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É MORRENDO QUE SE VIVE...

 


Por Roberto Caldas


A vida flui como um rio caudaloso que passa sempre adiante. Palmo a palmo de sua trajetória encontra situações que a paisagem oferece enquanto desliza planície abaixo. Por mais distante que esteja do oceano guarda a certeza de que cedo ou tarde, depois de toda a trajetória será recebido num grande abraço pelo senhor das águas. Onde descansará do percurso acrescentando o sabor de sal com que sonhara tantas vezes.

            Retornando à experiência corporal o Espírito imortal recebe o organismo que as eras plasmaram numa viagem que a gestação imita, desde o unicelular, até alcançar a expressão humana e sob essa conformação eclode para mais uma existência. Sabe de antemão que a precariedade celular, por mais que suporte a corrosão do tempo, tem prazo para entregar à terra os elementos orgânicos e inorgânicos.

            O corpo precisa se desintegrar com a finalidade de devolver, ao mundo que lhe é próprio, o ser espiritual que lhe animava as ações. E esse ser estar ciente de que outras vezes vai precisar passar pelo recurso do nascimento e da morte com a finalidade de palmilhar a estrada que o conduz a Deus.

            Decorridas as experiências tão variadas, derivadas das provas específicas que importam às necessidades peculiares, ao cair das cortinas do cenário alcança uma realidade ignorada por aqueles que fizeram parte da existência concluída. Os amigos, os afetos que choram a despedida não raramente se deixam levar pela aparência de despedida e são tocados pelos acordes da dor da saudade.

            Impossível deter o cavalgar dos dias e das noites. E nesse tropel que estabelece o tempo, a existência de cada um cursa numa trajetória cheia de curvas e repleta de esquinas, diante das quais mãos se soltam e olhares se perdem. Não há garantias do que há de suceder entre o nascer sol e o despontar das estrelas.

            Diante da possibilidade de abraçar-nos com o imponderável que envolve cada minuto da existência corporal vale especular a sabedoria que se encontra invisível nas despedidas impostas pelos fenômenos que tornam a morte a mais vívida certeza e a mais misteriosa estratégia de Deus. 

            Convém buscar o conforto dos nossos receios naqueles, cujos exemplos são legados de superação ao medo da morte. Homens e mulheres dotados de refinada capacidade de entenderem a vida sem os muros que impedem o livre trânsito da alma entre as diversas dimensões da labuta espiritual mesmo enquanto vestidos de um corpo físico

O peregrino de Assis, cuja simplicidade encadernou sob o codinome de Francisco, atendendo ao chamado de sua reflexão mais profunda. Sabia que não havia nada que pudesse separar a natureza espiritual da natureza humana. Entoou hinos à vida plena entre todos os seres vivos do planeta e quando se referiu a viagem para o outro plano de existência, convidou-nos à serenidade da vida que continua: “É morrendo que se vive para a vida eterna”.  

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