Pular para o conteúdo principal

O PERFECCIONISMO CARINHOSO






“Agradeço: Ao todo que somos nós! À união, ao perfeccionismo carinhoso de cada um dessa equipe (família) maravilhosa! (Maria Gadú) (*)





            Ouvi recentemente em emissora de rádio local entrevista de musicólogo cearense que analisava o cenário musical na contemporaneidade. Na entrevista ele relatou fato muito interessante ocorrido com um amigo, também musicólogo, presente em apresentação de gala no exterior. A apresentação fora brilhante motivando-o a indagar a um monge ao seu lado se havia gostado da apresentação. O monge respondeu que sim, mas gostara realmente do momento da afinação dos instrumentos pelos músicos.
            O momento do afinar o instrumento é solitário para o musicista. Ele busca a perfeição na sonoridade. Acredito que todo musico é perfeccionista ao afinar o seu instrumento. No entanto, em poucos minutos esse perfeccionismo dilui-se pela harmonia que compõe o Ser coletivo: a orquestra ou o grupo. Todos passam ao anonimato. Não mais o violonista, o saxofonista, o clarinetista etc. Esse tipo de perfeccionismo é considerado por alguns estudiosos do comportamento humano como “normal”
            Já há outros que consideram o perfeccionismo como distúrbio neurótico, transtorno da personalidade. Nesse caso, apresenta nuanças que vão desde a pouca autoestima e confiança, com reações terríveis ao erro, bem como o não confiar nas habilidades e potencialidades do restante do grupo de trabalho, exigindo deles um perfeccionismo cobrado de si mesmo.
          Acredito que há uma equivalência vetorial entre esta variável de perfeccionismo e o personalismo que se constata nas relações interpessoais em ambientes grupais, principalmente de natureza religiosa. O personalismo propõe uma visão egocêntrica da vida e exacerbada de si mesmo. O personalista não se permite enriquecer com as diferenças. O Espírito Bezerra de Menezes designa-o de personalismo deprimente.

            Deriva do latim persona, máscara do ator ou personagem teatral. É a valorização de si mesmo, podendo tomar as mais variadas forma de máscaras: vaidade, tirania, vileza, leviandade etc. O personalista é insensível às opiniões alheias.
     Como, de fato, um homem bastante fútil para crer na importância da sua personalidade e na supremacia de suas qualidades, poderia ter, ao mesmo tempo, bastante abnegação para ressaltar nos outros o bem que poderia eclipsá-lo, em lugar do mal que poderia pô-lo em destaque? Assim comenta Allan Kardec em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, X:10.
            O personalismo cria obstáculos intransponíveis nas relações interpessoais dificultando a redenção espiritual e o progresso dos integrantes do grupo.
            O “perfeccionismo carinhoso” exaltado no agradecimento de Maria Gadú à sua equipe (família) é o mesmo percebido pelo monge e, surge das emoções mais sutis da alma, que eleva; é metafísico. Como epifenômeno da alma, logo também o “perfeccionismo carinhoso” é Estético, pois se relaciona com o Belo, pela produção e percepção de fenômenos estéticos. Por isso para perceber e vivê-lo, há a necessidade de sensibilidade.
            A sensibilidade consiste na capacidade de perceber como os outros pensam, sentem e tendem a agir, concomitantemente à própria atuação. Somente permitindo a participação plena dos membros de um grupo é que eles passarão a sentir de modo diferente, e não pensar só de modo diferente, e desenvolverão a sua sensibilidade social, pela própria condição de seres sociais que somos, conforme esclarece “O Livro dos Espíritos”, em a Lei de Sociedade.
             A sensibilidade é o entender, mais pelo sentir que pela razão. Ela está viva no “ouvido educado” à sonoridade harmônica do Monge e de Maria Gadú.
           O “perfeccionismo carinhoso” relaciona-se com o humanizar, vértice direito - espiritizar e qualificar, os outros vértices - do triângulo equilátero estabelecido pelo Espírito Joana de Ângelis para o desenvolvimento do movimento espírita brasileiro.           
            O “perfeccionismo carinhoso” é ecológico, quando reconhecido e valorizado na Casa Espírita destrói o personalismo que desfalece todos os esforços de união e unificação entre os espíritas, como bem atesta Francisco Cândico Xavier: “Não entendo unificação sem união... A unificação espírita no Brasil tem esbarrado no personalismo daqueles que se dispõem a promovê-la.”
         O Centro Espírita, portanto, é um laboratório de sensibilidade. Nele é que iremos adquirir a capacidade de percepção e formas mais adequadas de reações em situações interpessoais, ao desenvolvimento de maior flexibilidade de comportamento necessária à vida e à convivência grupal. Há o aprendizado com os erros e acertos.
            A sensibilidade que necessitamos desenvolver nos núcleos espíritas para que eles se tornem laboratórios de sensibilidade está estruturada na recomendação do Mestre Galileu quando diz que: “Bem-aventurados os vossos olhos, porque veem, e os vossos ouvidos, porque ouvem.” (Mt, 13:16)   É o ouvir e ver não pela razão, mas pelo coração. É ouvir e ver o próximo de forma integral, despojando-nos de crenças, preconceitos e idiossincrasias.
            Desenvolver o “perfeccionismo carinhoso” é tarefa do cotidiano, principalmente dos integrantes de grupo espírita, indistintamente.

