Pular para o conteúdo principal

O ESPÍRITA É RELIGIOSO?¹



        
          A palavra Religião tem derivação do latim e é discutido pelos especialistas se significa re-unir/re-ligar (religare) ou re-ler (relere), ambas as formas interpretadas como uma vinculação aos aspectos metafísicos e sobrenaturais que conduzem à discussão a respeito da divindade. Definitivamente foi a humanidade que inventou as palavras, logo elas revelam a nossa capacidade de compreensão dos vocábulos para o mais adequado entendimento.

As maiores religiões do mundo atual são (ordem crescente de adeptos): Judaísmo (Moisés e Profetas), Sikhismo (Guru Nanak), Budismo (Buda), Tradicional Chinesa (Confúcio/Taoismo/Budismo), Hinduísmo (Textos dos Vedas), Islamismo (Maomé), Cristianismo (Jesus). Importa considerar que, segundo fontes, há 12% da população do mundo sem religião alguma. Curiosamente as religiões sempre surgiram depois da morte física daqueles considerados os seus patronos, logo sem as suas participações ativas. Certamente o processo da formação de um pensamento religioso é outorgado pelas pessoas que conviveram próximas àqueles que lhes deu nome, mas ocorrem com a separação clara entre os grupos que diferem a respeito da interpretação das palavras de seus patronos e naturalmente o grupo mais poderoso sufoca os outros menores; com a separação sobrevêm as regras de conduta e a formatação da ideia de deus que deve ser seguida. Geralmente esse deus é muito poderoso e dotado da capacidade de punir de forma muito aguda aqueles que não seguirem os fundamentos gerados pelos fundadores humanos daquele pensamento, seus primeiros líderes.
O ato de formalizar o pecado e especular o paraíso, pela admissão da vida eterna que dispõe a figura de deus como elemento fiscal dessas doutrinas pelos profitentes gera um dos maiores equívocos. Tornou-se a moeda de troca entre a fé dos convertidos e a prática proselitista dos formuladores da fé. Tais fundamentos afogam a essência da mensagem original utilizando-se a “mão de ferro” da imposição do pensamento religioso, pelo temor à ira divina. Acerca disso Allan Kardec assim se declara na Revista Espírita 1868 (nº 12): “Disto resulta que cada um, fazendo seu dever consistir na realização da forma, se julga quites com Deus e com os homens, desde que praticou uma fórmula”. Essa atitude gera a religião da aparência pelo medo, não pela adoração a Deus.
Isso explica porque a questão nº 1 de O livro dos Espíritos desfaz enganos; desacopla Deus da condição de fiscal, anulando qualquer interpretação de que Ele venha a ser “ALGUÉM com super poderes” e que acompanhe as pessoas com ensejo de puni-las ou absolvê-las:” Que é Deus? Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas”. Observado pelos Espíritos Codificadores que o Espiritismo, uma doutrina com implicações científicas, filosóficas e religiosas necessitava de um norte moral eis que a questão 625 daquela obra indica o escolhido: “Qual o tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e modelo? Vede Jesus”. Essa a razão pela qual o Espiritismo nos premia com uma religião que não propala o temor nem incentiva fórmulas, proclama Deus em sua Grandeza sem caracteres humanos e bebe de Jesus em sua fonte moral, sem os atavismos de um cristianismo de cheio de receituários salvacionistas. O seu lema: “Fora da Caridade não há Salvação”. Praticar a Caridade é ter o coração religioso (ligado ou relendo), independente de qualquer filiação oficial. O espírita também é, portanto, religioso.   

¹editorial do programa Antena Espírita de 30.07.2017.

Comentários

  1. Caro Caldas, o prof. Herculano Pires, em sua obra Agonia das Religiões, parodiando Aristóteles que afirmou que o homem é um animal político, para ele o homem é um animal religioso. Confesso, contudo, que o título e o fechamento do seu artigo arrepiou-me. Por quê? O sentimento de religiosidade é inato no homem. O homem religioso é um constructo social,o que justifica as divisões em religiões, diferente de religiosidade. Portanto, o espírita é religioso como atividade fim do constructo moral e não social.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Brilhante conclusão caro Jorge Luiz. Roberto Caldas

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

ASTRÔNOMO DIZ QUE JESUS PODE TER NASCIDO EM JUNHO (*)

  Por Jorge Hessen Astrônomo diz que Jesus pode ter nascido em junho Uma pesquisa realizada por um astrônomo australiano sugere que Jesus Cristo teria nascido no dia 17 de junho e não em 25 de dezembro. De acordo com Dave Reneke, a “estrela de Natal” que, segundo a Bíblia, teria guiado os Três Reis Magos até a Manjedoura, em Belém, não apenas teria aparecido no céu seis meses mais cedo, como também dois anos antes do que se pensava. Estudos anteriores já haviam levantado a hipótese de que o nascimento teria ocorrido entre os anos 3 a.C e 1 d.C. O astrônomo explica que a conclusão é fruto do mapeamento dos corpos celestes da época em que Jesus nasceu. O rastreamento foi possível a partir de um software que permite rever o posicionamento de estrelas e planetas há milhares de anos.

