Pular para o conteúdo principal

O PERSONALISMO: "ESPELHO, ESPELHO MEU..."




“O maior entre vós será vosso servo.”
Jesus (Mt 23:11)




Dicas importantes para se tornar uma pessoa pior: primeiro passo: você é a pessoa mais importante neste mundo; segundo passo: 1º lugar, Eu; 2º lugar, Eu.... 7º lugar, Eu; terceiro passo: em algum lugar no final desta lista vem o outro; quarto passo: o outro não tem poder sobre mim, logo, eu não preciso me comportar como os outros pensam ou falam de mim. Estas dicas fazem parte do monólogo “Como se tornar uma pessoa pior”, em cartaz em São Paulo, estrelado pela atriz Lulu Pavarin. Segundo Pavarin, ao término de um dos espetáculos para mais de setecentas pessoas, foi procurada pelos expectadores que demostraram o seu alívio por se autoreconhecerem: “nossa, estou me sentindo tão bem, eu sou uma pessoa pior!” Isto reflete o individualismo que marca a nossa sociedade.

Sem querer entrar no mérito da proposta do monólogo, não tenho dúvida em afirmar que os passos caracterizam o indivíduo personalista. 

O personalismo é estudado na dimensão humana de duas maneiras, eminentementes paradoxais. Como doutrina filosófica, contempla a personalidade humana como o valor fundamental da sociedade, tendo como seu fundador o filósofo francês Emmanuel Mounier (1905-1950), cujas obras influenciaram o surgimento da “Democracia Cristã.” O personalismo de Mounier se opõe ao individualismo. Enquanto este mantem o homem centrado em si mesmo, a maior preocupação do personalismo Mounieriano é descentrá-lo para colocá-lo voltado para o Mundo e para as outras pessoas.

Em sua outra dimensão, como na peça, “diz-se de/ou indivíduo egocêntrico.” Ou seja, qualidade daquele que tem o foco voltado para si mesmo, mostrando-se indiferente para com os outros. Portanto, o indivíduo enxerga-se onipotente e onisciente. O Espírito Bezerra de Menezes o define como “personalismo deprimente”, termo que utilizarei daqui pra frente.

Observa-se que o marco divisor entre ambos é o egoísmo, em sua expressão mórbida.

O personalismo deprimente e o melindre são siameses, filhos diletos do orgulho.

É preciso entender que não vivemos imunes ao personalismo uma vez que ele é fator psíquico para a construção da nossa identidade como pessoa na relação com o mundo e com os que nos relacionamos. Incensado e exacerbado pelo egoísmo, pela perda do controle que ocorre, torna-se um vício; um vício do amor próprio.

O personalismo deprimente na convivência grupal, aqui se incluem as Instituições espíritas, é extremamente destrutivo e desagregador. Ele dissemina em um grupo que seus membros desempenhem, teoricamente, apenas duas funções estanques: liderança e participação. Na prática, isto não ocorre.

É natural, no entanto, compreender que algumas funções são mais genéricas que outras e distintas das do líder. No entanto, isto não invalida que outros membros não possam exercer, informalmente, a liderança em diferentes situações para que o grupo possa mover-se e progredir frente aos propósitos em que se situa.

Em um cenário mundial de efervescente progresso em todas as áreas do conhecimento humano, é estupidez descabida entender que em vivência comunitária um membro seja o repositório de ideias e conhecimentos suficientes para toda a dinâmica de uma constelação de seres pensantes; Espíritos milenares.

A Doutrina Espírita é uma proposta redentora de libertação de consciências. O Homem Kardeciano está ligado a finalidades que ultrapassam as questões aparentes do quotidiano. Assim, para que o espírita viva essa liberdade genuína ele deve necessariamente descobrir a “si mesmo” – questão 919 de “O Livro dos Espíritos” -, tarefa inadiável e que só compete ao próprio Ser pela singularidade atribuída à sua personalidade. Esta singularidade valoriza sobremaneira a convivência comunitária, ao invés de negá-la.

É fácil de perceber que a postura personalista deprimente fere em todos os aspectos os postulados espíritas-cristãos, pois contraria ao ensinamento do Cristo de “amar ao próximo como a si mesmo.”

