Pular para o conteúdo principal

O DESAFIO DOS DEZ ANOS E A VAGUIDÃO CONTEMPORÂNEA

 

                                    

Por Mário Portela

A internet está novamente ouriçada com o desafio dos dez anos. A moda nos incita a postar nas redes sociais uma foto do ano de 2013 e outra, atual de 2023. Colocadas uma ao lado da outra, podemos observar o quanto mudamos. Será? A brincadeira é interessante, considerando-se o surgimento de diversos memes divertidos. Além disso, apareceram, também, postagens reflexivas apresentando o antes e o depois da natureza, alertando-nos para as agressões que estamos cometendo ao meio ambiente. Há, ainda, aqueloutros que expõem envaidecidos suas fotografias, testificando o quanto obtiveram progresso em suas características físicas. Mas, brincadeiras à parte, que mudanças significativas imprimimos em nós nesses dez últimos anos? Somos os mesmos e vivemos como os nossos pais, como afirmava o poeta? Ou saneamos com êxito o pensamento, conquistando maturidade e equilíbrio? Afinal, amadurecemos ou apenas envelhecemos? Diante de tantas expectativas e novidades da vida contemporânea, como entender a velha dicotomia essência versus aparência? As respostas para tais questionamentos são de fundamental importância para que convivamos pacificamente com nós mesmos e saibamos dialogar com os outros que, de forma semelhante ao que sentimos, encontram-se perdidos, tateando as paredes dos corredores da vida, aturdidos a procura de um norte que os conduza, do mesmo modo, ao autoencontro.

Estamos tão acostumados a conviver através das mídias sociais que chegamos a julgar que para estarmos conectados à internet precisamos pertencer a alguma mídia social.  Ao surgir, essas plataformas teriam a função de estabelecer vínculos sociais capazes de promover processos interativos que favorecem o estreitamento de laços e a construção de afetos. Porém, a visão do pensamento de aldeia global aumentou a cobiça de uma indústria cada vez mais voraz, que tratou em disseminar o consumo sem medida através das conexões invisíveis da internet. Com isso, abrimos espaços para o cultivo descontrolado de nossas paixões. Sem as rédeas do equilíbrio e da ponderação a pautar os nossos atos, os hábitos se transformaram em vícios e, em pouco tempo, as redes se converteram num local de competitividade e ostentação. Criamos uma violência silenciosa e sorrateira, que fomenta as desigualdades, ao mesmo tempo em que as encobre através de uma vida de fingimento, onde todos se apresentam felizes e sem problemas sociais. Essa era hi-tec, líquida, se diz libertadora, quando propõe ao indivíduo a possiblidade dele ser ele mesmo, mas também é opressora quando o empurra para uma vida de aparência e ilusão, pautada em modelos de uma felicidade de vitrine.

Não há mal algum em cuidarmos da aparência. O equívoco está em maquiarmos a realidade e transformamos a aparência em mentiras. Com a aparência vemos apenas a superfície dos fatos que nos cercam. Não nos apresentamos como entes, mas sim como personagens de um jogo social e vil, que encena um modelo fatídico de uma vida “perfeita”. Somente através de uma reflexão demorada e paulatina, nos permitiremos saber mais sobre aquilo em que nos tornamos. É natural que durante o processo de autoconhecimento, que se dá de forma continua e durante toda a existência, nos desconheçamos em certos momentos. No jogo da vida sempre utilizaremos máscaras que facilitarão nossos diálogos interpessoais. Mas que não sejam essas máscaras a nossa própria prisão.

No filme ensaio sobre a cegueira, baseado na obra de mesmo título, de José Saramago, percebemos que a visão nos cega, tendo em vista que voltamos toda a nossa atenção para a aparência e nos esquecemos de dedicarmo-nos à essência. Em dez anos podemos fundar uma nova era e se não vivermos cada momento imprimindo-lhe um verdadeiro significado, ao final, perceberemos que sabotamos a ampulheta da vida, matando o tempo e com ele nos matando.

Concluo dizendo que a essência do ser refuta todo e qualquer estado de superficialidade. Assim sendo, nossa essência diz respeito àquilo que somos. Mas o que somos? Isso, caro leitor, só você pode dizer, só você pode buscar. Talvez por esse motivo um sábio na antiguidade, lutando contra a aparência reinante dos modelos opressores de sua época nos disse: “buscai, e achareis; batei, e abrir-se-vos-á; Porque qualquer que pede recebe; e quem busca acha; e a quem bate abrir-se-lhe-á”.

