Pular para o conteúdo principal

BREVE DIÁLOGO SOBRE KARDEC COM ELIAS MORAES

 


Bendito seja sempre o semear das boas sementes! Assim o falo de livros, pensamentos e poesia. Verdades que despontam na diversidade de galhos e alimentam os sentidos de muitas vidas; eis a relação entabulada com o conhecimento e seu desfecho libertador.

Com este preâmbulo sobre paixões e descobertas valiosas, abro o dialogo breve e suave com trechos da obra recentemente publicada por Elias Inácio de Moraes em sua proposta ousada de contextualizar Kardec a partir de caminhos científicos, históricos, culturais e políticos, sem perder a ligação com a espiritualidade.

Ele acredita que “cabe aos pesquisadores e aos estudiosos do Espiritismo da atualidade o desafio de construir as respostas que o mundo atual requer, com base nos pilares erguidos por Allan Kardec e pelos espíritos que colaboraram para a sua estruturação no passado, mas com a mente voltada para os desafios da complexa sociedade do presente”. (p. 25) E tal abordagem pode empolgar ousados livres pensadores que caminham nestas escarpas que se transformou ser espírita no Brasil neste século XXI.

Sim, seremos cada um de nós os que impulsionarão o avanço do pensamento sobre a vida, a morte, a reencarnação e a evolução espiritual, na medida que consigamos debulhar as contas do rosário católico que nos encantou aos pés dos rituais considerados de fé, e assumirmos com cuidado e respeito sincero um caráter mais político e autônomo na relação com o sagrado.

Sem nenhuma pretensão de chegar ao núcleo da obra de Moraes: “Contextualizando Kardec – do século XIX ao XXI”, trago alguns encontros de impacto agradável, principalmente por concordar com muitas partes do que nos traz, e confessar que acrescentam valor e sentido às minhas próprias pesquisas sobre a evolução política dos espíritos.

Reconhecer que o Espiritismo não responde a tudo sozinho nem envolve a todos em perspectivas, mas nada perde do que é em si por causa disso nos desliga de inúteis investidas do ego, ao passo que instiga o uso do raciocínio com mais destemor. Moraes afirma que “sem negar, portanto as conclusões da ciência, a grande contribuição do Espiritismo para a sociedade é possibilitar ao ser humano entrever a sua realidade espiritual e a continuidade da sua existência para além da morte, com as inúmeras consequências éticas e morais daí advindas”. (p.46)

Insistir no caráter político do desenvolvimento espiritual, no contraponto da supremacia do entendimento religioso não tem sido uma opinião mas uma descoberta que se afirma a cada experiência vivida, sentida, analisada, exaustivamente estudada à luz da moral (sem moralismo) e ética humanitária.

Convicções políticas englobam em trançados de micorrizas ideológicas as próprias religiões, e derrubar tabus é caminho de sabedoria ensinado por inúmeros avatares que deixaram marcas neste planeta.

No encalço das buscas reveladas, enquanto pesquisadora e escritora espírita, concordo com Moraes quando este afirma:

“O maior equívoco que podemos cometer ao estudar a obra kardequiana é buscar nela uma verdade estática, pronta, acabada, no estilo da verdade absoluta e atemporal da filosofia de Platão. Por mais que esse conceito fosse ainda vigente na época de Kardec, ele mesmo já entrevia para o Espiritismo uma verdade dinâmica, em constante atualização.” (p.85)

Sendo verdade conciliadora aquela que afirma que cada olhar tem seu alcance e análise a partir de um ângulo ou mais, recomendo a leitura da obra de Moraes para quem se interessa nos estudos espíritas, e está disposto a exercitar a crítica e ser criticado em suas próprias convicções.  Mais uma vez a obra fala em afinidade com nosso propósito quando expõe a crescente necessidade de leituras e debates. “Daí a importância da continuidade dos estudos e das pesquisas em torno dos temas que possam interessar e uma compreensão mais ampla da realidade espiritual e de suas consequências sobre a vida prática dos seres humanos em sociedade.” (p.138)

Reconhecendo que nenhum de nós está completo em descobertas e ainda podemos ter armazenamento mental para inúmeras metamorfoses no pensar, consideremos que “encarnados e desencarnados, a maioria de nós acha-se limitada dentro de um mesmo horizonte espaço-temporal, e podemos estar ainda presos a concepções que já foram ou estão sendo superadas neste exato momento”. (p.139)

Por estas vias vai ficando a dica e o ensejo.

 

 

 

Fonte bibliográfica:

MORAES, E. Inácio de. Contextualizando Kardec: do século XIX ao XXI. Goiânia: Aephus, 2020.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PESTALOZZI E KARDEC - QUEM É MESTRE DE QUEM?¹

Por Dora Incontri (*) A relação de Pestalozzi com seu discípulo Rivail não está documentada, provavelmente por mais uma das conspirações do silêncio que pesquisadores e historiadores impõem aos praticantes da heresia espírita ou espiritualista. Digo isto, porque há 13 volumes de cartas de Pestalozzi a amigos, familiares, discípulos, reis, aristocratas, intelectuais da Europa inteira. Há um 14º volume, recentemente publicado, que são cartas de amigos a Pestalozzi. Em nenhum deles há uma única carta de Pestalozzi a Rivail ou vice-versa. Pestalozzi sonhava implantar seu método na França, a ponto de ter tido uma entrevista com o próprio Napoleão Bonaparte, que aliás se mostrou insensível aos seus planos. Escreveu em 1826 um pequeno folheto sobre suas ideias em francês. Seria quase impossível que não trocasse sequer um bilhete com Rivail, que se assinava seu discípulo e se esforçava por divulgar seu método em Paris. Pestalozzi, com seu caráter emotivo e amoroso, não era de ...

OS FILHOS DE BEZERRA DE MENEZES

                              As biografias escritas sobre Bezerra de Menezes apresentam lacunas em relação a sua vida familiar. Em quase duas décadas de pesquisas, rastreando as pegadas luminosas desse que é, indubitavelmente, a maior expressão do Espiritismo no Brasil do século XIX, obtivemos alguns documentos que nos permitem esclarecer um pouco mais esse enigma. Mais recentemente, com a ajuda do amigo Chrysógno Bezerra de Menezes, parente do Médico dos Pobres residente no Rio de Janeiro, do pesquisador Jorge Damas Martins e, particularmente, da querida amiga Lúcia Bezerra, sobrinha-bisneta de Bezerra, residente em Fortaleza, conseguimos montar a maior parte desse intricado quebra-cabeças, cujas informações compartilhamos neste mês em que relembramos os 180 anos de seu nascimento.             Bezerra casou-se...

ALLAN KARDEC, O DRUIDA REENCARNADO

Das reencarnações atribuídas ao Espírito Hipollyte Léon Denizard Rivail, a mais reconhecida é a de ter sido um sacerdote druida chamado Allan Kardec. A prova irrefutável dessa realidade é a adoção desse nome, como pseudônimo, utilizado por Rivail para autenticar as obras espíritas, objeto de suas pesquisas. Os registros acerca dessa encarnação estão na magnífica obra “O Livro dos Espíritos e sua Tradição História e Lendária” do Dr. Canuto de Abreu, obra que não deve faltar na estante do espírita que deseja bem conhecer o Espiritismo.