Pular para o conteúdo principal

A HONESTIDADE NÃO NECESSITA DE ELOGIOS - É OBRIGAÇÃO HUMANA




Por Jorge Hessen (*)


Não experimento qualquer regozijo quando leio as notícias sobre pessoas que são festejadas por atos de honestidade. Isso significa que ser honesto é ser exceção numa maioria desonesta. Despertou-nos a atenção um recente roubo ocorrido em Canna, uma pequena ilha da Escócia. O imprevisto ocorreu em uma loja gerenciada pelos próprios fregueses, que vendia comidas, produtos de higiene pessoal e outros utensílios. Produtos como doces, pilhas e chapéus de lã artesanais foram roubados, sendo a loja revirada pelos ladrões. Parece coisa pequenina para nós brasileiros, mas o roubo assombrou os residentes de Canna, que não viam nada parecido acontecer por ali havia meio século.

A loja permanece aberta em tempo integral e o pagamento da compra dos produtos é feito na “boa fé” ou “caixa da honestidade”: os fregueses deixam o dinheiro junto com um bilhete descrevendo o que compraram. Se confrontarmos a realidade do Brasil, seja na educação, na saúde, na ética, na honestidade, com outros países sérios, surgem desculpas sempre esfarrapadas quais: o Brasil é “especial”, é a “pátria do Evangelho” (!??…), é continental, tem uma história “mística” etc… A cantilena é incansavelmente repetida.


Não obstante saibamos que o Brasil como território é um paraíso, um lugar formoso, de uma natureza exuberantemente cativante, com rios, cachoeiras, florestas, ilhas e mares que nos fazem suspirar, inventamos “trocentas” desculpas para nossos déficits e barbáries morais. Em face disso é urgente uma insurreição moral, entronização do cultivo da honestidade, destruição do status do embuste, o fim da vulgaridade inebriante, notadamente a que tange para a degeneração ética através de permissões para a pilhagem, a falcatrua, a corrupção em todos os covis institucionais do País.

Acredite se puder, mas recentemente decifrei uma “pesquisa” garantindo que os brasileiros, na sua maioria, são “honestos”. Isso mesmo, honestos! Seria cômico se não fosse trágico tal resultado. É risível confiar em tal “pesquisa”! Os questionários abordavam circunstâncias como não devolver o troco recebido a maior, sonegar imposto de renda, estacionar na vaga destinada a idosos e deficientes físicos, apossar-se de canetas, lápis, borrachas, elásticos e envelopes da empresa ou órgão público onde trabalha, ficar com o dinheiro de uma carteira achada na rua, “furar” a fila no embarque do ônibus, exceder o limite de velocidade ou avançar o sinal de trânsito, usar cópia ilegal de softwares de computador, dirigir quando bebeu acima do limite permitido, etc, etc, etc, etc, etc…

Tal “pesquisa” realizada no “Coração do mundo” (!?) concluiu que os brasileiros são mais honestos que os europeus submetidos à mesma “pesquisa”. É óbvio que tal “pesquisa” no Brasil não é a radiografia da realidade – os brasileiros, com as justas ressalvas, são capazes de múltiplos atos desonestos. Ora, num país em que ainda impera a chamada “Lei de Gerson”, em que o fim é obter vantagem, o meio utilizado não faz diferença. As respostas dos “entrevistados” atestam um fato inquietante: que além de desonestos os “entrevistados” são ao mesmo tempo mentirosos.

Impossível negar que a grande maioria dos brasileiros pratica os pequenos atos de desonestidade contidas nas perguntas da “pesquisa”, porém raros são capazes de admitir que o cometeriam. Diante de tantas evidências, seria justo hastearmos a bandeira de um povo incorruptível? … E como transformar essa conjuntura? É elementar, meu caro Watson! diria Sherlock Homes. É necessário que assumamos a consciência de que não somos sinônimo de reputação “NOTA DEZ”, e em seguida cultivemos as transformações necessárias em nossa índole comportamental. Desonestidade é, especialmente, desrespeito pelo próximo, e todo ato desonesto provoca algum tipo prejuízo à sociedade.

