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EVOLUÇÃO E PROGRESSO MORAL


 

Por Jorge Luiz

             Conta-se que um famigerado ladrão chamou a atenção de Confúcio; este, com efeito, supunha poder convertê-lo à sua moral, buscou-o com o propósito de assim agir.

            Passado certo período, eis que o ladrão se cansou das palavras e se considerou importunado, exclamando: “És mais pueril que uma criança. Tua moral é boa para ti, mas não é boa para mim! Ensina-me, portanto, outro aspecto de moral, se quiseres que eu te compreenda”.

            Obviamente, Confúcio viu-se obrigado a recuar e recebera, em matéria de educação, uma grande lição. Vale a máxima da porca e o parafuso: se apertar demais, a rosca espana.

           O exemplo confuciano é ilustrativo nesses tempos de tola estupidez em que não se encontra distinção nem mesmo entre o escriba e o néscio; é da mole humana. É um fenômeno universal que salta aos olhos.

           No capítulo VIII, do livro III de O Livro dos Espíritos (OLE), especificamente, nas questões nº 779 a 785, os Reveladores Celestes tratam sobre a marcha do progresso e explicitam que o progresso moral nem sempre segue o progresso intelectual e que, para isto ocorrer, há a necessidade da elasticidade da compreensão entre o bem e o mal. Eles advertem, ainda, que o desenvolvimento do livre-arbítrio segue o crescimento da inteligência, conforme a questão 97 de (OLE). Os Reveladores assinalam que a hierarquia entre os Espíritos é ilimitada, pois é impossível estabelecer uma gradação com barreira. Allan Kardec foi mister ao estabelecer, de forma didática, a escala espírita, a partir da questão nº 100 (OLE).

            Apesar de a hierarquia moral ser ilimitada, o conhecimento humano é limitado, como está dito nas questões nº 17 a 20 de (OLE). O véu se ergue na medida em que ele se depura, mas, para compreensão de certas coisas, necessita de faculdades que ainda não possui.

Partindo dessas especificações doutrinárias, é necessário que se estabeleça uma diferença didática entre evolução e progresso moral.

A evolução ocorre com o conhecimento humano, inclusive no que se refere ao conhecimento científico, e quando também pelo tempo na erraticidade. O progresso moral só ocorre na labuta das reencarnações.

Compreende-se que as estruturas psíquicas dos Espíritos enquanto encarnados têm predisposições atávicas e ainda sofrem as influências do meio. O automatismo individual produzido pelos hábitos sociais vem produzindo homens autômatos e escravos dos condicionamentos do mundo. A cidadania espírita, que deve ser promotora de um homem novo, vem sendo aviltada por esses condicionamentos sociais e vibra em ambientes psíquicos de torpeza, vilania e sordidez, ferindo os princípios básicos de Humanidade, onde o estupro, a tortura, a misoginia e a xenofobia perderam-se em polarização político-partidária em decorrência de uma compreensão inadequada do conjunto doutrinário espírita, de construção de nova ordem social; de nova ordem política.

Nesse universo de contradições, há espíritas que padecem da mesma normose de outros ciclos ditos cristãos, formulados por teorias incompatíveis com o cristianismo nascente, que, também, de ranço do religiosismo igrejeiro, amputou os ideais de se reviver esse cristianismo por iniciativas do Espiritismo.

Conhecimento por si só é evolução. Ele deve percorrer as etapas necessárias do progresso moral – pensar, sentir e agir. É preciso entender que a Doutrina Espírita fala da maturidade moral, não bastando se afirmar espírita e calçar “sandálias da humildade” para se tornar, efetivamente, espírita. A vivência espírita parte da compreensão do homem como ser trino – espírito, perispírito e corpo. Esta composição o faz participar da natureza animal, com os instintos, e pela inteligência – alma – da natureza dos Espíritos. Esta condição o faz ainda partícipe de duas cidadanias, a terrestre e a cósmica, a última como meta maior.

No caminho entre as jornadas da evolução e do progresso moral, o espírita não pode permanecer de mãos postas aos céus, transformando-se em joguete dos aparelhamentos ideológicos de plantão, e sim, um agente ativo na transformação moral de si e do mundo. Há a necessidade de que o espírita seja diferente, ao assim se sentir, participar do mundo, não sendo do mundo.

 

 

REFERÊNCIAS:

AMORIM, Deolindo. Análises espíritas. Brasília, 1993.

KARDEC, Allan. O livro dos espíritos. Brasília, 2000.

TAISEN, Deshimaru. A tigela e o bastão. São Paulo, 1983.

 

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