Pular para o conteúdo principal

RELIGIÃO: ÓPIO DO POVO?




“A ideia que fazemos da felicidade e da desgraça, da alegria e da dor, varia ao infinito segundo a evolução individual.”
(Léon Denis)





Por Jorge Luiz (*)




"A religião é o suspiro do oprimido, o coração de um mundo insensível, a alma de situações desalmadas. É o ópio do povo. A abolição da religião enquanto felicidade ilusória dos homens é a exigência da sua felicidade real."
            Isolada do contexto acima, a citação “a religião é o ópio do povo” sempre colocou Karl  Marx como um inimigo da religião. Preso às suas convicções ideológicas, temos que admitir que a sua opinião apresentou visão horizontal do que sugere às questões sociais, sugerindo uma revolução centrada no homem para extirpar dos mundos todas as desigualdades e assim todos teriam acesso à “felicidade real”. A religião, no seu entendimento, dificultava essa revolução. Até mesmo seus biógrafos não se arvoraram em afirmar qual foi realmente o seu propósito.
            Quanto ao ópio, é um suco extraído da flor da papoila e é utilizada na atualidade como narcótico. Até o século XIX o ópio era comercializado livremente, pois era considerada substância benéfica que aliviava dores e sofrimentos.
            Homero (932 a 928 a.C), poeta épico da Grécia clássica, em sua obra Odisséia, descreve os efeitos do ópio – conhecido como planta da alegria – e de seu uso amplo na medicina.

            Aqui passa ao largo qualquer observação positiva aos ideais marxissistas e apologia ao ópio, mas apenas uma verticalização da sua opinião, agora centrada nos princípios espiritistas.
            O que nos sugere em um primeiro momento, é que Marx insinua que a religião torna resignados os pobres e desvalidos diante dos sofrimentos do Mundo, amplificados pelo que ele denominou “guerra de classes”. Ademais, sendo materialista e ateu só podia conceber felicidade restrita ao bem-estar material.
            Karl Marx só percebeu a ponta do iceberg, tanto assim que, não compreendendo o sentimento de religiosidade do homem, fundou ele próprio uma religião. Muitos pensadores consideram sua filosofia uma religião científica. Leiam o que diz Heraldo Barbuy, paulistano, brilhante professor, pensador, filósofo, sociólogo, historiador, jornalista, conferencista, tradutor, em sua obra Marxismo e Religião:
            “O marxismo é uma religião modernizada – isto é, que se apresenta como científica, - e seu principal autor é uma espécie de profeta bíblico, que retoma certos temas do Antigo e do Novo Testamento: tem suas noções próprias da catástrofe purificadora do Juízo Final e da Redenção da Humanidade. É uma religião que, ao contrário das demais, está centrada exclusivamente no Homem e cuja finalidade é a ação revolucionária redentora.”
            Sendo o sofrimento físico e moral ainda é um apanágio de nossa sociedade, o Espiritismo na condição de O Consolador prometido por Jesus apresenta um quadro racional para as aflições da vida, demonstrando que quando as suas origens não são encontradas nesta vida, por certo estão em vidas pretéritas.
            Quando Jesus disse “Bem-aventurados os aflitos, porque eles serão consolados”, fica claro que as recompensas serão em outras vidas, pela forma que se encara o sofrimento na existência. Ora, tomando por mérito que Deus é justo, temos que admitir que as dores neste mundo sejam devidamente justas.
            A fé no porvir fortalece o homem diante das provações pertinentes ainda ao nosso mundo, no atual estágio evolutivo em que se encontra.
            Allan Kardec em “O Evangelho Segundo o Espiritismo” adverte que “a calma e a resignação adquiridas na maneira de encarar a vida terrena e a fé no futuro dão ao Espírito uma serenidade que é o melhor preservativo da loucura e suicídio.”
            O sentimento de religiosidade é que opera através da fé, esses resultados que aos olhos do materialista apresenta-se como alienação ou fuga da realidade. O Espiritismo através da Lei Natural traz luz a todos os eventos, mostrando que a adoração verdadeira é a do coração que se vincula diretamente ao Criador, não necessariamente, sendo artigo desta ou daquela religião. A fé emula este sentimento.
            Já o Espírito Lacordaire, em “O Evangelho Segundo o Espiritismo” adverte que Deus não coloca fardos em ombros frágeis. O fardo sendo proporcional às forças, como a recompensa será proporcional à resignação e a coragem.
            O Dr. George E. Vaillant, psicanalista, psiquiatra e um dos pioneiros no estudo do desenvolvimento psicológico de adultos da Universidade de Harvard, demonstra em sua obra “Fé: evidências científicas” que a espiritualidade é fonte de conforto e força positiva para as pessoas. A religião, por sua vez, é instilada pelos meios culturais e históricos, muitas vezes alimentando paixões que podem levar à violência e ao comportamento destrutivo.
            O Espírito mesmo ignorando é movido pela religiosidade, mesmo que os princípios que norteiam as religiões sejam deturpados, escravizados, corrompidos aspectos predominantes à sua época capitaneados pelo Catolicismo.
            A espiritualidade quando fundada na obediência (razão) e na resignação (coração) solidificadas na crença em Deus pode ser considerada de forma alegórica o “ópio” do Espírito encarnado, pois favorece ao enfrentamento das adversidades sem murmurar. A Esse respeito assevera Allan Kardec: “O sofrimento que não provoca murmurações pode ser, sem dúvida, uma expiação, mas indica que foi antes escolhido voluntariamente do que imposto; é a prova de uma firme resolução, o que constitui sinal de progresso.”
            A religiosidade, mesmo inconsciente, leva o homem a píncaros nunca por ele imaginados. Reforço o minha opinião de que Dr. Marx quando consolida sua filosofia essencialmente religiosa, de bases humanistas, com o propósito de redenção da classe proletariada, foi guiado, inconscientemente, pelo alto e nobre sentimento de religiosidade.