 

Ab imo pectore!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

PROGRESSO - LEI FATAL DO UNIVERSO

    Por Doris Gandres Atualmente, caminhamos todos como que receosos, vacilantes, temendo que o próximo passo nos precipite, como indivíduos e como nação, num precipício escuro e profundo, de onde teremos imensa dificuldade de sair, como tantas vezes já aconteceu no decorrer da história da humanidade... A cada conversação, ou se percebe o medo ou a revolta. E ambos são fortes condutores à rebeldia, a reações impulsivas e intempestivas, em muitas ocasiões e em muitos aspectos, em geral, desastrosas...

"FOGO FÁTUO" E "DUPLO ETÉRICO" - O QUE É ISSO?

  Um amigo indagou-me o que era “fogo fátuo” e “duplo etérico”. Respondi-lhe que uma das opiniões que se defende sobre o “fogo fátuo”, acena para a emanação “ectoplásmica” de um cadáver que, à noite ou no escuro, é visível, pela luminosidade provocada com a queima do fósforo “ectoplásmico” em presença do oxigênio atmosférico. Essa tese tenta demonstrar que um “cadáver” de um animal pode liberar “ectoplasma”. Outra explicação encontramos no dicionarista laico, definindo o “fogo fátuo” como uma fosforescência produzida por emanações de gases dos cadáveres em putrefação[1], ou uma labareda tênue e fugidia produzida pela combustão espontânea do metano e de outros gases inflamáveis que se evola dos pântanos e dos lugares onde se encontram matérias animais em decomposição. Ou, ainda, a inflamação espontânea do gás dos pântanos (fosfina), resultante da decomposição de seres vivos: plantas e animais típicos do ambiente.

OS FANATISMOS QUE NOS RODEIAM E NOS PERSEGUEM E COMO RESISTIR A ELES: FANATISMO, LINGUAGEM E IMAGINAÇÃO.

  Por Marcelo Henrique Uma mensagem importante para os dias atuais, em que se busca impor uma/algumas ideia(s), filosofia(s) ou crença(s), como se todos devessem entender a realidade e o mundo de uma única maneira. O fanatismo. Inclusive é ainda mais perigoso e com efeitos devastadores quando a imposição de crenças alcança os cenários social e político. Corre-se sérios riscos. De ditaduras: religiosas, políticas, conviviais-sociais. *** Foge no tempo e na memória a primeira vez que ouvi a expressão “todos aprendemos uns com os outros”. Pode ter sido em alguma conversa familiar, naquelas lições que mães ou pais nos legam em conversas “descompromissadas”, entre garfadas ou ações corriqueiras no lar. Ou, então, entre algumas aulas enfadonhas, com a “decoreba” de fórmulas ou conceitos, em que um Mestre se destacava como ouro em meio a bijuterias.

REENCARNAÇÃO E O MUNDO DE REGENERAÇÃO

“Não te maravilhes de eu te dizer: É-vos necessário nascer de novo.” (Jesus, Jo:3:7) Por Jorge Luiz (*)             As evidências científicas alcançadas nas últimas décadas, no que diz respeito à reencarnação, já são suficientes para atestá-la como lei natural. O dogmatismo de cientistas materialistas vem sendo o grande óbice para a validação desse paradigma.             Indubitavelmente, o mundo de regeneração, como didaticamente classificou Allan Kardec o estágio para as transformações esperadas na Terra, exigirá novas crenças e valores para a Humanidade, radicalmente diferenciada das existentes e que somente a reencarnação poderá ofertar, em face da explosiva diversidade e complexidade da sociedade do mundo inteiro.             O professor, filósofo, jornalista, escritor espírita, J. Herc...

A PROPÓSITO DO PERISPÍRITO

1. A alma só tem um corpo, e sem órgãos Há, no corpo físico, diversas formas de compactação da matéria: líquida, gasosa, gelatinosa, sólida. Mas disso se conclui que haja corpo ósseo, corpo sanguíneo? Existem partes de um todo; este, sim, o corpo. Por idêntica razão, Kardec se reportou tão só ao “perispírito, substância semimaterial que serve de primeiro envoltório ao espírito”, [1] o qual, porque “possui certas propriedades da matéria, se une molécula por molécula com o corpo”, [2] a ponto de ser o próprio espírito, no curso de sua evolução, que “modela”, “aperfeiçoa”, “desenvolve”, “completa” e “talha” o corpo humano.[3] O conceito kardeciano da semimaterialidade traz em si, pois, o vislumbre da coexistência de formas distintas de compactação fluídica no corpo espiritual. A porção mais densa do perispírito viabiliza sua união intramolecular com a matéria e sofre mais de perto a compressão imposta pela carne. A porção menos grosseira conserva mais flexibilidade e, d...

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia: