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A FRÁGIL ARTE DE OPINAR


       


           Saudades de Kardec. Felizmente é possível diminuir a falta que ele nos faz sempre que se entra em contato com as obras magistrais que nos deixou como legado de sua grande capacidade de pensar, pesquisar e buscar o bom senso. Pena que a ausência do hábito em o consultar exponha os espíritas a se tornarem meros opinantes com relação a questões importantes e que envolvem práticas espíritas. No magistral capítulo 20 de O Livro dos Médiuns (Influência Moral dos Médiuns), o Espírito Erasto lança uma pérola que retrata perfeitamente o pensamento do Codificador: “mais vale rejeitar noventa e nove verdades do que aceitar uma mentira”. É exatamente desse norteamento urgente de que precisam os espíritas quando opinam publicamente sobre o Espiritismo.

            O que se observa são ideias que expressam meras opiniões criando saias justas para o contingente de espíritas. Aqui é alguém garantindo a existência de tal ou qual mundo habitado e retratando o estilo de vida daqueles habitantes sem o menor apreço para recomendações da Astronomia que determinam falta de condições siderais para que ali haja manutenção de vida complexa. Acolá pululam revelações sobre personalidades encarnadas que são apontadas como reencarnação de personagens de destaque do passado, sem qualquer compromisso com o comparativo evolucional de ambos. Ali adiante se preconiza práticas de curas que misturam sincretismos e terapias mal estudadas em sua essência jogando a credibilidade do movimento espírita à marginalidade.
            Sucede que no momento em que o engodo é descoberto, as críticas se voltam ao Espiritismo enquanto doutrina, cuja seriedade jamais daria aval para tais expedientes de sandices que determinados grupos acabam tornando populares. Muitas vezes utilizam o nome de pessoas eméritas, médiuns reconhecidos pela sociedade, como se fossem cúmplices de suas divagações. Aliás, com todo respeito aos grandes médiuns, as palavras de Erasto se dirigem a eles que, não sendo naturalmente perfeitos, podem cair em erro quando deixam de avaliar uma mensagem que lhes chegue sem aplicação do crivo da razão.  
            As palavras de Allan Kardec, quando abaliza a Ciência como uma possível instância de renovação da Doutrina Espírita reconhece que ao espírita é cabível e oportuno que reflita antes de defender conteúdos de pobre racionalidade e, se ainda assim o quiser fazer, faça-o com total e absoluta responsabilização por tais informações, a fim de evitar que a sua pouca reflexão respingue sobre o coletivo.
            Foram necessárias muitas décadas para que o Espiritismo passasse a ser considerado no seio da sociedade com a avaliação que priva na atualidade. Houve lutas acerbas por parte dos trabalhadores da primeira hora. Ainda assim, há muitos que não conseguem compreender a profundidade de sua mensagem, e isso é muito natural, pois somos pessoas que possuem graus de compreensão e aceitação diferentes. Aqueles que não compreendem a Doutrina Espírita e ainda os que a detratam, em nada ferem a sua destinação. Diferente dos que se dizem espíritas e não estudam o quanto deviam e esses sim, são obstáculos a sua mais rápida ascensão.
            É sabido que não há alguém que saiba tudo a respeito de tudo, daí é fundamental se precaver dos erros que podemos cometer pelos excessos. Poucos que ainda somos precisamos nos aglutinar em torno da essência do ensino dos Espíritos da Codificação, exortando a máxima trazida pelo Espírito de Verdade (Paris – 1860): “Espíritas; amai-vos, eis o primeiro ensinamento; instruí-vos, eis o segundo”.  

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