No país em que o valor máximo da vida pode ser depositado em instituições financeiras, onde o sensualismo e o culto ao corpo físico substituiu os valores do espírito, onde a honestidade é desmoralizada sem piedade pelo indesejável “jeitinho”, continuaremos bem longe da harmonia social. Apesar disso, é preciso confiar no futuro. Importa assumir sincera confiança nos homens que vivem nestas plagas abençoadas e no porvir e plantar os alicerces do edifício do Evangelho de Jesus na Pátria do “Cruzeiro do Sul”.

Tudo no universo encontra-se em constante metamorfose e aprimoramento, por isso o progresso é uma das finalidades da vida. Na natureza não ocorrem saltos. Algumas etapas devem ser percorridas para ser possível se atingir a fase subsequente. Tais conquistas não são obras do acaso e nem brotam de um momento para o outro. Todavia, a honestidade é justamente uma das primeiras virtudes a serem conquistadas por quem deseja a paz e a felicidade na sociedade.


Ser honesto implica confirmar fidelidade em todos os aspectos da existência. O homem honesto realiza as tarefas que lhe cabem, com ou sem testemunhas e aplausos, até porque ao agir honestamente, ninguém faz mais do que a obrigação.

(*) articulista com textos publicados na Revista Reformador da FEB, O Espírita de Brasília, O Médium de Juiz de Fora, Brasília Espírita, Mato Grosso Espírita, Jornal União da Federação Espírita do DF. Artigos publicados na Revista eletrônica O Consolador, no Jornal O Rebate, site da Federação Espírita Espanhola, site da Espiritismogi.com.br

Comentários

  1. Como diz o matuto: Ah, verdade!

    ResponderExcluir
  2. Francisco Castro de Sousa5 de agosto de 2015 às 13:57

    Antes de tratar do conteúdo do meu verdadeiro comentário, que segue no segundo parágrafo, quero acrescentar um fato ocorrido comigo há muito tempo atrás, em que, ao ler a página prolegômenos de O Livro dos Espíritos, que vem assinada por vários Espíritos e em que Allan Kardec finaliza o texto com etc. etc. Na época em que isso aconteceu, o Município de Fortaleza mantinha um programa com o título de Plantão Gramatical, liguei para lá e perguntei a quem me atendeu: O que levaria um autor ao final de um texto acrescentar a repetição da partícula etc. se o significado dessa partícula é “e outros”, ao que me responderam que, certamente, o autor queria enfatizar que se tratava de muitos outros. No artigo que me atrevo a comentar, o autor repete etc. cinco vezes, talvez para mostrar que se trata de uma generalização.
    O articulista mais adiante, cita uma pesquisa garantindo que “os brasileiros, em sua maioria, são honestos” concluindo ele, que seria cômico se não fosse trágico tal resultado. Naturalmente que se trata da opinião de uma pessoa, o que se lamenta! Mas pesquisa se faz por amostragem, ou seja, calcula-se uma amostra de um universo através de cálculo estatístico, onde o resultado obtido é, então, estendido para todo o universo da pesquisa. Eu, por exemplo, não tenho a menor dúvida de que essa pesquisa retrata a mais agradável realidade, o que me traz grande satisfação! Seria para mim, que tenho filhos e netos, tremendamente desastroso, concluir que nasci e resido em um país no qual a maioria dos seus residentes são desonestos!

    ResponderExcluir
  3. Castro, Seu posicionamento é coerente com a realidade espírita. É aquele velho ponto de vista que as coisas estão ficando piores, quando a realidade é outra. Quando ascendemos moralmente na espiral da evolução, temos uma perspectiva que a coisa está pior. Ora, os meios de comunicação só abordam desonestidade, ficando os de honestidade para alguns casos pontuais. Allan Kardec, em Obras Póstumas, quando executa um ensaio sobre as aristocracias ele atesta: "Os bons, ao contrário, não fazem alarde das suas qualidades; não se põem em evidência, donde o parecerem tão pouco numerosos. Pesquisai, no entanto, os atos íntimos praticados sem ostentação e, em todas as camadas sociais, deparareis com criaturas de de natureza boa e leal em número bastante a vos tranquilizar o coração, de maneira a não desesperardes da Humanidade". Foi pesquisado e o resultado é o que Kardec assegura. O Espiritismo é otimista quanto ao homem.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