(*) extraído da contracapa do seu mais recente álbum “Mais Uma Página.” A frase inspiradora foi enviada por nossa seguidora Luciana Pinheiro.

Comentários

  1. Necessitamos de um bom tempo para chegar a este ponto climax. Desenvolver o “perfeccionismo carinhoso” é tarefa do cotidiano, principalmente dos integrantes de grupo espírita, indistintamente.
    Vamos ao trabalho, agradecendo ao nosso amigo Jorge por nos chamarmos a tarefa.
    Helane

    ResponderExcluir
  2. Ligiane Neves - Casa do Caminho de Aquiraz4 de outubro de 2012 às 21:34

    Excelente material, parabéns mais uma vez!
    Sim, é verdade, o perfeccionismo carinhoso, bem definido no texto, só se torna possível quando se abre mão do personalismo, caracteristica muito comum e forte no movimenta espírita.
    Forte abraço Jorge, muito te agradecemos por esse trabalho.
    Luz e inspiração sempre para vc e todos que integram o Canteiro de Ideias!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ligiane Neves, concordo com você quando diz "Sim, é verdade, o perfeccionismo carinhoso, bem definido no texto, só se torna possível quando se abre mão do personalismo, caracteristica muito comum e forte no movimenta espírita.", e até estenderia suas palavras dando um sentido mais amplo que seria mais ou menos assim - onde há pessoas há personalismo, na doutrina espírita, nos nossos trabalhos, em casa etc.

      Acredito, que o personalismo está ligado ao egoísmo ou ao orgulho... nós todos ainda carregamos estas duas chagas.

      Porém, nós podemos pensar em Chico Xavier e relembrar os seus exemplos de amor ao próximo totalmente desprendido do egoísmo, sendo depois de Jesus e entre tantos a expressão do carinho ao próximo sem personalismo.

      Sociedade Espírita a Caminho da Luz - Beberibe

      Excluir
  3. A sensibilidade consiste na capacidade de perceber como os outros pensam, sentem e tendem a agir.Porém no campo da vida,onde mais atuamos e representamos,nos esquecemos deste real e importante ,o sentir.Com isso poderíamos avançar em direção a seres humanos melhores.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

09.10 - O AUTO-DE-FÉ E A REENCARNAÇÃO DO BISPO DE BARCELONA¹ (REPOSTAGEM)

            Por Jorge Luiz     “Espíritas de todos os países! Não esqueçais esta data: 9 de outubro de 1861; será marcada nos fastos do Espiritismo. Que ela seja para vós um dia de festa, e não de luto, porque é a garantia de vosso próximo triunfo!”  (Allan Kardec)                    Cento e sessenta e quatro anos passados do Auto-de-Fé de Barcelona, um dos últimos atos do Santo Ofício, na Espanha.             O episódio culminou com a apreensão e queima de 300 volumes e brochuras sobre o Espiritismo - enviados por Allan Kardec ao livreiro Maurice Lachâtre - por ordem do bispo de Barcelona, D. Antonio Parlau y Termens, que assim sentenciou: “A Igreja católica é universal, e os livros, sendo contrários à fé católica, o governo não pode consentir que eles vão perverter a moral e a religião de outr...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

A CULPA É DA JUVENTUDE?

    Por Ana Cláudia Laurindo Para os jovens deste tempo as expectativas de sucesso individual são consideradas remotas, mas não são para todos os jovens. A camada privilegiada segue assessorada por benefícios familiares, de nome, de casta, de herança política mantenedora de antigos ricos e geradora de novos ricos, no Brasil.

