segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

EDUCAÇÃO MEDIÚNICA: TEORIA E PRÁTICA






Requisitos da prática mediúnica

Três requisitos fundamentais para a prática consciente e elevada da mediunidade são:
1) A   capacidade   de   concentração: “Mais   importante   (...)   é   a   calma   e   o recolhimento que se deve ter, juntos a um desejo e uma firme vontade de êxito.  E por vontade não entendemos aqui um desejo efêmero e inconsequente, a cada momento interrompido por outras preocupações, mas uma vontade séria, perseverante, sustentada com firmeza, sem impaciência nem ansiedade. O recolhimento é favorecido pela solidão, pelo silêncio e o afastamento de tudo o que possa provocar distrações.”  (O Livro dos Médiuns, item 204).  Durante os trabalhos mediúnicos, é preciso saber isolar a mente de todas as dispersões a que estamos habituados. Focar o pensamento no propósito de servir, fixar a emoção em Jesus (pode-se usar o recurso de projeção de uma imagem de Cristo, de preferência não do Cristo crucificado, mas do Cristo doce e consolador, à beira dos lagos, no alto dos montes...), direcionar conscientemente vibrações para os Espíritos sofredores comunicantes.  Trata-se de uma disciplina mental, que deveríamos aliás praticar diariamente e não apenas na hora da prática mediúnica. Saber centrar e controlar os próprios pensamentos é conquista importante do Espírito. Mas não é algo que se atinge facilmente.  É preciso calma e persistência.  Entretanto, há dois movimentos mentais distintos na sessão mediúnica:  a) o direcionar o pensamento, tendo em vista a prece, a emissão de vibrações ou a projeção de uma imagem e b) o esvaziar a mente para permitir que o Espírito comunicante manifeste o seu pensamento.

2) O autoconhecimento: Sendo a mediunidade um ato de comunicação entre nós e outras inteligências em estágios mais ou menos avançados, é indispensável saber exatamente o que somos, o que pensamos e o que desejamos, para distinguir o mais possível o nosso pensamento dos pensamentos que nos chegam durante a sessão mediúnica ou no cotidiano. Na posse de nós mesmos, conscientes de nossas conquistas e de nossas fraquezas, fica mais fácil separar a manifestação dos Espíritos da nossa própria personalidade. Embora em toda manifestação mediúnica, sempre haja uma influência maior ou menor do médium.  “. O Espírito do médium não é jamais completamente passivo? — Ele é passivo quando não mistura suas próprias ideias com as do Espírito comunicante, mas nunca se anula por completo.  Seu concurso é indispensável como intermediário, mesmo quando se trata dos chamados médiuns mecânicos.” (O Livro dos Médiuns, item 223, questão 10 –Ver também o resto do capítulo XIX – O papel do médium nas comunicações).
3) O engajamento na autoeducação: “Se o médium, quanto à execução, é apenas um   instrumento, no   tocante   à   moral   exerce   grande   influência.   Porque   o   Espírito comunicante identifica-se com o Espírito do médium e, para essa identificação, é necessário haver simpatia entre eles, e se assim podemos dizer, afinidade. A alma exerce sobre o Espírito comunicante uma espécie de atração ou repulsão, segundo o grau de semelhança ou dissemelhança entre eles.  Ora, os bons têm afinidade com os bons e os maus, com os maus, de onde se segue que as qualidades morais do médium têm influência capital sobre a natureza dos Espíritos que se comunicam por seu intermédio.
Se o médium é de baixa moral, os Espíritos inferiores se agrupam em torno dele e estão sempre prontos a tomar o lugar dos bons Espíritos a que ele apelou.  As qualidades que atraem de preferência os Espíritos bons são: a bondade, a benevolência, a simplicidade de coração, o amor ao próximo, o desprendimento das coisas materiais.  Os defeitos que os afastam são: o orgulho, o egoísmo, a inveja, o ciúme, o ódio, a cupidez, a sensualidade e todas as paixões pelas quais o homem se apega à matéria.” (O Livro dos Médiuns, item 227) É evidente que não se espera a atitude já santificada por parte de um médium, sujeito às leis da evolução terrena. Porém, a simpatia e a proteção dos bons Espíritos se dão na medida dos esforços que ele faz para vencer a si mesmo e superar deficiências e desequilíbrios –sendo a própria mediunidade um instrumento inigualável de elevação. Por ela, muitas vezes recebemos as inspirações, os conselhos e as orientações morais necessários ao nosso adiantamento.  Por ela, melhor identificamos as nossas fraquezas, pois se fizermos atenção a nós mesmos, observaremos como os Espíritos perturbadores se aproveitam delas.