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

TUDO MUDOU. E AS INSTITUIÇÕES?

  Por Orson P. Carrara Os de minha geração, nascidos nas décadas de 60 a 80 ou 90 e, claro, mesmo anteriores, lembram-se perfeitamente do formato de organização e funcionamento de uma padaria, de uma farmácia ou de um mercado, entre outros estabelecimentos comerciais. Hoje temos tais formatos completamente diferentes. O que antes era balcão único de atendimento mudou para prateleiras abertas, inclusive com auto atendimento para pagamento. Antes levávamos o pão para casa, hoje vamos à padaria tomar café para apreciar outras delícias. Farmácias normalmente eram reduzidas, hoje se multiplicaram com total mudança nos atendimentos, face às facilidades virtuais. Nem é preciso citar mais nada, todos estamos muito habituados às facilidades dos dias atuais.

DESCOBRINDO UM ESPIRITISMO LIBERTADOR

  Por Ana Cláudia Laurindo Ser espírita livre em uma sociedade prenhe de padrões e vícios, tem sido a conquista deste tempo, onde não pertencer é sinônimo de alcance, mantendo fidelidade intelectual e moral aos preceitos do livre pensamento. O elitismo de provar que sabe ronda os agrupamentos espíritas brasileiros, inclusive aqueles que se recomendam progressistas, no entanto, as armadilhas dos hábitos de manutenção de perspectivas sociais baseadas em correlação de força que perpassam o status quo, disparam alertas.

DIVERSIDADE SEXUAL E ESPIRITISMO - O QUE KARDEC TEM A VER COM ISSO?

            O meio espírita, por conta do viés religioso predominante, acaba encontrando certa dificuldade na abordagem do assunto sexo. Existem algumas publicações que tentam colocar o assunto em pauta; contudo, percebe-se que muitos autores tentam, ainda que indiretamente, associar a diversidade sexual à promiscuidade, numa tentativa de sacralizar a heterocisnormatividade e marginalizar outras manifestações da sexualidade; outros, quando abrem uma exceção, ressaltam os perigos da pornografia e da promiscuidade, como se fossem características exclusivas de indivíduos LGBTQI+.

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

SOCIALISMO E ESPIRITISMO: Uma revista espírita

“O homem é livre na medida em que coloca seus atos em harmonia com as leis universais. Para reinar a ordem social, o Espiritismo, o Socialismo e o Cristianismo devem dar-se nas mãos; do Espiritismo pode nascer o Socialismo idealista.” ( Arthur Conan Doyle) Allan Kardec ao elaborar os princípios da unidade tinha em mente que os espíritas fossem capazes de tecer uma teia social espírita , de base morfológica e que daria suporte doutrinário para as Instituições operarem as transformações necessárias ao homem. A unidade de princípios calcada na filosofia social espírita daria a liga necessária à elasticidade e resistência aos laços que devem unir os espíritas no seio dos ideais do socialismo-cristão. A opção por um “espiritismo religioso” fundado pelo roustainguismo de Bezerra Menezes, através da Federação Espírita Brasileira, e do ranço católico de Luiz de Olympio Telles de Menezes, na Bahia, sufocou no Brasil o vetor socialista-cristão da Doutrina Espírita. Telles, ao ...

VISÕES NO LEITO DE MORTE¹

Especialista no tratamento de traumas e processo de superação, Dr Julio Peres, analisa as experiências no final da vida e o impacto das visões espirituais ao enfermo e sua família, assim como para os profissionais da saúde que atuam em cuidados paliativos. De acordo com Dr. Júlio Peres, pesquisas recentes demonstram que um grande número de pessoas de distintas culturas têm relatado experiências no final da vida – originalmente chamadas na literatura por end-of-life experiences – sob a forma de visões no leito de morte, sugestivas da existência espiritual. Esta linha de pesquisa tem trazido contribuições que interessam diretamente aos profissionais que atuam com cuidados paliativos e mais especificamente, aqueles que desenvolveram a Síndrome de Burnout decorrente do esgotamento, angústia e incapacidade perante a falta de recursos para lidar com as sucessivas mortes de seus pacientes.