Pular para o conteúdo principal

EDUCAR PARA A COOPERAÇÃO

 

Imagens da internet


Por Orson P. Carrara

Começo minha abordagem com cumprimentos pelo nascimento de uma publicação voltada para a educação, ainda que digital. Aliás, o formato digital é muito facilitador por razões já conhecidas. Devemos todos apoiar tão importante iniciativa, dada sua abrangência.

Convidado a integrar a equipe de articulistas da Revista Educação Espírita, que inaugura com essa edição sua circulação bimestral destinada aos pais, professores, educadores, evangelizadores da infância e juventude, expositores e coordenadores de grupos de estudos – especialmente aqueles voltados famílias –, o sentimento é de alegria e gratidão. Na verdade, o movimento sentia essa necessidade há muito tempo. Gratidão e cumprimentos, pois.

A elaboração de artigos pede uma sequência de reflexões que vai desde o tema a ser abordado, o foco de direção e mesmo o estímulo que se pretende transmitir no texto, com os devidos embasamentos e referências que nortearam sua elaboração e conteúdo. Agendei-me, pois, para escrever o artigo inaugural para um domingo de manhã em que a agenda mostrava-se totalmente liberada.

Logo de manhã ao abrir o celular, deparo-me com postagem da conhecida e atuante amiga Elsa Rossi, que destacava a educadora Maria Montessori. A médica, educadora e pedagoga italiana nasceu em 31 de agosto de 1870 e faleceu em 6 de maio de 1952. Sua contribuição é conhecida pelo método educativo que desenvolveu e que ainda é usado hoje em escolas públicas e privadas mundo afora. Destacou a importância da liberdade, da atividade e do estímulo para o desenvolvimento físico e mental das crianças.

Já se percebe, pois, plena conexão com Pestalozzi – que foi Mestre de nosso Codificador, Allan Kardec. Para ela, liberdade e disciplina se equilibrariam, não sendo possível conquistar uma sem a outra. Adaptou o princípio da autoeducação, que consiste na interferência mínima dos professores, pois a aprendizagem teria como base o espaço escolar e o material didático. Suas pesquisas e estudos, contribuíram significativamente e revolucionaram o modo como a pedagogia via e entendia as crianças, pois seu método estimula a educação através e para a liberdade, além de incentivar a autonomia dos pequenos. Deixou, portanto, um legado importante, que embasa muitos projetos educativos da atualidade.

Mas como referência aqui já citada da postagem que encontrei de manhã, no dia agendado para elaboração do presente artigo, entre suas frases e pensamentos, esta a que utilizamos para base de nosso texto. A frase é:

“As pessoas educam para a competição e esse é o princípio de qualquer guerra. Quando educarmos para cooperarmos e sermos solidários uns com os outros, nesse dia estaremos a educar para a paz.”

Notem os detalhes vitais dentro de uma frase mínima:

a)     Princípio de qualquer guerra – A educação para a competição, ainda em voga na mentalidade social, essa ânsia de competição (em todos os sentidos, em qualquer ângulo que se observe), é princípio de qualquer guerra, no dizer da educadora. Facilmente constatada, essa realidade não está apenas na guerra entre nações, mas está também no cenário político ou esportivo, cultural de um país, e mesmo dentro do lar entre cônjuges, irmãos ou famílias, empresas ou inclusive nas agremiações religiosas. A disputa das ideias também é originária do egoísmo, da vaidade, das vãs pretensões ou de ambições e mesmo do orgulho das imposições e das manipulações descabidas.

b)     Educarmos para cooperarmos e sermos solidários uns com os outros – Visualmente constatável aqui no texto, em comparação com o item anterior, não há dúvida que o sentimento e iniciativa de cooperação e solidariedade são providências de vulto, constituindo-se em verdadeiras e preciosas soluções para alterar o cenário conflituoso do planeta e mesmo dentro dos lares, na convivência conjugal ou familiar. E, sem dúvida, em outros segmentos como a política, o esporte, as artes, nas comunicações e na cultura em geral.

c)     Educar para a paz – Na sábia expressão da educadora está a proposta do Evangelho que em tudo nos convida para a harmonia (virtude perfeitamente conectada com outras aqui citadas) e no caráter educativo do Espiritismo, que nos apresenta o orgulho e o egoísmo como o maior obstáculo para o progresso (questão 785 de O Livro dos Espíritos), imperfeições morais absolutamente contrárias à paz. O educar para a paz inclui, claro, a solidariedade e a cooperação, que estão embutidas na proposta educativa.

