentos comportamentais em todo o Brasil. Autor de várias obras que versam sobre a administração espírita.
  2.   foi um poeta, escritor, jornalista, pedagogo, conferencista e intelectual espírita portenho.Foi presidente da Confederação Espírita Argentina de 1935/1937 e 1963/1967, da Sociedade Victor Hugo por várias gestões e diretor da revista de cultura espírita "La Idea".
  3.  físico quântico estadudinense.

Fontes consultadas:    
A Sociedade – Peter Drucker;
O Trabalho Voluntário Na Casa Espírita – Alkíndar de Oliveira;
Pensamento Complexo – Humberto Mariotti;

Comentários

  1. Excelente material. Como todas as matérias postadas neste blog. É de um cuidado especial o trabalho do nosso irmão em nos informar do mundo, principalmente espírita. Muito Obrigado!

    ResponderExcluir
  2. Muito bom! Vou compartilhar com meus amigos no facebook e twitter!

    ResponderExcluir
  3. Ótimo texto. Hoje estou numa casa espírita que se sobressai no quesito 'voluntariado'. A casa funciona todos os dias, nos turnos manhã, tarde e noite, funcionando como o verdadeiro hospital para os espíritos e almas necessitadas... sempre tem uma palavra de apoio e consolo... sempre tem uma "atendimento fraterno"! Isso seria impossível, sem os voluntários. Espero muito, que todos os dirigentes, tenha esse texto como um 'start' para as mudanças necessárias. A seara é grande, trabalho não falta.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Onde vc estar trabalhando? Por isso nunca mais te vi no Ice

      Excluir
    2. Estamos no GEPE (Grupo Espírita Paulo e Estevâo).

      Excluir
  4. A Casa Espírita, como Hospital de Almas, se obriga a possuir uma estrutura de verdadeiro hospital, desde a Diretoria até o mais simples faxineiro. Todos estão envolvidos no trabalho de DOAÇÃO e ACOLHIMENTO aos enfermos que a ela recorrem. Muito objetivo e oportuno este Texto. Que seja levado a sério e colocado em prática, para o bem da Doutrina, dos Atendidos e dos Trabalhadores. Jesus muito agradece.....

    ResponderExcluir
  5. Agora que comecei minha tao longa caminhada mas espero ser uma voluntaria totalmente dedicada porque gosto do que aprendo a cada dia e sei que esse caminho é o certo,ajudar uns aos outros sempre sem cansar,abraço fraterno.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

ASTRÔNOMO DIZ QUE JESUS PODE TER NASCIDO EM JUNHO (*)

  Por Jorge Hessen Astrônomo diz que Jesus pode ter nascido em junho Uma pesquisa realizada por um astrônomo australiano sugere que Jesus Cristo teria nascido no dia 17 de junho e não em 25 de dezembro. De acordo com Dave Reneke, a “estrela de Natal” que, segundo a Bíblia, teria guiado os Três Reis Magos até a Manjedoura, em Belém, não apenas teria aparecido no céu seis meses mais cedo, como também dois anos antes do que se pensava. Estudos anteriores já haviam levantado a hipótese de que o nascimento teria ocorrido entre os anos 3 a.C e 1 d.C. O astrônomo explica que a conclusão é fruto do mapeamento dos corpos celestes da época em que Jesus nasceu. O rastreamento foi possível a partir de um software que permite rever o posicionamento de estrelas e planetas há milhares de anos.

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

TUDO MUDOU. E AS INSTITUIÇÕES?

  Por Orson P. Carrara Os de minha geração, nascidos nas décadas de 60 a 80 ou 90 e, claro, mesmo anteriores, lembram-se perfeitamente do formato de organização e funcionamento de uma padaria, de uma farmácia ou de um mercado, entre outros estabelecimentos comerciais. Hoje temos tais formatos completamente diferentes. O que antes era balcão único de atendimento mudou para prateleiras abertas, inclusive com auto atendimento para pagamento. Antes levávamos o pão para casa, hoje vamos à padaria tomar café para apreciar outras delícias. Farmácias normalmente eram reduzidas, hoje se multiplicaram com total mudança nos atendimentos, face às facilidades virtuais. Nem é preciso citar mais nada, todos estamos muito habituados às facilidades dos dias atuais.

DESCOBRINDO UM ESPIRITISMO LIBERTADOR

  Por Ana Cláudia Laurindo Ser espírita livre em uma sociedade prenhe de padrões e vícios, tem sido a conquista deste tempo, onde não pertencer é sinônimo de alcance, mantendo fidelidade intelectual e moral aos preceitos do livre pensamento. O elitismo de provar que sabe ronda os agrupamentos espíritas brasileiros, inclusive aqueles que se recomendam progressistas, no entanto, as armadilhas dos hábitos de manutenção de perspectivas sociais baseadas em correlação de força que perpassam o status quo, disparam alertas.

DIVERSIDADE SEXUAL E ESPIRITISMO - O QUE KARDEC TEM A VER COM ISSO?

            O meio espírita, por conta do viés religioso predominante, acaba encontrando certa dificuldade na abordagem do assunto sexo. Existem algumas publicações que tentam colocar o assunto em pauta; contudo, percebe-se que muitos autores tentam, ainda que indiretamente, associar a diversidade sexual à promiscuidade, numa tentativa de sacralizar a heterocisnormatividade e marginalizar outras manifestações da sexualidade; outros, quando abrem uma exceção, ressaltam os perigos da pornografia e da promiscuidade, como se fossem características exclusivas de indivíduos LGBTQI+.

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

SOCIALISMO E ESPIRITISMO: Uma revista espírita

“O homem é livre na medida em que coloca seus atos em harmonia com as leis universais. Para reinar a ordem social, o Espiritismo, o Socialismo e o Cristianismo devem dar-se nas mãos; do Espiritismo pode nascer o Socialismo idealista.” ( Arthur Conan Doyle) Allan Kardec ao elaborar os princípios da unidade tinha em mente que os espíritas fossem capazes de tecer uma teia social espírita , de base morfológica e que daria suporte doutrinário para as Instituições operarem as transformações necessárias ao homem. A unidade de princípios calcada na filosofia social espírita daria a liga necessária à elasticidade e resistência aos laços que devem unir os espíritas no seio dos ideais do socialismo-cristão. A opção por um “espiritismo religioso” fundado pelo roustainguismo de Bezerra Menezes, através da Federação Espírita Brasileira, e do ranço católico de Luiz de Olympio Telles de Menezes, na Bahia, sufocou no Brasil o vetor socialista-cristão da Doutrina Espírita. Telles, ao ...

VISÕES NO LEITO DE MORTE¹

Especialista no tratamento de traumas e processo de superação, Dr Julio Peres, analisa as experiências no final da vida e o impacto das visões espirituais ao enfermo e sua família, assim como para os profissionais da saúde que atuam em cuidados paliativos. De acordo com Dr. Júlio Peres, pesquisas recentes demonstram que um grande número de pessoas de distintas culturas têm relatado experiências no final da vida – originalmente chamadas na literatura por end-of-life experiences – sob a forma de visões no leito de morte, sugestivas da existência espiritual. Esta linha de pesquisa tem trazido contribuições que interessam diretamente aos profissionais que atuam com cuidados paliativos e mais especificamente, aqueles que desenvolveram a Síndrome de Burnout decorrente do esgotamento, angústia e incapacidade perante a falta de recursos para lidar com as sucessivas mortes de seus pacientes.