sábado, 8 de julho de 2017

CRÔNICAS DO COTIDIANO: LUZ E SOMBRA



  
Um estuprador pode ser um homem bom?

Pois foi o que disse um juiz americano do estado norte-americano de Utah, ao condenar o antigo bispo da Igreja de Jesus Cristo dos Últimos Dias, réu pelo crime de estupro e 10 delitos de abuso sexual, contendo as lágrimas, sentenciou: “A corte não tem nenhuma dúvida de que o senhor Vallejo é um homem extraordinariamente bom.” “Mas às vezes os homens bons fazem coisas ruins”.(leia mais) O mais surpreendente é que uma das vítimas estava presente no julgamento. O bispo foi condenado a 15 anos de prisão pelos delitos de abuso sexual, e a cinco anos pelo estupro. Atente-se que não é a primeira vez que o juiz foi generoso com o réu, quando do oferecimento da denúncia ele deixou o acusado em liberdade e não exigiu o pagamento de fiança.

É óbvio que foi impactante para a vítima de estupro presente, bem como todos presentes. Não muito diferente para aqueles que tiveram acesso à notícia. E aqui, não se vai analisar as consequências dos atos praticados pelo senhor Vallejo, mas especificamente a atitude do magistrado ao proferir a sentença.
O comportamento do magistrado é perfeitamente compreensível, embora reprovável no contexto em que se insere, quando se parte da advertência crística, exarada no evangelho de no episódio da mulher adúltera, quando ele responde acerca do apedrejamento: “Se algum de vocês estiver sem pecado, seja o primeiro a atirar pedra nela”. (João, 8:1-11). Jesus se dirigiu às várias personalidades; uma diversidade de virtudes e defeitos.
O Espiritismo também vem em socorro ao magistrado. O Espírito Clélia Duplantier, em mensagem inserta em Obras Póstumas, atesta três caracteres em todo homem:

“ o do indivíduo do ser em si mesmo; o de membro da família e, finalmente, o de cidadão. Sob cada uma dessas três faces pode ser ele criminoso e virtuoso, isto é, pode ser virtuoso como pai de família, ao mesmo tempo em que criminoso como cidadão e reciprocamente. Daí as situações especiais que pra si cria nas suas sucessivas existências.”

O próprio Allan Kardec no comentário a respeito da mensagem entende-a como novidade e de grande importância, por promover o entendimento da distinção entre as faltas individuais ou coletivas, das da vida privada e da vida pública, esclarecendo a solidariedade existente entre os seres e entre as gerações. Dessa forma, compreende-se que as virtudes da vida familiar são diferentes das da vida pública. Paradoxo que somente o Espiritismo através do dogma da reencarnação explica, assinalando o caráter distintivo dos povos e das raças.
Tutelando os indivíduos o Espiritismo vai renovando a massa através dos melhoramentos individuais, muito embora esses conservem o matiz primário até que o progresso moral os haja completamente transformado.
O magistrado utilizou-se das ferramentas de gestão denominadas Área de Incoerência e Área de Realização, que são muito bem representadas pela metáfora do lenço branco e o ponto negro no seu centro. Quando submetido à análise dos alunos pelo professor, todos foram unânimes em apontar o ponto negro, em detrimento da maior área branca do lençol. A Área de Incoerência é o ponto negro e a Área de Realização é o restante do lençol branco. A Área de Realização dos indivíduos é bem maior que a de Incoerência. A ferramenta não é diferente da assertiva de Jesus no Evangelho de Mateus, 7:5: “Hipócrita! Tira primeiro a trave do teu olho, e então poderás ver com clareza para tirar o cisco do olho de teu irmão.”
Carl G. Jung (1875-1961), psiquiatra e psicoterapeuta suíço a esse respeito afirmou: “até onde conseguimos discernir, o único propósito da existência humana é acender uma luz na escuridão da mera existência.”
É bem provável que o magistrado conhecesse bem o Sr. Vallejo, no contexto da sua vida familiar para adotar uma postura da espécie.
Ainda se permite analisar a questão das escolhas das provas do Espírito a encarnar, como está descrito no capítulo V, Livro II, de O Livro dos Espíritos. Pela premissa do livre-arbítrio que o Espírito goza, ele escolhe o gênero de provas que deseja sofrer. Fica sempre evidente que ao encarnar essa liberdade de escolhas lhe autentica toda a responsabilidade dos seus atos e das consequências, considerando que nada lhe estorva o futuro; o caminho do bem está à sua frente, assim como do mal. No contexto das suas escolhas, o Espírito pode escolher prova que esteja acima de suas forças, e então sucumbe. São exemplos como o do Sr. Vallejo, didaticamente explicados pelo Espírito Clélia Duplantier.
Tudo se resume, contudo, naquilo que o Apóstolo Paulo fala em sua Epístola aos Romanos, 7:19: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço.”
Jesus é enfático no tocante a luz e a sombra da personalidade humana. Em Mateus, 5:14-16 ele adverte: “Vos sois a luz do mundo. (...)Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.” Ao ensinar a oração-modelo – Pai Nosso – ele relaciona o combate a sombra é desejo do Pai, ao conclui-la da seguinte forma: “Não nos deixei cair em tentação, mas livra-nos do mal.”

Referências
A BÍBLIA Sagrada: Antigo e Novo Testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Brasília: Sociedade Bíblica do Brasil, 1969.

JUNG, Carl G. Memórias, sonhos e reflexões. Rio de Janeiro – Nova Fronteira. 1962.

KARDEC, Allan. Obras póstumas. São Paulo: FEB, 2003.

__________. O livro dos espíritos. São Paulo: LAKE, 2004.




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