Pular para o conteúdo principal

A PEDAGOGIA RELIGARE








“Que consequência podemos tirar do sentimento
intuitivo, que todos os homens trazem consigo,
da existência de Deus?
R. Que Deus existe; pois de onde lhes virá esse
sentimento, se ele não se apoiasse em nada? É uma
consequência do princípio de que não há efeito sem causa.”
(“O Livro dos Espíritos”, questão nº 5)



Por Jorge Luiz (*)



          


            No capítulo II – As Leis Morais – Livro III de “O Livro dos Espíritos”, os Benfeitores Celestes ampliam a definição acima, ensinando-nos que jamais houve povos ateus.
            Vê-se, portanto, que a religiosidade ou espiritualidade, é a marca do Criador na criatura. É um sentimento inato. É a Sua relação implícita no ser humano. É ele que emula a busca um sentido maior para a Vida. Todos nós possuímos este sentimento.
            A religiosidade caracteriza o homem como Ser teleológico, sempre gravitando em direção a Deus. Portanto, a existência do Espírito tem como objetivo maior a religação com o Pai Supremo.  A este respeito o Espírito Paulo, “O Apóstolo”, na questão 1009 de “O Livro dos Espíritos”, afirma: “Gravitar para a unidade divina, esse é o objetivo da Humanidade. Para atingi-lo, três coisas são necessárias: a justiça, o amor e a ciência.(...)”
            Da religiosidade é que se desenvolve o método da educação do Espírito, que designarei de Pedagogia Religare. A pedagogia como teoria da educação, ela é divinal quando tem como primeira causa o Espírito imortal, sobrevivente e comunicante, interexistencial que é. Para ele converge a sucessão de processos doutrinais que ao longo do tempo formam programa de ações naturais para a redenção espiritual do Homem, tendo como principais paradigmas o Amor e a Dor, a última pertinente ao atual estágio do Planeta.
            De acordo com a evolução do Espírito enquanto encarnado (Alma), a Pedagogia Religare ocorre em processo de relação, observada desde as manifestações primitivas totêmicas (litolatria, fitolatria, zoolatria e a antropolatria); politeísmo mitológico; monoteísmo judaico-cristão e as vidas sucessivas da Doutrina dos Espíritos. Sempre do imanente para o transcendente.
            As religiões e as filosofias da Antiguidade desenvolveram processos na linha desta pedagogia quando buscavam harmonizar o homem com a natureza e com Deus. A sistematização começa a ocorrer com a pedagogia socrática-platônica (MORAL/RECORDAÇÕES), alcança seu clímax com a pedagogia cristã (AMOR) e se consolida na pedagogia espírita (RENASCIMENTOS). A Pedagogia Religare é eminentemente prática.
            Podemos entender assim, que a evolução da condição religiosa do Homem se eleva aos planos superiores com a mensagem de Jesus e a fé raciocinada de Allan Kardec.
            A Pedagogia Religare é assentada na Lei Natural. O Apóstolo dos Gentios na sua Epistola aos Gálatas, 3:23-25:, já assinalava essa realidade: “Mas, antes que viesse a fé, estávamos sob a tutela da lei (...)” De maneira que a lei nos serviu de aio (pedagogo), para nos conduzir a Cristo, a fim de que pela fé fôssemos justificados.”
            Por mais paradoxal que pareça, é com a institucionalização da religião, principalmente através do catolicismo que buscou universalizar-se, que ocorreu um empobrecimento de valores pedagógicos pela perda da autonomia dos educandos, vez que as religiões se colocam como as detentoras de poder para o acesso ao Reino dos Céus, encarcerando consciências, contrariando o apelo libertador da mensagem do Cristo, que o conhecimento da verdade liberta.
            É importante frisar que, apesar deste empobrecimento, a presença da religião no contexto familiar foi de alguma sorte importante. No passado, a religião foi o princípio constitutivo da família. Na formação da sua doutrina estabelecia valores e princípios que deveriam ser seguidos e obedecidos. O patriarcado, portanto, elaborou o discurso decisivo desta pedagogia. A família reproduzia o espaço político e religioso. Na religião, a soberania de Deus (PAI); sistema político, o poder soberano do Rei, e na família, portanto o pai. Esta ordem predominou na família extensa e não deixa de ter influência no modelo nuclear.
            Identifica-se, ainda, na família patriarcal a figura do padre (do latim pai) presente no seu contexto. Toda a família buscava expressar a sua religiosidade, simbolicamente, com a existência de um altar onde todos se reuniam em torno, e na medida do possível, com a formação de um filho padre. Estas características marcaram de forma indelével o nosso inconsciente.
            Em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, cap. XI:9,  o Espírito Fénelon destaca o seguinte: “façam o que quiserem, não conseguirão sufocar o germe vivaz que Deus depositou em seus corações, no ato da criação. Esse germe se desenvolve e cresce com a moralidade e inteligência.”
            A família é o agente pedagógico natural.  Consequentemente, o lar é o educandário oficial tendo na MORAL CRISTÃ a sua transdisciplinaridade. A família no futuro, fundamentada pelos princípios espiritistas, consolidará esta particularidade.
            A religiosidade é autônoma. As religiões são heterônomas.
            A Pedagogia Espírita vem libertar a Pedagogia Religare dos formalismos e condicionamentos que a envolveu ao longo da história das Civilizações, resgatando a autonomia do educando, tornando-o ciente das suas responsabilidades no plano físico e espiritual.
            A espiritualidade em nossos dias já se adorna de evidência científica. O geneticista americano Dean Hamer considera que dispomos de um gene que ele designa de “gene de Deus”, específico, associado à escala de autotranscendência da espiritualidade.
            Já Francis Collins, outro geneticista americano, diretor do Projeto Genoma Humano, assim atestou na conclusão das suas pesquisas: “A linguagem de Deus estava revelada.”
            A secularização na atualidade marca o ocaso das religiões que deverão continuar cumprindo papel social, adequando-se no tempo a estas necessidades.
            A Pedagogia Religare, através da Pedagogia Espírita, resgata o projeto social de Deus para a Terra, fomentada por uma ordem social justa e fraterna. Assim Allan Kardec se expressa na questão nº 930 de “O Livro dos Espíritos”: “Quando O homem praticar a Lei de Deus disporá uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade e com isso ele mesmo será melhor.”
            A Pedagogia Religare, é natural, progressiva, autônoma, tendo em seu núcleo a Lei de Amor, Justiça e Caridade, emoldurada pela Ciência Espírita.


