Pular para o conteúdo principal

SENHOR, O QUE QUERES QUE EU TE FAÇA?

 

 

 

Em uma passagem bem significativa de O Novo Testamento, há o relato do cego chamado Bartimeu que estava sentado na beira do caminho, na saída de Jericó, a pedir esmola. Ouvindo as pessoas que alertavam sobre a presença do Mestre passando por ali, o pedinte, desejando comunicar-se com o Cristo, começou a gritar: - “Jesus, filho de Davi, tem misericórdia de mim”. O amável Rabi, notando sua presença, mandou lhe chamar e perguntou-lhe:

- O que queres que te faça?

Imediatamente, o não vidente, clamou:

- Mestre, que eu volte a ver.

O Cristo, então, restabelece a visão de Bartimeu, afirmando-lhe que a sua fé o tinha curado (1) (Os grifos são nossos).

Em outro acontecimento de “O Novo Testamento”, exatamente no livro Atos dos Apóstolos, um entusiasta fariseu, contumaz inimigo dos cristãos, arvorando-se no direito vergonhoso de inquisidor religioso, em Jerusalém, resolve pedir cartas ao príncipe dos sacerdotes para as sinagogas de Damasco com o fim de prender os cristãos que se organizavam na província da Síria. Na estrada, perto da cidade, repentinamente, uma luz brilhante cai sobre Paulo e seus companheiros, derrubando-os. De imediato, todos levantaram-se, exceto Saulo, desde que se achava prostrado por terra.

Ouviu-se, então, uma voz que, em língua hebraica, dizia:

Saulo, Saulo, por me persegues? Dura cousa é recalcitrares contra os aguilhões.

Respondeu ele:

- Quem és tu, Senhor?

O destemido fariseu recebe a seguinte resposta:

- Eu sou Jesus, a quem tu persegues (2).

Então, o homem pergunta ao Cristo:

 - QUE FAREI, SENHOR? (3) (Os grifos são nossos).

O anseio de Bartimeu e de Paulo estão bem marcantes, nesses textos, e fica a mesma questão no ar, para mim e para os leitores deste conceituado Jornal, perguntando ao Guia e Modelo Maior de toda a Humanidade:

- O QUE QUERES, SENHOR, QUE EU TE FAÇA? (Os grifos são nossos).

Aproveitando o nosso propósito de o seguir, Jesus poderia nos lembrar:

- Sabes os mandamentos: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe (4).

Pode, igualmente, o Mestre afiançar:

- Neguem-se a si mesmos... (5), indicando uma nova caminhada, para a nossa libertação, paulatinamente, das algemas do egoísmo, do orgulho, da vaidade e de outros sentimentos inferiores, o que a Doutrina Espírita pode nos facultar, com suas diretrizes essencialmente pedagógicas e reformistas.

O magnânimo Allan Kardec alertou que

[...] o Espiritismo é, sem contradita, o mais poderoso elemento de moralização, porque mina pela base o egoísmo e o orgulho, facultando um ponto de apoio à moral. Há feito milagres de conversão; é certo que ainda são apenas curas individuais, e não raro parciais. O que, porém, ele há produzido com relação a indivíduos constitui penhor do que produzirá um dia sobre as massas. Não lhe é possível arrancar de um só golpe as ervas daninhas. Ele dá a fé e a fé é a boa semente, mas mister se faz que ela tenha tempo de germinar e de frutificar, razão por que nem todos os espíritas já são perfeitos (6).

“Oportunidade de retorno”

Pode, igualmente, Jesus nos advertir, dirigindo-se a cada um de nós:

- Procura reconciliar-te com teu adversário, enquanto estás com ele a caminho. Senão o adversário te entregará ao juiz, o juiz te entregará ao oficial de justiça, e tu serás jogado na prisão. Em verdade eu te digo: dali não sairás, enquanto não pagares o último centavo (7).

Como é importante, a valorização da encarnação terrena, evitando a formação de laços de inimizade e, em havendo a discordância, procurar, com todo o esforço possível, a concórdia. Jesus relata que o ser refratário à harmonia e comprometido com a Lei Divina terá a oportunidade de resgatar seus débitos, em próximas vivências encarnatórias.

Portanto, o que fazer? Empregar todos os esforços para ser feliz na empreitada da expiação, necessária à reeducação do Espírito, e que a vitória seja alcançada, saindo-se vencedor de si mesmo, triunfando sobre a pena da tortura do remorso que é vivenciada com a aparência de ser eterna, parecendo que nunca mais se extinguirá.

Contudo, o Pai, Criador da Vida, extremamente misericordioso, concede ao réu a oportunidade do retorno ao front, na linha de frente de ordem física, através da reencarnação, do “nascer de novo”, outorgado com a obrigatoriedade do regresso ao mundo de carne, onde terá, além do ensejo da expiação, a oportunidade da provação (8), a ocasião de crescer mais espiritualmente, despertando imanentes potencialidades, auferindo aptidões, resgatando, enfim, o último ceitil, saindo felizmente da prisão. Deus, verdadeiramente, é AMOR (9).