DIA DE FINADOS À LUZ DO ESPIRITISMO

  Por Doris Gandres Em português, de acordo com a definição em dicionário, finados significa que findou, acabou, faleceu. Entretanto, nós espíritas temos um outro entendimento a respeito dessa situação, cultuada há tanto tempo por diversos segmentos sociais e religiosos. Na Revista Espírita de dezembro de 1868 (1) , sob o título Sessão Anual Comemorativa dos Mortos, na Sociedade Espírita de Paris fundada por Kardec, o mestre espírita nos fala que “estamos reunidos, neste dia consagrado pelo uso à comemoração dos mortos, para dar aos nossos irmãos que deixaram a terra, um testemunho particular de simpatia; para continuar as relações de afeição e fraternidade que existiam entre eles e nós em vida, e para chamar sobre eles as bondades do Todo Poderoso.”

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

O DISFARCE NO SAGRADO: QUANDO A PRUDÊNCIA VIRA CONTRADIÇÃO ESPIRITUAL

    Por Wilson Garcia O ser humano passa boa parte da vida ocultando partes de si, retraindo suas crenças, controlando gestos e palavras para garantir certa harmonia nos ambientes em que transita. É um disfarce silencioso, muitas vezes inconsciente, movido pela necessidade de aceitação e pertencimento. Desde cedo, aprende-se que mostrar o que se pensa pode gerar conflito, e que a conveniência protege. Assim, as convicções se tornam subterrâneas — não desaparecem, mas se acomodam em zonas de sombra.   A psicologia existencial reconhece nesse movimento um traço universal da condição humana. Jean-Paul Sartre chamou de má-fé essa tentativa de viver sem confrontar a própria verdade, de representar papéis sociais para evitar o desconforto da liberdade (SARTRE, 2007). O indivíduo sabe que mente para si mesmo, mas finge não saber; e, nessa duplicidade, constrói uma persona funcional, embora distante da autenticidade. Carl Gustav Jung, por outro lado, observou que essa “másc...

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

SOBRE ATALHOS E O CAMINHO NA CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO JUSTO E FELIZ... (1)

  NOVA ARTICULISTA: Klycia Fontenele, é professora de jornalismo, escritora e integrante do Coletivo Girassóis, Fortaleza (CE) “Você me pergunta/aonde eu quero chegar/se há tantos caminhos na vida/e pouca esperança no ar/e até a gaivota que voa/já tem seu caminho no ar...”[Caminhos, Raul Seixas]   Quem vive relativamente tranquilo, mas tem o mínimo de sensibilidade, e olha o mundo ao redor para além do seu cercado se compadece diante das profundas desigualdades sociais que maltratam a alma e a carne de muita gente. E, se porventura, também tenha empatia, deseja no íntimo, e até imagina, uma sociedade que destrua a miséria e qualquer outra forma de opressão que macule nossa vida coletiva. Deseja, sonha e tenta construir esta transformação social que revolucionaria o mundo; que revolucionará o mundo!

O MEDO SOB A ÓTICA ESPÍRITA

  Imagens da internet Por Marcelo Henrique Por que o Espiritismo destrói o medo em nós? Quem de nós já não sentiu ou sente medo (ou medos)? Medo do escuro; dos mortos; de aranhas ou cobras; de lugares fechados… De perder; de lutar; de chorar; de perder quem se ama… De empobrecer; de não ser amado… De dentista; de sentir dor… Da violência; de ser vítima de crimes… Do vestibular; das provas escolares; de novas oportunidades de trabalho ou emprego…

O ESPIRITISMO É PROGRESSISTA

  “O Espiritismo conduz precisamente ao fim que se propõe todos os homens de progresso. É, pois, impossível que, mesmo sem se conhecer, eles não se encontrem em certos pontos e que, quando se conhecerem, não se deem - a mão para marchar, na mesma rota ao encontro de seus inimigos comuns: os preconceitos sociais, a rotina, o fanatismo, a intolerância e a ignorância.”   Revista Espírita – junho de 1868, (Kardec, 2018), p.174   Viver o Espiritismo sem uma perspectiva social, seria desprezar aquilo que de mais rico e produtivo por ele nos é ofertado. As relações que a Doutrina Espírita estabelece com as questões sociais e as ciências humanas, nos faculta, nos muni de conhecimentos, condições e recursos para atravessarmos as nossas encarnações como Espíritos mais atuantes com o mundo social ao qual fazemos parte.