Pular para o conteúdo principal

O ESPIRITISMO E OS NOVOS ARRANJOS FAMILIARES

  

Por Alexandre Júnior*

           

 A família é uma instituição social, que de acordo com Engels (1984), teve início com a origem da propriedade privada, quando os grupamentos humanos passaram de nômades para sedentários. Os grupos foram se acomodando em torno de outros menores até que se constituiu a família, com o contato mais próximo uns dos outros, se desenvolveram os laços afetivos. Foi também nesse momento que surgiu a desigualdade de gênero e o determinismo biológico dos corpos humanos, o qual determinou papéis, status sociais, os quais definiram o lugar que homens e mulheres passariam a ocupar na sociedade. Essa forma de organização social instituiu o modelo de família nuclear, cujo princípio seria o homem mantenedor e a mulher cuidadora do lar. Esse modelo foi estabelecido socialmente como padrão “normal, como modelo a ser seguido”, no entanto, com o desenvolvimento social, todo e qualquer outro modelo fora desse padrão seria considerado desviante. 

            Segundo dados da PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio, a família pode ser vista como:

 

a) unidade de produção (valores de troca) e de reprodução (de indivíduos e valores de uso); b) unidade de reprodução e consumo; c) unidade de indivíduos com laços de consanguinidade; d) unidade de solidariedade, afeto e prazer; e) pessoas que dividem o mesmo teto e a mesma cozinha; f) local da relação dialética entre dominação e submissão; g) rede de parentesco (independente da moradia conjunta); h) espaço de socialização, reprodução ideológica e conflito; etc.

 

             Com o desenvolvimento da sociedade, os modelos de família foram se reorganizando de modo a atender a necessidade da sociedade vigente. Dentre os vários elementos constitutivos dos novos arranjos familiar encontra-se os fatores econômicos, sexuais, gênero, raça e classe social. O desenvolvimento do capitalismo foi um elemento divisor e definidor dos novos arranjos familiares, visto que, transformou os meios de produção bem como favoreceu a inserção da mulher no mercado de trabalho, criando desta maneira uma forma de organização social, que por seguinte gerou novos arranjos familiares, onde, a mulher passou a figurar como chefe de família. Com relação às mudanças sexuais, advindas da liberdade sexual, as famílias passaram a ser compostas por indivíduos do mesmo sexo, de mães e pais solteiros, pais divorciados entre outros.

 

            Ainda segundo o PNAD, novos Arranjos Familiares:

 

 

A primeira grande mudança foi a redução do arranjo majoritário formado por casais (núcleo duplo) com filhos. Em números aproximados, esse tipo de família estava presente em cerca de dois terços (66%) dos domicílios, em 1980, mas caiu para algo próximo de 50% em 2010.Casais sem filhos A segunda mudança – de maneira complementar à primeira – foi o aumento do arranjo formado apenas pelos casais sem filhos e sem outros parentes, que passou de 12% em 1980 para 15% em 2010. Arranjo monoparental feminino: A terceira alteração foi o aumento do arranjo monoparental feminino (núcleo simples, formado por mães com filhos), que passou de 11,5% em 1980 para 15,3% em 2010. Arranjo monoparental masculino: A quarta modificação foi também o aumento – ainda que de uma base menor – do arranjo monoparental masculino (núcleo simples, formado por homens com filhos), que passou de 0,8% em 1980 para 2,2% em 2010.

Mulheres morando sozinhas: A quinta transformação foi o crescimento do número de mulheres morando sozinhas, que passou de 2,8% em 1980 para 6,2% em 2010. Homens morando sozinhos: A sexta foi o crescimento do número de homens morando sozinhos, que passou de 3% em 1980 para 6,5% em 2010. E, finalmente, a sétima mudança aconteceu com a redução do percentual de famílias compostas e extensas (casais, filhos, parentes e agregados) que caiu de 4,8% para 2,2% no mesmo período.

 

 

            O censo demográfico de 2010, conduzido pelo IBGE, abriu, pela primeira vez, a possibilidade dos casais do mesmo sexo, que moram no mesmo domicílio, serem considerados um núcleo familiar. Os dados indicaram a presença de cerca de 60 mil casais formados por pessoas do mesmo sexo e um deles se declarou como chefe. Mas, se os casais moram em casas diferentes ou nenhum deles se declarou como chefe, não foram identificados pelo censo. As mulheres são maioria nos arranjos homoafetivos, inclusive na homoparentalidade. Portanto, já existem crianças com dupla “maternidade” ou dupla “paternidade”. Também não foi levantada a informação sobre orientação sexual.

