Pular para o conteúdo principal

TODOS FOMOS CHAMADOS MAS...

 


Por Jorge Hessen

Em nosso processo evolutivo, somos convidados pelo Criador a adentrar pela porta estreita que nos conduz à vida essencial através do exercício das virtudes contidas no código moral de lei da consciência; no entanto, ao marcharmos pela estrada da vida, quase sempre abraçamos a viciação e atravessamos a porta larga que nos transporta à ansiedade e à desdita, sob o aguilhão da preguiça moral, da empáfia, das facilidades inebriantes, da luxúria, da hipnose mental, da inveja, que repletam o mundo transitório das ilusões.

Eis aí a abertura da perdição, porque são amplas as viciações que trazemos enraizadas em nossa milenar e sombria hegemonia do egoísmo. Marchando de tal modo, a vida nos relega a assumirmos as consequências de nossas escolhas egoicas, consoante indicado na máxima do Cristo: “Muitos são os chamados e poucos os escolhidos”. (1)

Os escolhidos conseguem despertar as potencialidades do ser essencial, para a evolução do eu divino que somos em essência, que é infinitamente maior do que as conquistas transitórias das coisas impermanentes ao longo do tempo. Por isso, a comparação da majestática festa, onde tudo é beleza e contentamento, porque aquele que evolui essencialmente, e que passa a conhecer e conviver em harmonia com o Código moral de lei da consciência, vive de forma leve, suave, alegre e feliz.

Resolvido o problema do Espírito, pela autoeducação, pelo esforço ininterrupto, tudo nos será acrescentado e nada nos entristecerá, nem as questões econômicas, nem as dificuldades de relacionamento, ou mesmo de saúde, porque conectados com a essência divina que somos transcenderemos a todos os desafios fugazes da matéria.

A rigor, naturalmente temos dois tipos de apetite: da fome material e da fome espiritual. Para atender a fome do corpo físico nos empenhamos, lutamos, lançamos mão de todos os recursos transitórios. Mas, quanto a fome espiritual, comumente não nos cuidamos. Nem queremos saber que temos necessidade de alimento espiritual. Ignoramos essa necessidade, e até tratamos mal os que nos oferecem.

De fato, muitos de nós queremos cura para o corpo, resolver os problemas de ordem material, mas são raros os que querem aprender a amar, a servir, a ser útil a seu próximo. A História nos apresenta seres moralmente esclarecidos, que trabalharam para levar o alento espiritual (compreensão das Leis Divinas da consciência) e foram incompreendidos, insultados, e muitos pagaram com a própria vida, pelo fato de se amarem e amarem o seu semelhante. O exemplo maior é o do próprio Cristo.

A rigor, todos somos convidados. Porém, não basta sermos chamados, é necessário “vestirmos a túnica”, ou seja, purificarmos os sentimentos e praticarmos a Lei de amor, justiça e caridade, a fim de reunirmos condições para sermos escolhidos na divina festança.

Não basta saber, é preciso sentir e realizar. Não adianta tão-somente informação teórica, mas experiência transformadora. O critério da divinal escolha depende de nós, do nosso desempenho no bem, para nos adjudicar o caminho para a Vida Maior.

Jesus, referindo-se à Divina Ascensão para a Vida Maior disse que “serão muitos os chamados e poucos os escolhidos” para o reino dos céus. Isso quer dizer que, sem chamada, não há escolha. Mas se estamos claramente informados de que a chamada vem de Deus, atingindo todas as criaturas na hora justa da evolução, só a escolha, que depende do nosso discernimento e exemplicação de amor, nos confere caminho para a Vida Maior.

Sobre a questão de um dos chamamentos especiais, recordamos o Espirito Emmanuel, citando Francisco de Assis na monumental obra “A caminho da Luz”, informando que na Idade Média os apelos dos Benfeitores da Humanidade insistiram para que a igreja romana oferecesse a aplicação do código do amor e da fraternidade em todas as direções. Até porque, os movimentos tidos como “heréticos” (para os bispos da Cúria) germinavam por toda parte onde existisse consciências livres e corações sinceros, contudo, as autoridades eclesiásticas estorvaram os apelos do Alto.

No início do Século XIII, o combate contra os “hereges” abarcou o espaço de duas décadas, quando componentes do alto clero da Cúria de Roma deliberaram o baldrame do tribunal da penitência. O desígnio era precipuamente disfarçar tal empreendimento à guisa de administradora imperativa de suposta unificação religiosa, contudo o objetivo real era alargar a extensa autoridade clerical sobre as consciências livres.

Em verdade, se a Inquisição absorveu as autoridades da Igreja, antes da sua fundação, como notamos acima, do mesmo modo preocupava os Benfeitores do além, motivo pelo qual, foram providenciados medidas de renovação educativa em chamadas específicas.

Portanto, dentre tais convocados transcendes observamos a consolidação da reencarnação do ínclito filho de Assis. Isso foi marcante, porque a convocação e a atividade de Francisco iria ser reformista sem os choques próprios da verborragia, porque o seu sacerdócio seria o exemplo na pobreza e na mais absoluta humildade.

