domingo, 23 de junho de 2013

A INDIVIDUALIZAÇÃO DA CRENÇA



"O Espiritismo será o que dele fizerem os homens."
(Léon Denis)





Por Jorge Luiz (*)




            As manifestações pacíficas que ocorrem em diversas cidades brasileiras trazem em seu bojo característica marcante: o individualismo. Não há conotação institucional de qualquer ordem na sua organização. Um exemplo disso são cartazes vistos com a seguinte frase: “ninguém me representa.
 O individualista tem noção clara de seus limites e a fronteira que separa os direitos alheios dos seus. Em razão disso, constato que as insatisfações são as mais variadas e unem grupos ideológicos díspares em busca de uma unidade: o combate à corrupção.
             O individualismo é um conceito de afirmação do indivíduo frente às questões sociais, políticas e morais. O indivíduo passa a ser o agente legítimo nos processos de mudanças. O individualismo a que me refiro é oposto ao egoísmo.
            A este respeito, o Espírito Emmanuel afirma que na marcha diária da evolução o homem chega à conclusão de que o individualismo ajustado aos princípios inelutáveis do bem é a base do engrandecimento da coletividade.

             Este é o momento ápice do processo de individualização do Espírito, estagiando para o que Carl Jung, psiquiatra vienense designou de individuação, que implica na ampliação da consciência pelos valores orientados para a identificação com o Si-mesmo.
            Fenômeno parecido, porém sussurrante, vem ocorrendo no cenário religioso. O que se presencia é que, seguido ao processo de desencantamento com o institucionalismo religioso ocorre a subjetivação e individualização das crenças. Isto se torna bem notório nos centros espíritas com frequentadores de outros credos religiosos que buscam associá-los à crença espírita. A crença religiosa que no passado não era objeto de critério de verificação racional, com a sua individualização torna-se fluida, maleável e dispersa. Não é mais objeto de transmissão herdada, mas conquista individual na busca da expressão de sua singularidade.
            Danièle Hervieu-Léger, figura de destaque nos estudos da ciência da religião, foi presidente da École de Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris, de 2004-2009, conceituou os as atores da dinâmica acima de “peregrino” e “convertido”, em sua obra “O Peregrino e o Convertido”, editora Vozes. Para ela o peregrino não é mais guiado pelo badalar dos sinos, pela regularidade dos cultos e dos espaços religiosos. Ao contrário do praticante regular, o peregrino produz o seu próprio repertório de significados, construindo narrativamente sua experiência em confronto com uma linhagem religiosa que ele se identifica prioritariamente.
            Conceitua como “convertido” aquele que diante dessa mobilidade faz com que esta desregulamentação favoreça a sua conversão que se dá a partir da individualidade subjacente às variadas disposições sociais e culturais.
            Leiam o que ela diz: “como compreender ao mesmo tempo o processo histórico da secularização das sociedades modernas e o desdobramento de uma religiosidade individual, móvel e moldável que dá lugar a formas inéditas de sociabilidade religiosa? (...) A crença não desaparece, ela se desdobra, se diversifica.”
            O professor, jornalista e filósofo J. Herculano Pires, em sua consagrada obra “O Centro Espírita”, prognosticou este momento e a importância do Centro em sua execução: “Demonstrada a ineficácia de todas as encenações sacramentais, esclarecidas as superstições que dominam a mente humana insegura e medrosa, a Humanidade atingirá a sua virilidade e não haverá mais campo para as explorações sistemáticas da natureza religiosa do homem.”
            Estamos presenciando o que Kardec idealizou originalmente para o Espiritismo quando em suas reuniões mediúnicas participavam judeus, muçulmanos, católicos...
Allan Kardec acreditava que a nova ciência que ele descobrira poderia ser estudada por todos os homens, tornando-os mais esclarecidos e a fé das religiões mais fortalecida.
Sendo a evolução espiritual em espiral é óbvio que as transições não se operam mediante a ruptura com a fase anterior. Portanto, são chegados os tempos que iremos encontrar profitentes espíritas com valores do patrimônio religioso anterior.
É de significativa importância que os dirigentes espíritas estejam lúcidos neste momento e possam favorecer a realização desta revolução já que estes anseios avançam, precisamente, em direção ao modelo espírita.
            Não será com a maneira ingênua como nos comportamos nos Centros Espíritas que seremos verdadeiros agentes ativos da “revolução copernicana”, como bem definiu Sir Oliver Lodge, que o Espiritismo operará para a regeneração da Humanidade.   
            Tomemos tento!

(*) livre-pensador e voluntário do Instituto de Cultura Espírita – ICE.

4 comentários:

  1. Suas inspirações e ideias sempre muito elucidativas.
    Precisamos absorver isso e colocarmos na prática das coisas as quais acreditamos.Conceitos religiosos que nos arrastaram durante séculos precisam ser abandonados .Ampliar a consciência como você deixou explanado.

    Vanessa Alves

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  2. Interpretação lúcida do contexto. Individualismo consciente versus "povo instrumento de manobra".
    Deusimar

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  3. É uma situação bem difícil lidar com pessoas de credos que divergem em muito da doutrina espírita, especialmente aqueles credos que envolvem o plano espiritual com rituais, roupas especiais etc. Muitos chegam ao centro espírita sedentos de um momento a mesa mediúnica para "trabalhar".

    É difícil, mas imprescindível mostrar o olhar espírita aos fenômenos ditos "sobrenaturais" para aqueles que pela primeira vez adentram um centro espírita.

    Ótimo texto! :)
    Fernanda Leal

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  4. COMPLEMENTANDO,
    Não há prisão que escravize para sempre o pensamento,hoje reconhecido como energia mais poderosa do universo.

    Vanessa Alves

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