Pular para o conteúdo principal

HOMENAGEM AOS PAIS VENCIDOS

Eu escolhi um lado do muro. A posição do meio configura aos meus olhos como expressão de medonha sordidez, mas sei que muitos estarão pensando apenas na própria comodidade, uma espécie de ilusão existencial que por instantes os leva a deduzir vantagem, seguridade, oportunidades…onde os demais são impedidos de entrar, no entanto, isso nem sempre será confirmado.

 Hoje minha escolha é por quem olha com tristeza as altas paredes erguidas e consegue ser útil à vida, apesar do peso da dor existencial que é obrigado a transportar. É para estes pais, que escrevo hoje, minha homenagem.

 Aos pais que receberão como presente o aguçar de uma saudade infinda, a lembrança dos filhos mortos, retirados de casa e do abraço à força de bala e outras violências.

 Àqueles que viram seus filhos sair para não voltar, e tiveram de ouvir o canto do sadismo social, fazendo coro ao extermínio do que deveria ser a esperança.

 Aos pais pregados na mesma cruz da discriminação de raça e classe, dirijo este alento ao lhes dizer que não estão sozinhos. São parte de uma humanidade que luta por rosto, nome, respeito social e direito à vida, desde a cruel colonização desta América.

 A identidade de subclasse que lhes foi imposta, serviu de mote para a morte de seus filhos, e apenas a resistência germinará esperança para as novas gerações conseguirem resistir.

 Para Bauman “o significado da ‘identidade da subclasse’ é a ausência de identidade, a abolição ou negação da individualidade, do ‘rosto’. Por essa razão o poder destrutivo investe em codinomes pejorativos a vestir os filhos da pobreza imposta.

 E a sociedade classista se esmera em produzir “lixos humanos” para poder jogar fora sem culpa. Por essa razão é permitido matar jovem pobre, jovem negro, filhos da ausência de pavimentação e da presença dos esgotos a céu aberto, “bandidos”, “marginais”, condenados em potencial desde o nascimento.

 Aos pais sem presente, afogados no alcoolismo e outras fugas, esta homenagem sentida. Aos que detém nos braços os corpos esfarrapados de filhos consumidos pela ação malévola do crack, carregando o peso de não ver saída, dedico esta esperança de ressurreição identitária, no acalanto de uma força interior incontida, chamada fé.

 Eu escolhi este lado do muro, e neste final de semana festivo dedico minhas preces aos pais sem filhos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.