            Os incontáveis questionamentos em torno dos novos arranjos familiares levam a reflexão das famílias que não se enquadram no modelo de família nuclear e se baseiam nas relações biológicas e não biológicas.

            O Espiritismo revelou a família como o local onde os Espíritos estão ligados por elos familiares, dado que muitas vezes eles são atraídos para tal ou qual família pela simpatia, ou pelos laços que anteriormente se estabeleceram. Não raro, esses elos são interrompidos pelo egoísmo, egocentrismo e vaidade humana.

Independente dos novos arranjos familiares, o Espiritismo traz no livro dos Espíritos, na questão 205,

 

 Segundo certas pessoas, a doutrina da reencarnação parece destruir os laços de família, fazendo-as remontar as existências anteriores?  Ela as amplia ao invés de destruí-los. Baseando-se o parentesco em afeições anteriores, os laços que unem os membros de uma mesma família são menos precários. A reencarnação amplia os deveres da fraternidade, pois no nosso vizinho ou no vosso criado pode encontrar-se um Espírito que foi do vosso sangue.

 

           Ainda sobre o processo reencarnatório a pergunta o livro dos espíritos na questão 200 e 201, responde que os espíritos não como o entendeis, pois que os sexos dependem da organização. Há entre eles amor e simpatia, mas baseados na concordância dos sentimentos, pois o espírito que o que animou o corpo de um homem pode animar um corpo de uma mulher e vice-versa.

        Os novos arranjos familiares foram construídos a partir das transformações sociais, que refletiram nas diferentes formas que se costurou os papéis de homens e mulheres dentro da família. Um dos grandes embates da sociedade contemporânea se volta para questão da família formada por casais do mesmo sexo. Todavia, o Livro dos Espíritos traz que a experiência em família é decorrente das experiências reencarnatórias anteriores e das afinidades, e, que os espíritos não têm sexo, que este serve apenas para experiências, como pode ser tão discriminado esse arranjo familiar, já que a família serve a evolução espiritual e moral humana?  Estaríamos nós em evolução, se nos apegarmos a limitação moral de não aceitar as diferenças? Esse texto serve a reflexão em relação ao que traz a Doutrina Espírita e a nossa experiência, enquanto seres em evolução.

 * em parceria com Rosângela Souza, Grupo Àgora Espírita.

Referências

Dados da PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio em Senso Demográfico realizado em 2010 pelo IBGE Instituto Nacional de Geografia e Estatística.

ENGELS, Friedrich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, 1984, p.3.

KARDEC, O Livro dos Espíritos, pergunta 200, 201, 202, 205, LAKE, 2007, Tradução José Herculano Pires.

Comentários

  1. É alentador, é louvável ler as ideias progressistas no meio espirita, saber que o ideal de uma sociedade mais justa, fundado com tanta sinceridade por Kardec, não se perdeu em meio ao farisaísmo que se tornou o MEB.

    ResponderExcluir
  2. Muito importante que reflitamos sobre essas questões, pois o espiritismo é uma filosofia libertária e, portanto, deve ajudar a humanidade a liberta-se dos preconceitos e atitudes discriminatórias. Todo arranjo familiar tem o seu valor para o progresso espiritual.
    Continuem pesquisando e fomentando as reflexões sobre os arranjos familiares.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

O CORDEIRO SILENCIADO: AS TEOLOGIAS QUE ABENÇOARAM O MASSACRE DO ALEMÃO.

  Imagem capa da obra Fe e Fuzíl de Bruno Manso   Por Jorge Luiz O Choque da Contradição As comunidades do Complexo do Alemão e Penha, no Estado do Rio de Janeiro, presenciaram uma megaoperação, como define o Governador Cláudio Castro, iniciada na madrugada de 28/10, contra o Comando Vermelho. A ação, que contou com 2.500 homens da polícia militar e civil, culminou com 117 mortos, considerados suspeitos, e 4 policiais. Na manhã seguinte, 29/10, os moradores adentraram a zona de mata e começaram a recolher os corpos abandonados pelas polícias, reunindo-os na Praça São Lucas, na Penha, no centro da comunidade. Cenas dantescas se seguiram, com relatos de corpos sem cabeça e desfigurados.