Nem por isso, o clero entendeu que a lição franciscana lhe dizia respeito e, ainda uma vez, não abrigou os convites dos Operários Divinos. A diligência atuante do filho da Úmbria, não logrou decompor o furor de domínio dos pontífices romanos, porém deixou traços cintilantes e indeléveis da sua passagem na Terra. Seu exemplo de simplicidade e de amor, de singeleza e de fé, contagiou numerosas criaturas, que se entregaram ao mister de regenerar almas para Jesus.

De fato, os seguidores de Francisco, não aderiram a porta larga e nem repousavam à sombra dos mosteiros, na falsa quietude sob a inócua contemplação, pois que reconheciam que a melhor oração, para Deus, é a da porta estreita do trabalho útil, no aprimoramento do mundo e dos corações pelos exemplos de renúncia.

Aliás, os discípulos do conspícuo filho da Úmbria destacam no exercício do amor a universalização das profundas reflexões da memorável oração. E, quando decodificamos o cântico de Francisco, à primeira vista temos a impressão que o filho de Assis apenas nos convida a sairmos por aí (esmolando), distribuindo coisas (materiais) a serem entregues aos esfaimados, porém, na verdade, a grande proposta de Francisco é que mergulhemos em nós mesmos para que onde houver o ódio em nosso mundo interior levemos amor; onde houver ofensa em nosso coração que plantemos o perdão. 

A oração de Francisco é um convite para trilharmos um caminho de aprendizado e autotransformação e tem o código moral de leis como referência máxima a fim de que possamos trilhar pelas vias da consciência.

Recordemos que Jesus nos convidou “vinde a mim, todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei comigo que sou brando e humilde de coração e achareis repouso para vossas almas, pois é suave o meu jugo e leve o meu fardo “. (3)  Se aceitarmos esse convite, observaremos na oração de Francisco de Assis um roteiro seguro de como fazer isso, seguir o caminho do Evangelho para sermos escolhidos na condição de aprendizes do Governador planetário.

Em todas as iniciativas humanas, somos chamados para realizações nobres e, no entanto, cobertos pela sombra dos egos (evidente e mascarado), prontamente desinteressamo-nos de avançar por ausência de retorno compensador ao vazio existencial, absorvendo-nos e entulhando-nos de ansiedades e ações no afã de aquisição de coisa vãs.

Destarte, ao galgarmos a estrada da evolução, faz-se mister a prudência, a temperança, a fé, a esperança, a caridade, percorrendo o caminho das lutas, dos obstáculos, dos sacrifícios, esforçando-nos para o autoaperfeiçoamento. Deste modo, permaneceremos nos aparelhando para um porvir de contentamento e felicidade.

É uma estrada árdua, bem sabemos, pois impõe ser trilhada com cuidado, examinando onde penetrar, porque poderemos levar longo tempo para retomar o caminho que nos é próprio, e entendendo, definitivamente, a importância do vigiar e orar tão alertado por Jesus.

Encontramo-nos envoltos em ações iluminativas cada vez mais austeras. Naturalmente arrostando as lutas, adquirimos sabedoria e ascendemo-nos recorrendo à oração como fonte de energia, inelutavelmente triunfaremos sobre as dificuldades que já não nos serão intransponíveis na caminhada, mas apenas uma experiência desafio no processo de autoevolução.

Portanto, na admoestação “muitos são os chamados e poucos os escolhidos” (2) para ingressarmos nos “Recintos celestiais”, metaforizado na majestosa festa, onde tudo era felicidade e alegria, podemos compreender como um convite para a evolução essencial, consoante a afirmativa de Jesus, que o “Reino divino” está em nossa própria consciência.

 

 

 

Referências:

 

1) Mateus, 20:16-20

 

2) idem, 22: 1-14

 

3) idem, 11:28-30

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

A CULPA É DA JUVENTUDE?

    Por Ana Cláudia Laurindo Para os jovens deste tempo as expectativas de sucesso individual são consideradas remotas, mas não são para todos os jovens. A camada privilegiada segue assessorada por benefícios familiares, de nome, de casta, de herança política mantenedora de antigos ricos e geradora de novos ricos, no Brasil.

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

O MOVIMENTO ESPÍRITA MUNDIAL É HOJE MAIS AMPLO E COMPLEXO, MAS NÃO É UM MUNDO CAÓTICO DE UMA DOUTRINA DESPEDAÇADA*

    Por Wilson Garcia Vivemos, sem dúvida, a fase do aperfeiçoamento do Espiritismo. Após sua aurora no século XIX e do esforço de sistematização realizado por Allan Kardec, coube às gerações seguintes não apenas preservar a herança recebida, mas também ampliá-la, revendo equívocos e incorporando novos horizontes de reflexão. Nosso tempo é marcado pela aceleração do conhecimento humano e pela expansão dos meios de comunicação. Nesse cenário, o Espiritismo encontra uma dupla tarefa: de um lado, retornar às fontes genuínas do pensamento kardequiano, revendo interpretações imprecisas e sedimentações religiosas que se afastaram de seu caráter filosófico-científico; de outro, abrir-se à interlocução com as descobertas contemporâneas da ciência e com os debates atuais da filosofia e da espiritualidade, como o fez com as fontes que geraram as obras clássicas do espiritismo, no pós-Kardec.