            Algumas dicas para vencer o personalismo deprimente:

a.    aprender a ouvir;
b.    utilize, sempre que possível, o brainstorming (tempestade de ideias);
c.      mobilize a equipe em torno das ideias apresentadas;
d.  renuncie ao modelo mental conduzido pelo pensamento linear-binário, que é polarizado no “ou/ou”; ou está comigo ou contra mim;
e. exercite o modelo mental conduzido pelo pensamento complexo, aprendendo a religar saberes separados e dispersos;
f.       pedir desculpas quando errar;
g.     ser simples;
h.  ter como única expectativa nas participações individuais o desejo de aprender a ser útil;
i.       estimule o dar e receber feedback;
j.     procure exercer o poder pessoal, que não é o poder inebriante sobre os outros. O poder pessoal é uma força criada entre as pessoas; é uma união espiritual;

Não deixa de ser um bom começo!

Ou então, refletindo sobre Allan Kardec, em a Revista Espírita, março de 1863, no artigo Falsos Irmãos e Amigos Inábeis:

“Crer em sua própria infalibilidade, recusar o conselho da maioria e persistir num caminho que se demonstra mau e comprometedor, não é atitude de um verdadeiro espírita. Seria a prova de orgulho, se não de obsessão.”

            ... e o espelho respondeu: existe sim; O OUTRO!

Comentários

  1. Ligiane Neves - Casa do Caminho de Aquiraz2 de maio de 2013 às 20:20

    Maravilhoso material para reflexão de muitos, espero!
    Concluimos, com isso que, o movimento espírita tem em sua maioria "personalistas deprimentes", postura claramente percebida. Quanto mais se fortelece esse personalismo sem valor humano, mais a nossa doutrina espírita vai sendo descaraterizada.
    Desejo que determinadas pessoas se olhem no espelho e procurem não mais ver a própria imagem, mas sim, a do próximo!
    Belo trabalho, Jorge!
    Muita luz e inspiração para seus trabalhos, sempre!

    ResponderExcluir
  2. Copiado para compartilhar com os amigos!
    Parabéns!!!

    ResponderExcluir
  3. Adorei...muito ....abraços....

    ResponderExcluir
  4. Muito bom, amigo! Gostei demais desse texto! Abraços!

    ResponderExcluir
  5. Estou estudando o tema para um encontro com dirigentes e responsáveis e o artigo eu o descobri no momento exato. Obrigado Jorge Luiz pela sua colaboração. abraço.

    ResponderExcluir
  6. Olá, Waldehir,
    Que legal! Ficamos felizes com o comentário.
    Abraços

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

ANÁLISE DA FIGUEIRA ESTÉRIL E O ESTUDO DA RELIGIÃO

                 Por Jorge Luiz            O Estudo da Religião e a Contribuição de Rudolf Otto O interesse pela história das religiões   remonta a um passado muito distante e a ciência das religiões, como disciplina autônoma, só teve início no século XIX. Dentre os trabalhos mais robustos sobre a temática, notabiliza-se o de Émile Durkheim, As Formas Elementares da Via Religiosa.             Outro trabalhos que causou repercussão mundial foi o de Rudolf Otto, eminente teólogo luterano alemão, filósofo e erudito em religiões comparadas. Otto optou por ser original e abdicou de estudar as ideias sobre Deus e religião e aplicou suas análises das modalidades da experiência religiosa. Ao fazer isso, Otto conseguiu esclarecer o conteúdo e o caráter específico dessa experiência e negligenciou o lado racional e especulativo da religião, sempre...

O MEDO SOB A ÓTICA ESPÍRITA

  Imagens da internet Por Marcelo Henrique Por que o Espiritismo destrói o medo em nós? Quem de nós já não sentiu ou sente medo (ou medos)? Medo do escuro; dos mortos; de aranhas ou cobras; de lugares fechados… De perder; de lutar; de chorar; de perder quem se ama… De empobrecer; de não ser amado… De dentista; de sentir dor… Da violência; de ser vítima de crimes… Do vestibular; das provas escolares; de novas oportunidades de trabalho ou emprego…