Mediunidade e emoção

A percepção extra-sensorial dos Espíritos se dá geralmente em primeiro lugar no patamar da emoção. A assimilação de ideias é sempre posterior ao impacto emocional. E isso tanto no cotidiano, quanto no espaço de uma sessão mediúnica.  Tristeza, angústia, raiva, nervosismo, tédio ou, por outro lado, alegria, paz de espírito, até mesmo sensação de êxtase podem ser sintomas de uma presença espiritual.
Nesse passo, deve entrar o médium com seu autoconhecimento para distinguir as suas próprias emoções daquelas provocadas ou potencializadas pelos Espíritos.  As emoções que pertencem ao próprio médium são aquelas cujas causas são facilmente identificáveis. Fica-se triste ou irritado por algum motivo. Se não há motivo algum, pode-se desconfiar de alguma interferência estranha. E se há algum motivo, mas a nossa reação está exagerada, então pode-se estar juntando à nossa raiva ou à nossa tristeza, a influência de outros Espíritos. Eles potencializam as nossas emoções. Inversamente também acontece.  Se algum dia nos sentimos especialmente leves, tranquilos e felizes, sem nenhum motivo aparente, isto pode se dar pela recordação de um contato espiritual venturoso durante o sono ou ainda pela aproximação de algum Espírito, durante o estado de vigília. Para sabermos lidar com as nossas próprias emoções e ainda com emoções alheias, é preciso desenvolver larga autodisciplina. Anular emoções ou racionalizá-las em excesso não é o caminho, pois não se trata de esfriá-las a ponto de nos tornarmos indiferentes. Mas é preciso controlá-las, ao invés de nos deixarmos atropelar por elas.  Chorar, rir, indignar-se, entristecer-se são reações humanas naturais. Porém, tanto a alegria quanto a dor, assim como a indignação, devem ser comedidas, não devem nos deixar sair do eixo. No médium, o descontrole emocional pode ser a porta aberta à obsessão, pois é no justo momento em que perdemos o nosso autocontrole que os Espíritos perturbadores podem instalar seus pensamentos e seus impulsos nos nossos e podemos ser levados a falar e agir empurrados por eles.  Isso no que se refere à vigilância diária que o médium deve ter consigo mesmo.
Na hora propriamente dita da comunicação, tal autocontrole é essencial para que haja um fluir mais eficiente entre os dois planos.  Se o Espírito comunicante está em desequilíbrio emocional é justamente a serenidade do médium que vai contribuir para seu reequilíbrio.  Se o médium se deixa dominar completamente, ao invés de ajudar o outro, estará desajudando a si mesmo.  Se o Espírito comunicante for um Espírito superior e, sobretudo, se   tiver   ligação   afetiva   profunda   com   o   médium, as   lágrimas   serão manifestação natural de gratidão, amor ou saudades. Mas se houver excesso, o conteúdo da comunicação, seja oral ou escrita, sofrerá em qualidade, pois o médium estará inteiramente tomado pela emoção e não facilitará a clareza de ideias.
É verdade que, às vezes, o Espírito Superior não deseja se comunicar ou não pode fazê-lo por qualquer circunstância: faz-se apenas sentir, provocando lágrimas e tocando os corações, com sua vibração amorosa. Nesse caso, não há a preocupação de uma transmissão de ideias, mas justamente o despertar de sentimentos fecundos no médium e nos assistentes da reunião.

Mediunidade e Educação

Estes dois temas estão intrinsecamente relacionados, pois tudo que é próprio do ser humano deve ser compreendido de forma pedagógica.  Já que a meta do Espírito é a perfeição, todo os meios para atingi-la são Educação.  No caso, a mediunidade é meio e fim. A mediunidade é um como meio de aperfeiçoamento. É meio porque pode se tornar importante instrumento da evolução humana, tanto para quem a pratica, como para quem dela é beneficiário.
O médium pode empregá-la para melhorar a sua percepção do mundo, para instruir-se com o conteúdo espiritual de que é intermediário, instruindo também o próximo.  Quando lida com outros Espíritos, superiores ou inferiores a ele, em moralidade ou inteligência, está em processo de aprendizagem e interação, acumulando um conhecimento experimental do ser, que não pode ser buscado em nenhum compêndio.
Esse aprendizado que a mediunidade proporciona tem um alcance pedagógico mais amplo.  No decorrer da história humana, filósofos e profetas, artistas e cientistas, conscientemente ou não, têm servido de intermediários Interexistenciais, construindo o conhecimento humano, de forma interativa com o plano espiritual. Sócrates referia-se ao seu daimon, como voz inspiradora de suas ações.  Descartes afirmava que toda a sua filosofia havia se iniciado a partir de três sonhos, proporcionados pelo Espírito da Verdade. Rousseau contava como tivera uma visão das ideias que desenvolveria em seus livros.  Mas o assumir a comunicação mediúnica, como parte constitutiva da construção do conhecimento nunca foi tão explícito e transparente, como com Kardec.