(*) livre-pensador e voluntário do Instituto de Cultura Espírita - ICE

Comentários

  1. O EDE desse semestre que estamos estudando no grupo é sobre "As Leis Morais" sendo de extrema valia nos conceitos espírita! Muito Obrigado!!!

    ResponderExcluir
  2. "A Pedagogia Religare, é natural, progressiva, autônoma, tendo em seu núcleo a Lei de Amor, Justiça e Caridade, emoldurada pela Ciência Espírita." O que dizer mais ?

    Aline Loiola

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

A PIOR PROVA: RIQUEZA OU POBREZA?

  Por Ana Cláudia Laurindo Será a riqueza uma prova terrível? A maioria dos espíritas responderá que sim e ainda encontrará no Evangelho Segundo o Espiritismo a sustentação necessária para esta afirmação. Eis a necessidade de evoluir pensamentos e reflexões.

O CORDEIRO SILENCIADO: AS TEOLOGIAS QUE ABENÇOARAM O MASSACRE DO ALEMÃO.

  Imagem capa da obra Fe e Fuzíl de Bruno Manso   Por Jorge Luiz O Choque da Contradição As comunidades do Complexo do Alemão e Penha, no Estado do Rio de Janeiro, presenciaram uma megaoperação, como define o Governador Cláudio Castro, iniciada na madrugada de 28/10, contra o Comando Vermelho. A ação, que contou com 2.500 homens da polícia militar e civil, culminou com 117 mortos, considerados suspeitos, e 4 policiais. Na manhã seguinte, 29/10, os moradores adentraram a zona de mata e começaram a recolher os corpos abandonados pelas polícias, reunindo-os na Praça São Lucas, na Penha, no centro da comunidade. Cenas dantescas se seguiram, com relatos de corpos sem cabeça e desfigurados.

"FOGO FÁTUO" E "DUPLO ETÉRICO" - O QUE É ISSO?