“Toda ação gera uma reação”

O Cristo certamente nos alertará a respeito da liberdade desfrutada pela criatura divina, outorgada com o livre-arbítrio; porém, submetida a uma ordem legislativa cósmica (Lei de Causa e Efeito): “O que comete erro é escravo do erro” (10); “Olha que já estás curado, não erres mais para que não te suceda cousa pior” (11); “Não julgues para não sejas julgado” (12); “Com o critério com que julgares, serás julgado, e com a medida com que tiveres medido te medirão também” (13); “Quem leva para cativeiro, para cativeiro vai (...)” (14) e “a cada um segundo suas obras” (15). “É inevitável que venham escândalos, mas ai do homem pelo qual vem o escândalo” (16).

Toda ação praticada gera uma reação. O espírito, tendo o direito do uso de seu livre-arbítrio, tem igualmente a responsabilidade pelos atos que praticar. A sementeira é livre; contudo, a colheita é obrigatória.

As desarmonias do presente são quase sempre reflexos de um passado em erro e, através das vivências sucessivas, do chamado “nascer de novo”, recebemos a oportunidade da reabilitação. Somente a doutrina da reencarnação preenche o vazio de alguém que se encontra em sofrimento intenso sem saber o porquê, acreditando que o acaso preside a tudo.

Jesus exige de todos nós a prática dos seus ensinos como prova segura da sua “salvação”, ou seja, do seu despertamento espiritual em um mundo de regeneração, clamando:

- Venha, bendito de meu Pai! Entra na posse do reino que te está preparado desde a fundação do mundo, porque tive fome e me deste de comer; tive sede e me deste de beber; era forasteiro e me hospedaste; estava nu e me vestiste; enfermo e me visitaste; preso e foste ver- me (17).

Em um momento tão trágico como a separação dos bons dos maus, a assertiva crística e, consequentemente, espírita, se faz presente:

- Fora da caridade não há salvação (18).

Não é exigida, nesse instante, qualquer filiação religiosa, nem mesmo se alude ao sacrifício do Mestre na cruz. Salvo é aquele que serve ao Cristo na pessoa do próximo.

“Jesus advertia”

O estimado Rabi advertirá a todos aqueles que pensam seguir-lhe as pegadas, arvorando-se no direito teórico de legítimos seguidores do Evangelho; porém, sendo adversários dos profitentes de outras crenças ou mesmo seguindo a vida como declaradamente infiéis religiosos: Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos céus, mas apenas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor, Senhor’, não profetizamos nós em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios e não realizamos muitos milagres? Então eu lhes direi claramente: ‘Nunca vos conheci. Afastem-se de mim, os que praticais a iniquidade’ "

 

Considerações finais

Quando decidiremos, em verdade, seguir o Cristo, no caminho trilhado com as pegadas da fraternidade legítima? Quando pegaremos no arado e não olharemos para trás?

Portanto, caros irmãos leitores , necessário é buscarmos primordialmente a nossa transformação moral, esforçando-nos o máximo possível para dominar nossas más inclinações e caminhar serenamente com o amoroso Rabi. Que possamos o mais rápido possível realizar nosso encontro maior com Jesus, assim como ocorreu com o iniciado de Damasco!

Quando o momento propício da nossa mudança interior acontecer, não mais precisaremos deambular em confusão, pois que receberemos a resposta do Alto a dizer, precisamente nos refolhos da alma de cada um de nós: “Este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado...” (20).

 

Bibliografia

1- “O Evangelho Segundo Marcos”, X: 46-52; 2- “Atos dos Apóstolos”, IX: 4-5; 3- Idem, XXII: 10; 4- “O Evangelho Segundo Lucas”, XVIII: 20; 5- Idem, IX:23; 6- Kardec, Allan, “Obras Póstumas”, 1ª parte – O egoísmo e o orgulho; 7- “O Evangelho Segundo Mateus”, V: 25-26; 8- Kardec, Allan, “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, Cap. V: 9; 9- “1ª Epístola de João”, IV:8; 10- “O Evangelho Segundo João”, VIII: 3-4; 11- Idem, V: 14; 12- “O Evangelho Segundo Mateus”, VII: 1; 13- “O Evangelho Segundo João”, VII: 2; 14- “Apocalipse”, XIII: 10; 15- Idem, XXI; 12; 16- “O Evangelho Segundo Mateus”, XVIII: 7; 17- Idem, XXV: 34-43; 18- Kardec, Allan, “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, Cap. V: 8; 19- “O Evangelho Segundo Mateus”, VII: 23; 20- “O Evangelho Segundo Lucas”, XV: 24.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

DEUS¹

  No átimo do segundo em que Deus se revela, o coração escorrega no compasso saltando um tom acima de seu ritmo. Emociona-se o ser humano ao se saber seguro por Aquele que é maior e mais pleno. Entoa, então, um cântico de louvor e a oração musicada faz tremer a alma do crente que, sem muito esforço, sente Deus em si.