Essa cultura de paz, tanto na frase de Montessori como nos fundamentos espíritas, encontra direção corretíssima nas causas que a prejudicam. Afinal, como indica Kardec em A Gênese (capítulo 18 – item 18): “Enquanto o orgulho e o egoísmo o dominarem, o homem se servirá da sua inteligência e dos seus conhecimentos para satisfazer às suas paixões e aos seus interesses pessoais, razão por que os aplica em aperfeiçoar os meios de prejudicar os seus semelhantes e de os destruir”.

Essa busca desenfreada pela satisfação das paixões e dos interesses pessoais – aperfeiçoando os meios de explorar o próximo – é a causa do complexo momento vivido pelo planeta, que ainda educa para a competição (princípio de qualquer guerra – entenda-se conflitos de toda ordem), cujo panorama temos o dever de alterar para melhorar a sociedade. Isso se fará com a educação que estimula a cooperação e a solidariedade, como bem destacou a educadora.

Cooperar e solidarizar-se é cultura integrativa, de inclusão. Fala-se tanto em inclusão social, mas ainda estamos teóricos, defendendo interesses próprios e estimulando competições de toda ordem. Daí a confusão reinante.

A ausência cooperação é fruto dessa tensão dominante dos relacionamentos, onde a cultura ainda é de dominação e de competição, como se pudéssemos nos sobrepor sobre nossos semelhantes (não importa em qual segmento situemos a análise), sem repercussões e desdobramentos no tempo e no espaço.

Sábia, pois, a colocação da notável educadora, perfeitamente compatível com o Evangelho e com o Espiritismo.

Referida citação convida pais, educadores, evangelizadores, coordenadores de equipes de trabalho ou de estudo, empresários, autoridades, profissionais de todas as áreas, homens e mulheres comuns, e a nós próprios, revermos nossos posicionamentos.

Quando se fala em educação, pensa-se indevidamente apenas em crianças. Mas jovens e adultos, todos precisamos nos educar. Notem os amigos que o embasamento doutrinário do Espiritismo não inclui apenas crianças, e o pensamento de Montessori igualmente traz esse perfil.

 Educar para a paz inclui esses cuidados.

 

 

 

 

 

Nota do autor: Matéria publicada originariamente na REVISTA EDUCAÇÃO ESPÍRITA, lançada em março de 2024 no formato digital.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

DEUS¹

  No átimo do segundo em que Deus se revela, o coração escorrega no compasso saltando um tom acima de seu ritmo. Emociona-se o ser humano ao se saber seguro por Aquele que é maior e mais pleno. Entoa, então, um cântico de louvor e a oração musicada faz tremer a alma do crente que, sem muito esforço, sente Deus em si.

SOCIALISMO E ESPIRITISMO: Uma revista espírita

“O homem é livre na medida em que coloca seus atos em harmonia com as leis universais. Para reinar a ordem social, o Espiritismo, o Socialismo e o Cristianismo devem dar-se nas mãos; do Espiritismo pode nascer o Socialismo idealista.” ( Arthur Conan Doyle) Allan Kardec ao elaborar os princípios da unidade tinha em mente que os espíritas fossem capazes de tecer uma teia social espírita , de base morfológica e que daria suporte doutrinário para as Instituições operarem as transformações necessárias ao homem. A unidade de princípios calcada na filosofia social espírita daria a liga necessária à elasticidade e resistência aos laços que devem unir os espíritas no seio dos ideais do socialismo-cristão. A opção por um “espiritismo religioso” fundado pelo roustainguismo de Bezerra Menezes, através da Federação Espírita Brasileira, e do ranço católico de Luiz de Olympio Telles de Menezes, na Bahia, sufocou no Brasil o vetor socialista-cristão da Doutrina Espírita. Telles, ao ...