O DISFARCE NO SAGRADO: QUANDO A PRUDÊNCIA VIRA CONTRADIÇÃO ESPIRITUAL

    Por Wilson Garcia O ser humano passa boa parte da vida ocultando partes de si, retraindo suas crenças, controlando gestos e palavras para garantir certa harmonia nos ambientes em que transita. É um disfarce silencioso, muitas vezes inconsciente, movido pela necessidade de aceitação e pertencimento. Desde cedo, aprende-se que mostrar o que se pensa pode gerar conflito, e que a conveniência protege. Assim, as convicções se tornam subterrâneas — não desaparecem, mas se acomodam em zonas de sombra.   A psicologia existencial reconhece nesse movimento um traço universal da condição humana. Jean-Paul Sartre chamou de má-fé essa tentativa de viver sem confrontar a própria verdade, de representar papéis sociais para evitar o desconforto da liberdade (SARTRE, 2007). O indivíduo sabe que mente para si mesmo, mas finge não saber; e, nessa duplicidade, constrói uma persona funcional, embora distante da autenticidade. Carl Gustav Jung, por outro lado, observou que essa “másc...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

DIA DE FINADOS À LUZ DO ESPIRITISMO

  Por Doris Gandres Em português, de acordo com a definição em dicionário, finados significa que findou, acabou, faleceu. Entretanto, nós espíritas temos um outro entendimento a respeito dessa situação, cultuada há tanto tempo por diversos segmentos sociais e religiosos. Na Revista Espírita de dezembro de 1868 (1) , sob o título Sessão Anual Comemorativa dos Mortos, na Sociedade Espírita de Paris fundada por Kardec, o mestre espírita nos fala que “estamos reunidos, neste dia consagrado pelo uso à comemoração dos mortos, para dar aos nossos irmãos que deixaram a terra, um testemunho particular de simpatia; para continuar as relações de afeição e fraternidade que existiam entre eles e nós em vida, e para chamar sobre eles as bondades do Todo Poderoso.”

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

"FOGO FÁTUO" E "DUPLO ETÉRICO" - O QUE É ISSO?

  Um amigo indagou-me o que era “fogo fátuo” e “duplo etérico”. Respondi-lhe que uma das opiniões que se defende sobre o “fogo fátuo”, acena para a emanação “ectoplásmica” de um cadáver que, à noite ou no escuro, é visível, pela luminosidade provocada com a queima do fósforo “ectoplásmico” em presença do oxigênio atmosférico. Essa tese tenta demonstrar que um “cadáver” de um animal pode liberar “ectoplasma”. Outra explicação encontramos no dicionarista laico, definindo o “fogo fátuo” como uma fosforescência produzida por emanações de gases dos cadáveres em putrefação[1], ou uma labareda tênue e fugidia produzida pela combustão espontânea do metano e de outros gases inflamáveis que se evola dos pântanos e dos lugares onde se encontram matérias animais em decomposição. Ou, ainda, a inflamação espontânea do gás dos pântanos (fosfina), resultante da decomposição de seres vivos: plantas e animais típicos do ambiente.

O MEDO SOB A ÓTICA ESPÍRITA

  Imagens da internet Por Marcelo Henrique Por que o Espiritismo destrói o medo em nós? Quem de nós já não sentiu ou sente medo (ou medos)? Medo do escuro; dos mortos; de aranhas ou cobras; de lugares fechados… De perder; de lutar; de chorar; de perder quem se ama… De empobrecer; de não ser amado… De dentista; de sentir dor… Da violência; de ser vítima de crimes… Do vestibular; das provas escolares; de novas oportunidades de trabalho ou emprego…

O ESTUDO DA GLÂNDULA PINEAL NA OBRA MEDIÙNICA DE ANDRÉ LUIZ¹

Alvo de especulações filosóficas e considerada um “órgão sem função” pela Medicina até a década de 1960, a glândula pineal está presente – e com grande riqueza de detalhes – em seis dos treze livros da coleção A Vida no Mundo Espiritual(1), ditada pelo Espírito André Luiz e psicografada por Francisco Cândido Xavier. Dentre os livros, destaque para a obra Missionários da Luz, lançado em 1945, e que traz 16 páginas com informações sobre a glândula pineal que possibilitam correlações com o conhecimento científico, inclusive antecipando algumas descobertas do meio acadêmico. Tal conteúdo mereceu atenção dos pesquisadores Giancarlo Lucchetti, Jorge Cecílio Daher Júnior, Décio Iandoli Júnior, Juliane P. B. Gonçalves e Alessandra L. G. Lucchetti, autores do artigo científico Historical and cultural aspects of the pineal gland: comparison between the theories provided by Spiritism in the 1940s and the current scientific evidence (tradução: “Aspectos históricos e culturais da glândula ...