Pular para o conteúdo principal

ASSUMINDO O PRÓPRIO CAMINHO (*)






 Por Roberto Caldas (**)


O chamado não poderia ter sido mais enfático: “... tome a sua cruz, e siga-me” (Mateus XVI: 24). Cabem, no entanto as perguntas: O que representaria na acepção do Mestre o tomar para si a cruz? Para onde estaria nos convidando Jesus, a segui-lo?

            Definitivamente seria necessário que caminhássemos alguns séculos para que a compreensão do divino convite pudesse se tornar mais claro à luz das modernas especulações que envolvem os nossos traçados existenciais. Aqueles homens e mulheres que acompanhavam os seus passos tinham razões para uma interpretação mais objetiva de suas palavras, pelas circunstâncias de estar vivenciando uma rotina de fatos, situação que não nos compete repetir tanto tempo depois.

 Lógico que a cruz referida não tratava daquela que supostamente carregou em direção à consumação de sua morte, certamente o menor dos sacrifícios que experimentou considerando a sua grande capacidade de controle sobre o corpo físico, mercê da elevada condição evolutiva que já alcançara. A cruz como símbolo de fardo ou peso se adequa perfeitamente à acepção do texto, visto que em cada encarnação nos compete uma carga específica de experiências que faz sentido muito particular, individualmente, algo que não pode ser entendido pelo outro e que caracteriza o planejamento espiritual realizado antes da concepção do nosso corpo físico. O peso e comprimento da cruz que nos compete diferem das medidas estabelecidas para a cruz das pessoas que seguem aparentemente na mesma estrada, o que torna as nossas jornadas projetos existenciais diferentes. Assumir, ou tomar, a própria cruz significa assumir as suas responsabilidades, sem qualquer atitude refratária que intente conferir ao outro que jornadeia conosco os compromissos que nos pertencem. Objetivamente se trata do treino intensivo que precisamos estabelecer a cada dia para nos tornarmos a solução dos nossos próprios problemas sem adiamentos de quaisquer naturezas.

O destino de quem segue os passos de Jesus, depois de assumir a cruz que lhe compete, arremete ao estado de paz de espírito, uma condição não necessariamente vinculada aos referenciais de tempo e espaço, mas um espelhamento mental que amplia a limpidez das lentes interiores, através das quais conseguimos enxergar os fatos da vida com a compreensão mais dilatada da justiça de Deus, sem que nos deixemos derrotar pelos desafios da caminhada. Jesus sabia que não temos a condição espiritual de andar passo a passo com a sua caminhada e o convite para segui-lo foi uma advertência para não o perdêssemos de vista, embora continuasse a andar quilômetros à frente, apenas envolvidos com os processos reativos da nossa vida emocional. 

Segui-lo significa a conquista de pequenos triunfos diante da falta de paciência e da ansiedade que experimentamos nas rotinas que o dia nos impõe. É estarmos buscando ajustes do pensamento sempre que a mente nos lançar ao desejo de vingança quando confrontados pelas presumidas injustiças do mundo. É a renovação da esperança depois de um resultado que nos lance ao amargo da frustração. É aceitar as perdas do caminho com a disposição de retomada da luta depois de passados os momentos de dor. 

“Tomar a cruz e segui-lo”. Um convite. Um chamado. Quem o fez foi Jesus. Aquele que nos conhece e ama. Ele sabe que se quisermos, podemos.   

(*) editorial do programa Antena Espírita de 31.03.2012
(**) integrante da equipe do programa Antena Espírita e voluntário do C.E. Grão de Mostarda, Fortaleza (CE).

Comentários

  1. A dificuldade que ainda encontramos de entender a essência da mensagem de Jesus, reside nos valores que a sociedade e as religiões definiram como paradigmas para a Vida. A Doutrina Espírita, na condição de O Consolador Prometido,possibilita o maior esclarecimento sobre o real significado da Vida e da mensagem Cristíca. Roberto Caldas, com maestria, facilita o entendimento da assertiva do cristo em enfoque. Parabéns!

    ResponderExcluir
  2. Quase 3 anos depois me defronto com esse texto e ele me emociona. Escuto literalmente a Jesus que renova o seu convite e percebo que fiquei todo esse tempo reverberando as minhas impossibilidades enquanto a ampulheta do tempo contorcia a sua saga da passagem dos dias. Deixa eu correr para pegar a minha cruz. FUI! Roberto Caldas

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.