A abnegação mediúnica

O engajamento do médium num processo de autoeducação significa que ele usará as suas potencialidades psíquicas de forma responsável e benéfica. O Livro dos Médiuns fala em “desejar o bem e repelir o egoísmo e o orgulho”. (Cap. XX, item 226, n. 11). Diz o Livro dos Espíritos que “a sublimidade da virtude consiste no sacrifício do interesse pessoal para o bem do próximo, sem segunda intenção” (questão 893).  Dentre os empenhos morais do médium, um dos maiores deve ser o de abnegar-se, o de agir no Bem sem desejo de recompensa de qualquer espécie.  Isso engloba o abandono de todo interesse pessoal: dinheiro, poder, fama ou mesmo retribuição psíquica e afetiva. Ao   contrário   das   correntes   espiritualistas   anglo-saxônicas, em   que   se   faz  o comércio aberto da mediunidade, é corrente no meio espírita brasileiro, a rejeição do interesse financeiro mesclado à atividade mediúnica. Em sua maioria, os médiuns adeptos da Doutrina de Kardec abstêm-se de tirar proveito econômico de suas faculdades.
Quando o fazem, sua seriedade mediúnica é posta em suspeita.  De fato, misturar a ambição de lucro monetário a uma atividade que requer todo respeito, toda abnegação e toda elevação mental, é sujeita -lá à influência mais problemática possível. Pretender lidar com o mundo espiritual, ser intermediário de seres em outra dimensão, fazer a ponte entre os dois mundos – ao preço de um produto mercadológico é abrir espaço para qualquer tipo de mistificação. O cliente que paga tem direitos; quem vende um produto tem de dar garantia do que vende. Sendo o ato mediúnico uma interação de inteligências autônomas e livres, o médium nada pode oferecer com garantia e muito menos fazer-se pagar por comunicações que não dependem dele.  Além disso, mercadejar as bênçãos do alto ou a caridade praticada é infração grave das leis divinas. Basta lembrar de que uma das poucas vezes, em que Jesus se indignou com energia, foi contra os vendilhões do templo.
É importante frisar esse aspecto, porque a tentação diária a que o médium se vê submetido é muito grande. E, apesar da costumeira rejeição do movimento espírita brasileiro à mediunidade comercial, começa a surgir certa tolerância em relação a médiuns de cura, o que também é inadmissível. Ainda mais considerando-se o fato de que a mediunidade é sempre um fenômeno delicado para ser comprovado e oferece apenas um grau relativo de segurança.  Dessa forma, a exclusão do interesse financeiro é a primeira garantia de seriedade, embora não suficiente.  Isto também serve para os livros mediúnicos. Em qualquer atividade, onde há interesse de lucro, ele poderá sobrepor-se a qualquer preocupação de ética e qualidade.  Assim, quando se trata de algo sagrado, a abnegação deve ser absoluta. Mas não se trata de desinteresse financeiro apenas.  Dado o atavismo milenar da humanidade de procurar gurus e agarrar-se a pajés, oráculos e ledores de sorte, existe a tendência de se projetar esses anseios de dependência para os médiuns contemporâneos — e alguns se comprazem nisso. Pelo fato de possuírem um conhecimento mais preciso de dadas situações ou pessoas ou mesmo do passado e do futuro, esse conhecimento muitas vezes é usado como meio de manter os outros em dependência psíquica ou em estado de idolatria. O médium e seu cliente entram num jogo de vampirismo mútuo, em que o primeiro se alimenta da adoração servil e o segundo se vicia nas orientações e conselhos para sua vida particular. Portanto, uma relação de poder, em que o orgulho e o egoísmo entram como atores principais.
A dominação psíquica pode ser também coletiva, quando o médium se deixa inebriar pela fama derivada de obras e fenômenos de que foi intermediário, julgando-se merecedor de elogios e privilégios.  Precaver-se contra a vaidade, para abnegar-se de si mesmo é o remédio.  Segundo Kardec, o médium moralizado, ao contrário do médium vaidoso, “convicto de que sua faculdade é um dom que lhe foi concedido para o bem, não se prevalecerá dela de maneira alguma, nem se atribuirá qualquer mérito por possuí-la.
Recebe como uma graça as boas comunicações, devendo esforçar-se por merecê-las através da sua bondade, da sua benevolência e da sua modéstia.

O primeiro se orgulha de suas relações com os Espíritos superiores; este se humilha, por se considerar sempre indigno desse favor.” (Livro dos Médiuns, item 229)

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