Comentários

  1. Caro Jorge.
    Dissertar com propriedade e simplicidade sobre marxismo e religiosidade é tarefa árdua, parabens pelo artigo.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ALLAN KARDEC E A DOUTRINA ESPÍRITA

  Por Doris Gandres Deolindo Amorim, ilustre espírita, profundo estudioso e divulgador da Codificação Espírita, fundador do Instituto de Cultura Espírita do Brasil, em dado momento, em seu livro Allan Kardec (1), pergunta qual o objetivo do estudo de uma biografia do codificador, ao que responde: “Naturalmente um objetivo didático: tirar a lição de que necessitamos aprender com ele, através de sua vida e de sua obra, aplicando essa lição às diversas circunstâncias da vida”.

PUREZA ENGESSADA

  Por Marcelo Teixeira Era o ano de 2010, a Cia. de teatro da qual Luís Estêvão faz parte iria apresentar, na capital de seu Estado, uma peça teatral que estava sendo muito elogiada. Várias cidades de dois Estados já haviam assistido e aplaudido a comovente história de perdão e redenção à luz dos ensinamentos espíritas. A peça estreara dez anos antes. Desde então, teatros lotados. Gente espírita e não espírita aplaudindo e se emocionando. E com a aprovação de gente conhecida no movimento espírita! Pessoas com anos de estrada que, inclusive, deram depoimento elogiando o trabalho da Cia. teatral.

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

A CULPA É DA JUVENTUDE?

    Por Ana Cláudia Laurindo Para os jovens deste tempo as expectativas de sucesso individual são consideradas remotas, mas não são para todos os jovens. A camada privilegiada segue assessorada por benefícios familiares, de nome, de casta, de herança política mantenedora de antigos ricos e geradora de novos ricos, no Brasil.

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.

O MOVIMENTO ESPÍRITA MUNDIAL É HOJE MAIS AMPLO E COMPLEXO, MAS NÃO É UM MUNDO CAÓTICO DE UMA DOUTRINA DESPEDAÇADA*

    Por Wilson Garcia Vivemos, sem dúvida, a fase do aperfeiçoamento do Espiritismo. Após sua aurora no século XIX e do esforço de sistematização realizado por Allan Kardec, coube às gerações seguintes não apenas preservar a herança recebida, mas também ampliá-la, revendo equívocos e incorporando novos horizontes de reflexão. Nosso tempo é marcado pela aceleração do conhecimento humano e pela expansão dos meios de comunicação. Nesse cenário, o Espiritismo encontra uma dupla tarefa: de um lado, retornar às fontes genuínas do pensamento kardequiano, revendo interpretações imprecisas e sedimentações religiosas que se afastaram de seu caráter filosófico-científico; de outro, abrir-se à interlocução com as descobertas contemporâneas da ciência e com os debates atuais da filosofia e da espiritualidade, como o fez com as fontes que geraram as obras clássicas do espiritismo, no pós-Kardec.

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.