AMOR DE MÃE

O sentimento de amor mais refinado que nos envolve, massageia nosso coração com sensações sublimadas, sem qualquer interferência sediciosa ou de caráter mundano, é aquele experimentado do filho para mãe ou da mãe para o filho, não há do que duvidar, o passar do tempo revela essa verdade cada vez mais com transparência e comprovação sentimental. No esposo amoroso, à medida que cuidados esponsais são recebidos, amor materno é convocado, no idoso em final da trajetória terrena o fenômeno é relevante, como septuagenário percebo com clareza essa realidade, mormente em estados de convalescenças prolongadas,   meu pai, já próximo da partida à pátria espiritual, tratado por minha mãe com paciência imperturbável, sensibilizado, agradecia identificando-a como sua mãezinha e assim a tratava no relacionamento diário, via nela a presença de quem outrora recebeu carinhos protetores que lhe rejubilavam a casa ...

PRÓXIMOS E DISTANTES

  Por Marcelo Henrique     Pense no trabalho que você realiza na Instituição Espírita com a qual mantém laços de afinidade. Recorde todos aqueles momentos em que, desinteressadamente, você deixou seus afazeres particulares, para realizar algo em prol dos outros – e, consequentemente, para si mesmo. Compute todas aquelas horas que você privou seus familiares e amigos mais diletos da convivência com você, por causa desta ou daquela atividade no Centro. Ainda assim, rememore quantas vezes você deixou seu bairro, sua cidade, e até seu estado ou país, para realizar alguma atividade espírita, a bem do ideal que abraçaste... Pois bem, foram vários os momentos de serviço, na messe do Senhor, não é mesmo? Quanta alegria experimentada, quanta gente nova que você conheceu, quantos “amigos” você cativou, não é assim?

ÚLTIMAS INSTRUÇÕES DE ALLAN KARDEC AOS ESPÍRITAS(*)

“Caro e venerado   Mestre, estais aqui presente, conquanto invisível para nós. Desde a vossa partida tendes sido para todos um protetor a mais, uma luz segura, e as falanges do espaço foram acrescidas de um trabalhador infatigável.” (Trecho do discurso de abertura da Sessão Anual Comemorativa aos Mortos de novembro 1869 – Revista Espírita – dez/1869)   Por Jorge Luiz   O discurso de Allan Kardec, proferido na sessão anual da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas - SPEE, comemorativa aos mortos, em 1º de novembro de 1868, "O Espiritismo é uma Religião?" (leia aqui) - Revista Espírita, novembro de 1868 - contêm 3.881 palavras. Nele, Kardec discorre sobre a comunhão de pensamentos, as dimensões da caridade, o verdadeiro sentido de religião e sobre a crença espírita. Foi seu último discurso, pois cinco meses depois ocorre a sua desencarnação. Soa, portanto, como as últimas instruções aos espíritas, da mesma forma que Jesus as realizou aos...

DEMOCRACIA SEM ORIENTAÇÃO CRISTÃ?

  Por Orson P. Carrara Afirma o nobre Emmanuel em seu livro Sentinelas da luz (psicografia de Chico Xavier e edição conjunta CEU/ FEB), no capítulo 8 – Nas convulsões do século XX, que democracia sem orientação cristã não pode conduzir-nos à concórdia desejada. Grifos são meus, face à atualidade da afirmação. Há que se ressaltar que o livro tem Prefácio de 1990, poucas décadas após a Segunda Guerra e, como pode identificar o leitor, refere-se ao século passado, mas a atualidade do texto impressiona, face a uma realidade que se repete. O livro reúne uma seleção de mensagens, a maioria de Emmanuel.

TRAPALHADAS "ESPÍRITAS" - ROLAM AS PEDRAS

  Por Marcelo Teixeira Pensei muito antes de escrever as linhas a seguir. Fiquei com receio de ser levado à conta de um arrogante fazendo troça da fé alheia. Minha intenção não é essa. Muito do que vou narrar neste e nos próximos episódios talvez soe engraçado. Meu objetivo, no entanto, é chamar atenção para a necessidade de estudarmos Kardec. Alguns locais e situações que citarei não se dizem espíritas, mas espiritualistas ou ecléticos. Por isso, é importante que eu diga que também não estou dizendo que eles estão errados e que o movimento espírita, do qual faço parte, é que está certo. Seria muita presunção de minha parte. Mesmo porque, pelo que me foi passado, todos primam pela boa intenção. E isso é o que vale.