segunda-feira, 24 de outubro de 2022

SER OU NÃO SER ESPÍRITA

 


 Por Doris Gandres

José Herculano Pires, em seu livro Agonia das Religiões, no capítulo I, afirma em determinado trecho que “o poder das religiões não é mais religioso, mas simplesmente econômico, político e social”. E é o que se constata ao analisar a atuação das religiões convencionais e mais difundidas no mundo ocidental moderno, principalmente no que se refere ao poder econômico e político, crescente de ano para ano. O social, por outro lado, embora ainda de vulto, vem decrescendo paulatinamente, quer por omissão ou conveniência dos dois primeiros campos de ação.

No capítulo II do mesmo livro, Herculano chama a atenção para uma situação bastante atual quanto à posição do homem no domínio das religiões: O dilema do homem contemporâneo é SER OU NÃO SER RELIGIOSO”; isso porque, de acordo com sua reflexão e os fatos evidentes, “a religião transformou-se em questão opinativa”, em função das seguintes posturas – a) materialista – que se atém às convenções e necessidades terrenas; b) pragmatistapor uma questão de conveniência e até de moda; e c) espiritualista – que se volta mais para o problema vital de sobrevivência do ser imortal, naturalmente dentro dos respectivos conceitos religiosos.

Ele ainda assinala no mesmo livro que “o homem traz em si o sentido inato de religiosidade, visto que a ideia de Deus é inata no homem (...) É uma ideia evidente por si mesma e indispensável à compreensão de nós mesmos e do mundo.”

Custa-nos ainda hoje aceitar ser essa afirmação de que é a presença de Deus em nós que nos facilita compreender a nós mesmos e ao mundo. Jesus de Nazaré, mestre e irmão maior, já tentara nos fazer entender essa comunhão quando nos disse “Deus não está aqui, nem acolá; está dentro de vós” e, ainda, quando revelou a nossa filiação espiritual ao declarar “meu Deus e vosso Deus, meu Pai e vosso Pai”.

Contudo, séculos transcorreram durante os quais o que fizemos foi amordaçar esse Deus em nós e erigir uma série de procedimentos pretensamente religiosos, a maioria dos quais em absoluto desacordo com as leis naturais criadas a nosso favor e benefício. Elaboramos um deus humano, com nossos atributos, acreditando assim nos aproximarmos daquilo que, na verdade, já trazemos em nós desde o momento da criação: o sentimento inato de religiosidade, de adoração a Deus – que nada mais é do que a elevação do pensamento a Deus (OLE qs. 649 e 650), sem representações, títulos, paramentos e dogmas quaisquer.

A Doutrina Espírita, clara, objetiva e transparente, não deixando margem a nenhuma interpretação, nos oferece as suas três vertentes, tal como muito bem esclarecido por Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Conclusão, item VII: “O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: 1º) o das manifestações, 2º) o dos princípios de filosofia e moral que delas decorrem e 3º) o da aplicação desses princípios.

Percebe-se nesses aspectos o seu cunho científico no primeiro deles; seu cunho filosófico no segundo; e seu cunho de religiosidade no terceiro ao enfocar a aplicação dos ensinamentos morais. Tanto que para o Evangelho Segundo o Espiritismo Kardec e os Espíritos que o assistiam recolheram dos evangelhos convencionais apenas a parte moral neles contida.

No item anterior (VI), Kardec enfatiza que “seria fazer-se uma ideia bem falsa do Espiritismo acreditar que ele tira sua força da prática das manifestações materiais, e que, portanto, entravando-se essas manifestações, pode-se minar-lhe as bases. Sua força está na sua filosofia, no apelo que faz à razão e ao bom senso.”

Por tudo isso e muito mais, se pretendemos conhecer o espiritismo, devemos meditar acerca do que significa SER OU NÃO SER ESPÍRITA, visto que SER ESPÍRITA requer o respeito aos princípios doutrinários escolhidos sem preterir nem preferir nenhum de seus aspectos, sem no entanto abdicar do uso da avaliação e análise de todo o seu conteúdo, além de assumir a nossa responsabilidade perante as leis da vida, com vistas ao nosso progresso individual e ao progresso de todos, a fim de construirmos, no trabalho e no esforço coletivo, uma sociedade mais justa e mais feliz.

Deolindo Amorim, um de nossos mais ilustres espíritas, fundador do Instituto de Cultura Espírita do Brasil, frisou: “o Espiritismo não veio apenas para aliviar, consolar, como se diz constantemente: ele alivia e consola, não há dúvida, mas desperta, antes de tudo, o sentimento de responsabilidade”. (1)

Para finalizar, transcrevo ainda um outro esclarecimento valioso de Deolindo Amorim: “O Espiritismo tem um programa básico: modificar a criatura humana, educá-la espiritualmente, emancipá-la de qualquer submissão a imagens e “fórmulas sacramentais”. Nele se ensina a religião natural, a religião da consciência cada vez mais esclarecida para sentir a existência de Deus como realidade suprema e onisciente e não como objeto de temor.” (2)

 

1) livro Relembrando Deolindo I

2) livro Espiritismo e as Doutrinas Espiritualistas

 

 

Um comentário:

  1. Entre o conhecer e o Saber,existe uma distância imensa chamada de praticar!

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