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UMA EXISTÊNCIA VALE MAIS DO QUE UMA COPA DO MUNDO¹

         


Por Roberto Caldas (*)



         
    Estamos vivendo momento de mista expectativa em solo brasileiro. A realização do maior certame de futebol do mundo, uma iniciativa de um órgão privado que mobiliza os países em torno desse esporte, escancara realidades que pululam nas escolas, nos hospitais, nas comunidades, onde milhões de pessoas agonizam pela rotina de escassez e desgoverno, ao mesmo tempo em que assanha a maior das paixões nacionais.  A Copa do Mundo de Futebol chega para encrespar uma relação que vem se deteriorando a 514 anos, desde que a história oficial dá a saída de bola para o Brasil.
            A disputa do espaço em campo envolve a necessidade urgente de mudanças tendo como adversário a frieza do capitalismo que não pensa senão na própria satisfação. Diante do esporte mais popular tupiniquim vemo-nos envolvidos com uma festa que esbanja bilhões de reais com um pálido aceno de desfaçatez para as agruras que produzem vítimas sociais que agonizam sem defesa para evitar a derrota, de goleada.

            A análise provocada na questão 717 de O Livro dos Espíritos (O que pensar dos que monopolizam os bens da terra para obter o supérfluo em prejuízo dos que precisam do necessário?) tem destacada uma posição dos Espíritos orientadores da Codificação que mostra uma prorrogação inesperada para aqueles que se julgam vencedores diante das vitórias mundanas: “Eles desconhecem a lei de Deus e terão que responder pelas privações que impuseram aos outros”. A Doutrina Espírita alarga além do tempo regulamentar de uma encarnação à continuidade da vida mostrando que aquele se curva à ambição haverá de mergulhar a consciência numa rotina de retornos aos campos devastados que deixou no passado.
            Do lado daqueles que nos sentimos afetados pela prática atual de desmandos, algumas reflexões se fazem obrigatórias. Natural que se busque a melhoria das condições de vida da sociedade, normal que se agrupem as pessoas em torno de idéias comuns que mobilizem a opinião geral em torno das mudanças pretendidas, louvável os esforços para que o bem social se instale. Precisamos, no entanto saber que vivemos em busca de um Estado de Direito, no qual quebrar regras de convivência pacífica aprofunda as crises, sem chegarmos a qualquer solução, o que afinal deve ser a única das razões quando nos movemos ao encontro de um desafio. Se a nossa atitude não puder nos trazer a sensação de paz e leveza interiores, então algo está errado. Nenhuma mudança real acontece se há ódio alimentando o processo de luta, a indignação diante das injustiças não nos dispõe ao poder de explodir o mundo. A agressão contra o outro nos coloca na qualidade de juiz e quem nos arvorou de tal? A vitória jamais suja as mãos com o sangue daqueles que antagonizam as nossas crenças e disposições. Até que nos larguemos em práticas dolosas de desequilíbrio sempre há oportunidades de buscar formas pacíficas de agir ao lado da construção do bem. Segundo Sêneca (IV AC – 65) “nossa mente nunca está bem a não ser quando está em paz consigo mesma”.
            Há equívocos gigantescos nos holofotes que iluminam a Copa do Mundo de Futebol que o Brasil sedia, mas é necessário que o nosso coração seja iluminado pela Luz do mestre que nos incita a estarmos atentos para os nossos compromissos de “resistir ao mal” que dorme dentro de nós.  Se quisermos que o mundo se transforme é preciso depor as armas da violência e acreditarmos que só pacificamente chegaremos à vitória real, aquela que conquistamos com a paz no coração. Isso é que é tornar-se um verdadeiro campeão. 
     

¹ editorial do programa Antena Espírita de 09.06.2014.
(*) editorialista do programa Antena Espírita e voluntário do C.E. Grão de Mostarda.

Comentários

  1. Caro Roberto!
    Adoraria ter escrito esse artigo. De uma riquezas inquestionável. Só nos cabe agora contribuir de alguma forma para que a sua realização seja pacífica e que dela, surjam iniciativas que solucionem os nossos graves problemas de ordem social.
    Parabéns!

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  2. "Expressar o patriotismo, acima de tudo, em serviço desinteressado e constante ao povo e ao solo em que nasceu.
    A Pátria é o ar e o pão, o templo e a escola, o lar e o seio de Mãe. (Espírito André Luiz)
    Esse é o sentimento que deve prevalecer nos dias que marcarão os jogos da Copa e sempre!

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