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

UM POUCO DE CHICO XAVIER POR SUELY CALDAS SCHUBERT - PARTE II

  6. Sobre o livro Testemunhos de Chico Xavier, quando e como a senhora contou para ele do que estava escrevendo sobre as cartas?   Quando em 1980, eu lancei o meu livro Obsessão/Desobsessão, pela FEB, o presidente era Francisco Thiesen, e nós ficamos muito amigos. Como a FEB aprovou o meu primeiro livro, Thiesen teve a ideia de me convidar para escrever os comentários da correspondência do Chico. O Thiesen me convidou para ir à FEB para me apresentar uma proposta. Era uma pequena reunião, na qual estavam presentes, além dele, o Juvanir de Souza e o Zeus Wantuil. Fiquei ciente que me convidavam para escrever um livro com os comentários da correspondência entre Chico Xavier e o então presidente da FEB, Wantuil de Freitas 5, desencarnado há bem tempo, pai do Zeus Wantuil, que ali estava presente. Zeus, cuidadosamente, catalogou aquelas cartas e conseguiu fazer delas um conjunto bem completo no formato de uma apostila, que, então, me entregaram.

TRÍPLICE ASPECTO: "O TRIÂNGULO DE EMMANUEL"

                Um dos primeiros conceitos que o profitente à fé espírita aprende é o tríplice aspecto do Espiritismo – ciência, filosofia e religião.             Esse conceito não se irá encontrar em nenhuma obra da codificação espírita. O conceito, na realidade, foi ditado pelo Espírito Emannuel, psicografia de Francisco C. Xavier e está na obra Fonte de Paz, em uma mensagem intitulada Sublime Triângulo, que assim se inicia:

SOBRE ATALHOS E O CAMINHO NA CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO JUSTO E FELIZ... (1)

  NOVA ARTICULISTA: Klycia Fontenele, é professora de jornalismo, escritora e integrante do Coletivo Girassóis, Fortaleza (CE) “Você me pergunta/aonde eu quero chegar/se há tantos caminhos na vida/e pouca esperança no ar/e até a gaivota que voa/já tem seu caminho no ar...”[Caminhos, Raul Seixas]   Quem vive relativamente tranquilo, mas tem o mínimo de sensibilidade, e olha o mundo ao redor para além do seu cercado se compadece diante das profundas desigualdades sociais que maltratam a alma e a carne de muita gente. E, se porventura, também tenha empatia, deseja no íntimo, e até imagina, uma sociedade que destrua a miséria e qualquer outra forma de opressão que macule nossa vida coletiva. Deseja, sonha e tenta construir esta transformação social que revolucionaria o mundo; que revolucionará o mundo!

DIA DE FINADOS À LUZ DO ESPIRITISMO

  Por Doris Gandres Em português, de acordo com a definição em dicionário, finados significa que findou, acabou, faleceu. Entretanto, nós espíritas temos um outro entendimento a respeito dessa situação, cultuada há tanto tempo por diversos segmentos sociais e religiosos. Na Revista Espírita de dezembro de 1868 (1) , sob o título Sessão Anual Comemorativa dos Mortos, na Sociedade Espírita de Paris fundada por Kardec, o mestre espírita nos fala que “estamos reunidos, neste dia consagrado pelo uso à comemoração dos mortos, para dar aos nossos irmãos que deixaram a terra, um testemunho particular de simpatia; para continuar as relações de afeição e fraternidade que existiam entre eles e nós em vida, e para chamar sobre eles as bondades do Todo Poderoso.”

EDUCAÇÃO ESPÍRITA ¹

Por Francisco Cajazeiras (*) Francisco Cajazeiras – Quais as relações existentes entre Educação e o Espiritismo? Dora Incontri – Muitas. Primeiro porque Kardec era um educador. Antes de se dedicar ao Espiritismo, à pesquisa das mesas girantes, depois à codificação da Doutrina Espírita, durante trinta anos, na França, exerceu a função de educador. Foi discípulo de um dos maiores educadores de todos os tempos que foi Pestalozzi. Então o Espiritismo segue uma tradição pedagógica. E o Espiritismo, ele próprio, é uma proposta pedagógica do Espírito. O Espiritismo não é uma proposta salvacionista, ele é uma proposta que pretende que o homem assuma a sua autoeducação como aperfeiçoamento espiritual. Francisco Cajazeiras – Então quer dizer que existe uma educação espírita e uma pedagogia espírita? Dora Incontri – Existe. Existe porque toda filosofia, toda concepção de homem, de mundo, toda cosmovisão desemboca, necessariamente, numa prática pedagógica...