ÚLTIMAS INSTRUÇÕES DE ALLAN KARDEC AOS ESPÍRITAS(*)

“Caro e venerado   Mestre, estais aqui presente, conquanto invisível para nós. Desde a vossa partida tendes sido para todos um protetor a mais, uma luz segura, e as falanges do espaço foram acrescidas de um trabalhador infatigável.” (Trecho do discurso de abertura da Sessão Anual Comemorativa aos Mortos de novembro 1869 – Revista Espírita – dez/1869)   Por Jorge Luiz   O discurso de Allan Kardec, proferido na sessão anual da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas - SPEE, comemorativa aos mortos, em 1º de novembro de 1868, "O Espiritismo é uma Religião?" (leia aqui) - Revista Espírita, novembro de 1868 - contêm 3.881 palavras. Nele, Kardec discorre sobre a comunhão de pensamentos, as dimensões da caridade, o verdadeiro sentido de religião e sobre a crença espírita. Foi seu último discurso, pois cinco meses depois ocorre a sua desencarnação. Soa, portanto, como as últimas instruções aos espíritas, da mesma forma que Jesus as realizou aos...

O MOVIMENTO ESPÍRITA MUNDIAL É HOJE MAIS AMPLO E COMPLEXO, MAS NÃO É UM MUNDO CAÓTICO DE UMA DOUTRINA DESPEDAÇADA*

    Por Wilson Garcia Vivemos, sem dúvida, a fase do aperfeiçoamento do Espiritismo. Após sua aurora no século XIX e do esforço de sistematização realizado por Allan Kardec, coube às gerações seguintes não apenas preservar a herança recebida, mas também ampliá-la, revendo equívocos e incorporando novos horizontes de reflexão. Nosso tempo é marcado pela aceleração do conhecimento humano e pela expansão dos meios de comunicação. Nesse cenário, o Espiritismo encontra uma dupla tarefa: de um lado, retornar às fontes genuínas do pensamento kardequiano, revendo interpretações imprecisas e sedimentações religiosas que se afastaram de seu caráter filosófico-científico; de outro, abrir-se à interlocução com as descobertas contemporâneas da ciência e com os debates atuais da filosofia e da espiritualidade, como o fez com as fontes que geraram as obras clássicas do espiritismo, no pós-Kardec.

PRÓXIMOS E DISTANTES

  Por Marcelo Henrique     Pense no trabalho que você realiza na Instituição Espírita com a qual mantém laços de afinidade. Recorde todos aqueles momentos em que, desinteressadamente, você deixou seus afazeres particulares, para realizar algo em prol dos outros – e, consequentemente, para si mesmo. Compute todas aquelas horas que você privou seus familiares e amigos mais diletos da convivência com você, por causa desta ou daquela atividade no Centro. Ainda assim, rememore quantas vezes você deixou seu bairro, sua cidade, e até seu estado ou país, para realizar alguma atividade espírita, a bem do ideal que abraçaste... Pois bem, foram vários os momentos de serviço, na messe do Senhor, não é mesmo? Quanta alegria experimentada, quanta gente nova que você conheceu, quantos “amigos” você cativou, não é assim?

JESUS E A QUESTÃO SOCIAL

              Por Jorge Luiz                       A Pobreza como Questão Social Para Hanna Arendt, filósofa alemã, uma das mais influentes do século XXI, aquilo que se convencionou chamar no século XVII de questão social, é um eufemismo para aquilo que seria mais fácil e compreensível se denominar de pobreza. A pobreza, para ela, é mais do que privação, é um estado de carência constante e miséria aguda cuja ignomínia consiste em sua força desumanizadora; a pobreza é sórdida porque coloca os homens sob o ditame absoluto de seus corpos, isto é, sob o ditame absoluto da necessidade que todos os homens conhecem pela mais íntima experiência e fora de qualquer especulação (Arendt, 1963).              A pobreza é uma das principais contradições do capitalismo e tem a sua origem na exploração do trabalho e na acumulação do capital.

ESPIRITISMO NÃO É UM ATO DE FÉ

  Por Ana Cláudia Laurindo Amar o Espiritismo é desafiador como qualquer outro tipo de relação amorosa estabelecida sobre a gama de objetividades e subjetividades que nos mantém coesos e razoáveis, em uma manifestação corpórea que não traduz apenas matéria. Laica estou agora, em primeira pessoa afirmando viver a melhor hora dessa história contemporânea nos meandros do livre pensamento, sem mendigar qualquer validação, por não necessitar de fato dela.

DEMOCRACIA SEM ORIENTAÇÃO CRISTÃ?

  Por Orson P. Carrara Afirma o nobre Emmanuel em seu livro Sentinelas da luz (psicografia de Chico Xavier e edição conjunta CEU/ FEB), no capítulo 8 – Nas convulsões do século XX, que democracia sem orientação cristã não pode conduzir-nos à concórdia desejada. Grifos são meus, face à atualidade da afirmação. Há que se ressaltar que o livro tem Prefácio de 1990, poucas décadas após a Segunda Guerra e, como pode identificar o leitor, refere-se ao século passado, mas a atualidade do texto impressiona, face a uma realidade que se repete. O livro reúne uma seleção de mensagens, a maioria de Emmanuel.