SOBRE ATALHOS E O CAMINHO NA CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO JUSTO E FELIZ... (1)

  NOVA ARTICULISTA: Klycia Fontenele, é professora de jornalismo, escritora e integrante do Coletivo Girassóis, Fortaleza (CE) “Você me pergunta/aonde eu quero chegar/se há tantos caminhos na vida/e pouca esperança no ar/e até a gaivota que voa/já tem seu caminho no ar...”[Caminhos, Raul Seixas]   Quem vive relativamente tranquilo, mas tem o mínimo de sensibilidade, e olha o mundo ao redor para além do seu cercado se compadece diante das profundas desigualdades sociais que maltratam a alma e a carne de muita gente. E, se porventura, também tenha empatia, deseja no íntimo, e até imagina, uma sociedade que destrua a miséria e qualquer outra forma de opressão que macule nossa vida coletiva. Deseja, sonha e tenta construir esta transformação social que revolucionaria o mundo; que revolucionará o mundo!

ESPIRITISMO E POLÍTICA¹

  Coragem, coragem Se o que você quer é aquilo que pensa e faz Coragem, coragem Eu sei que você pode mais (Por quem os sinos dobram. Raul Seixas)                  A leitura superficial de uma obra tão vasta e densa como é a obra espírita, deixada por Allan Kardec, resulta, muitas vezes, em interpretações limitadas ou, até mesmo, equivocadas. É por isso que inicio fazendo um chamado, a todos os presentes, para que se debrucem sobre as obras que fundamentam a Doutrina Espírita, através de um estudo contínuo e sincero.

O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

“Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)             Por Jorge Luiz                  Cento e sessenta e três anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outros países.” ...

É HORA DE ESPERANÇARMOS!

    Pé de mamão rompe concreto e brota em paredão de viaduto no DF (fonte g1)   Por Alexandre Júnior Precisamos realmente compreender o que significa este momento e o quanto é importante refletirmos sobre o resultado das urnas. Não é momento de desespero e sim de validarmos o esperançar! A História do Brasil é feita de invasão, colonização, escravização, exploração e morte. Seria ingenuidade nossa imaginarmos que este tipo de política não exerce influência na formação do nosso povo.

O ESPIRITISMO É PROGRESSISTA

  “O Espiritismo conduz precisamente ao fim que se propõe todos os homens de progresso. É, pois, impossível que, mesmo sem se conhecer, eles não se encontrem em certos pontos e que, quando se conhecerem, não se deem - a mão para marchar, na mesma rota ao encontro de seus inimigos comuns: os preconceitos sociais, a rotina, o fanatismo, a intolerância e a ignorância.”   Revista Espírita – junho de 1868, (Kardec, 2018), p.174   Viver o Espiritismo sem uma perspectiva social, seria desprezar aquilo que de mais rico e produtivo por ele nos é ofertado. As relações que a Doutrina Espírita estabelece com as questões sociais e as ciências humanas, nos faculta, nos muni de conhecimentos, condições e recursos para atravessarmos as nossas encarnações como Espíritos mais atuantes com o mundo social ao qual fazemos parte.

OS ESPÍRITAS E OS GASPARETTOS

“Não tenho a menor pretensão de falar para quem não quer me ouvir. Não vou perder meu tempo. Não vou dar pérolas aos porcos.” (Zíbia Gaspareto) “Às vezes estamos tão separados, ao ponto de uma autoridade religiosa, de um outro culto dizer: “Os espíritas do Brasil conseguiram um prodígio:   conseguiram ser inimigos íntimos.” ¹ (Chico Xavier )                            Li com interesse a reportagem publicada na revista Isto É , de 30 de maio de 2013, sobre a matéria de capa intitulada “O Império Espírita de Zíbia Gasparetto”. (leia matéria na íntegra)             A começar pelo título inapropriado já que a entrevistada confessou não ter religião e autodenominou-se ex-espírita , a matéria trouxe poucas novidades dos eventos anteriores. Afora o movimento financeiro e ...