  Um amigo indagou-me o que era “fogo fátuo” e “duplo etérico”. Respondi-lhe que uma das opiniões que se defende sobre o “fogo fátuo”, acena para a emanação “ectoplásmica” de um cadáver que, à noite ou no escuro, é visível, pela luminosidade provocada com a queima do fósforo “ectoplásmico” em presença do oxigênio atmosférico. Essa tese tenta demonstrar que um “cadáver” de um animal pode liberar “ectoplasma”. Outra explicação encontramos no dicionarista laico, definindo o “fogo fátuo” como uma fosforescência produzida por emanações de gases dos cadáveres em putrefação[1], ou uma labareda tênue e fugidia produzida pela combustão espontânea do metano e de outros gases inflamáveis que se evola dos pântanos e dos lugares onde se encontram matérias animais em decomposição. Ou, ainda, a inflamação espontânea do gás dos pântanos (fosfina), resultante da decomposição de seres vivos: plantas e animais típicos do ambiente.

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ESPÍRITISMO E CRISTIANISMO (*)

    Por Américo Nunes Domingos Filho De vez em quando, surgem algumas publicações sem entendimento com a codificação espírita, clamando que a Doutrina Espírita nada tem a ver com o Cristianismo. Quando esse pensamento emerge de grupos religiosos dogmáticos e intolerantes, até entendemos; contudo, chama mais a atenção quando a fonte original se intitula espiritista. Interessante afirmar, principalmente, para os versados nos textos de “O Novo Testamento” que o Cristo não faz acepção de pessoas, não lhe importando o movimento religioso que o segue, mas, sim, o fato de que onde estiverem dois ou três reunidos em seu nome ele estará no meio deles (Mateus XVIII:20). Portanto, o que caracteriza ser cristão é o lance de alguém estar junto de outrem, todos sintonizados com Jesus e, principalmente, praticando seus ensinamentos. A caridade legítima foi exemplificada pelo Cristo, fazendo do amor ao semelhante um impositivo maior para que a centelha divina em nós, o chamado “Reino de...

O ESTUDO DA GLÂNDULA PINEAL NA OBRA MEDIÙNICA DE ANDRÉ LUIZ¹

Alvo de especulações filosóficas e considerada um “órgão sem função” pela Medicina até a década de 1960, a glândula pineal está presente – e com grande riqueza de detalhes – em seis dos treze livros da coleção A Vida no Mundo Espiritual(1), ditada pelo Espírito André Luiz e psicografada por Francisco Cândido Xavier. Dentre os livros, destaque para a obra Missionários da Luz, lançado em 1945, e que traz 16 páginas com informações sobre a glândula pineal que possibilitam correlações com o conhecimento científico, inclusive antecipando algumas descobertas do meio acadêmico. Tal conteúdo mereceu atenção dos pesquisadores Giancarlo Lucchetti, Jorge Cecílio Daher Júnior, Décio Iandoli Júnior, Juliane P. B. Gonçalves e Alessandra L. G. Lucchetti, autores do artigo científico Historical and cultural aspects of the pineal gland: comparison between the theories provided by Spiritism in the 1940s and the current scientific evidence (tradução: “Aspectos históricos e culturais da glândula ...

O DISFARCE NO SAGRADO: QUANDO A PRUDÊNCIA VIRA CONTRADIÇÃO ESPIRITUAL

    Por Wilson Garcia O ser humano passa boa parte da vida ocultando partes de si, retraindo suas crenças, controlando gestos e palavras para garantir certa harmonia nos ambientes em que transita. É um disfarce silencioso, muitas vezes inconsciente, movido pela necessidade de aceitação e pertencimento. Desde cedo, aprende-se que mostrar o que se pensa pode gerar conflito, e que a conveniência protege. Assim, as convicções se tornam subterrâneas — não desaparecem, mas se acomodam em zonas de sombra.   A psicologia existencial reconhece nesse movimento um traço universal da condição humana. Jean-Paul Sartre chamou de má-fé essa tentativa de viver sem confrontar a própria verdade, de representar papéis sociais para evitar o desconforto da liberdade (SARTRE, 2007). O indivíduo sabe que mente para si mesmo, mas finge não saber; e, nessa duplicidade, constrói uma persona funcional, embora distante da autenticidade. Carl Gustav Jung, por outro lado, observou que essa “másc...