SOCIALISMO E ESPIRITISMO: Uma revista espírita

“O homem é livre na medida em que coloca seus atos em harmonia com as leis universais. Para reinar a ordem social, o Espiritismo, o Socialismo e o Cristianismo devem dar-se nas mãos; do Espiritismo pode nascer o Socialismo idealista.” ( Arthur Conan Doyle) Allan Kardec ao elaborar os princípios da unidade tinha em mente que os espíritas fossem capazes de tecer uma teia social espírita , de base morfológica e que daria suporte doutrinário para as Instituições operarem as transformações necessárias ao homem. A unidade de princípios calcada na filosofia social espírita daria a liga necessária à elasticidade e resistência aos laços que devem unir os espíritas no seio dos ideais do socialismo-cristão. A opção por um “espiritismo religioso” fundado pelo roustainguismo de Bezerra Menezes, através da Federação Espírita Brasileira, e do ranço católico de Luiz de Olympio Telles de Menezes, na Bahia, sufocou no Brasil o vetor socialista-cristão da Doutrina Espírita. Telles, ao ...

SOBRE ATALHOS E O CAMINHO NA CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO JUSTO E FELIZ... (1)

  NOVA ARTICULISTA: Klycia Fontenele, é professora de jornalismo, escritora e integrante do Coletivo Girassóis, Fortaleza (CE) “Você me pergunta/aonde eu quero chegar/se há tantos caminhos na vida/e pouca esperança no ar/e até a gaivota que voa/já tem seu caminho no ar...”[Caminhos, Raul Seixas]   Quem vive relativamente tranquilo, mas tem o mínimo de sensibilidade, e olha o mundo ao redor para além do seu cercado se compadece diante das profundas desigualdades sociais que maltratam a alma e a carne de muita gente. E, se porventura, também tenha empatia, deseja no íntimo, e até imagina, uma sociedade que destrua a miséria e qualquer outra forma de opressão que macule nossa vida coletiva. Deseja, sonha e tenta construir esta transformação social que revolucionaria o mundo; que revolucionará o mundo!

ESPIRITISMO E POLÍTICA¹

  Coragem, coragem Se o que você quer é aquilo que pensa e faz Coragem, coragem Eu sei que você pode mais (Por quem os sinos dobram. Raul Seixas)                  A leitura superficial de uma obra tão vasta e densa como é a obra espírita, deixada por Allan Kardec, resulta, muitas vezes, em interpretações limitadas ou, até mesmo, equivocadas. É por isso que inicio fazendo um chamado, a todos os presentes, para que se debrucem sobre as obras que fundamentam a Doutrina Espírita, através de um estudo contínuo e sincero.

O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

“Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)             Por Jorge Luiz                  Cento e sessenta e três anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outros países.” ...

É HORA DE ESPERANÇARMOS!

    Pé de mamão rompe concreto e brota em paredão de viaduto no DF (fonte g1)   Por Alexandre Júnior Precisamos realmente compreender o que significa este momento e o quanto é importante refletirmos sobre o resultado das urnas. Não é momento de desespero e sim de validarmos o esperançar! A História do Brasil é feita de invasão, colonização, escravização, exploração e morte. Seria ingenuidade nossa imaginarmos que este tipo de política não exerce influência na formação do nosso povo.

O ESPIRITISMO É PROGRESSISTA

  “O Espiritismo conduz precisamente ao fim que se propõe todos os homens de progresso. É, pois, impossível que, mesmo sem se conhecer, eles não se encontrem em certos pontos e que, quando se conhecerem, não se deem - a mão para marchar, na mesma rota ao encontro de seus inimigos comuns: os preconceitos sociais, a rotina, o fanatismo, a intolerância e a ignorância.”   Revista Espírita – junho de 1868, (Kardec, 2018), p.174   Viver o Espiritismo sem uma perspectiva social, seria desprezar aquilo que de mais rico e produtivo por ele nos é ofertado. As relações que a Doutrina Espírita estabelece com as questões sociais e as ciências humanas, nos faculta, nos muni de conhecimentos, condições e recursos para atravessarmos as nossas encarnações como Espíritos mais atuantes com o mundo social ao qual fazemos parte.

OS ESPÍRITAS E OS GASPARETTOS

“Não tenho a menor pretensão de falar para quem não quer me ouvir. Não vou perder meu tempo. Não vou dar pérolas aos porcos.” (Zíbia Gaspareto) “Às vezes estamos tão separados, ao ponto de uma autoridade religiosa, de um outro culto dizer: “Os espíritas do Brasil conseguiram um prodígio:   conseguiram ser inimigos íntimos.” ¹ (Chico Xavier )                            Li com interesse a reportagem publicada na revista Isto É , de 30 de maio de 2013, sobre a matéria de capa intitulada “O Império Espírita de Zíbia Gasparetto”. (leia matéria na íntegra)             A começar pelo título inapropriado já que a entrevistada confessou não ter religião e autodenominou-se ex-espírita , a matéria trouxe poucas novidades dos eventos anteriores. Afora o movimento financeiro e ...